O Centro de Pesquisa de Política Econômica, uma rede de 1,5 mil economistas de primeira linha com sede na Europa, reuniu alguns dos nomes mais destacados da área para estudar como aliviar o impacto financeiro provocado pelo coronavírus no mundo. O resumo do que pensa a maioria dos 40 especialistas foi estampada na capa da publicação com orientações para evitar o colapso social: "agir rápido e fazer o que for preciso".
Para economistas brasileiros, o país ainda não conseguiu mobilizar recursos em quantidade e velocidade suficientes para seguir a recomendação do painel de estudiosos. A avaliação é de que será necessário gastar mais, e com mais agilidade, a fim de proteger a população.
Como as medidas de auxílio econômico cogitadas pelo Planalto ainda estão em fase de elaboração e aprovação, é difícil ter uma conta fechada sobre todo o recurso mobilizado. O Ministério da Economia inicialmente anunciou um pacote de R$ 147 bilhões em ações emergenciais, mas os cálculos estão sendo refeitos a cada momento e já superavam R$ 300 bilhões no meio da semana. A Câmara, depois disso, elevou o valor a ser pago aos trabalhadores informais de R$ 200 sugeridos inicialmente para R$ 600.
Entre outras medidas apresentadas recentemente estão R$ 40 bilhões para financiar salários de pequenas e médias empresas. O governo já havia acenado com outras ações como permitir redução de jornada e de salário, antecipar R$ 23 bilhões do 13º salário, adiar tributos (R$ 54 bilhões) e transferir recursos do PIS/Pasep para o FGTS a fim de permitir saques (R$ 21,5 bilhões).
O Observatório de Política Fiscal da Fundação Getulio Vargas estimou que, excluídas medidas que não têm impacto fiscal ou antecipações de despesas, o montante inicial de recursos para fazer frente à ameaça de recessão ficaria pouco acima de 2% do PIB. O autor do estudo, Manoel Pires, conclui que "comparado ao que outros países estão fazendo, o pacote brasileiro ainda deixa muito a desejar".
Líderes europeus planejam ações correspondentes a quase 20% do PIB, como na Espanha ou na Inglaterra. Os Estados Unidos anunciaram o maior pacote da história, orçado em cerca de US$ 2 trilhões (R$ 10 trilhões) e correspondente a 10% do PIB. Mesmo a Alemanha, que segue uma rígida disciplina fiscal, decidiu tomar um empréstimo de 156 bilhões de euros para reforçar a luta contra os efeitos do coronavírus pela primeira vez desde 2013.
— Do ponto de vista fiscal, as medidas ainda são tímidas para resolver o impacto da crise. Não é à toa que mesmo os economistas que pregam a lógica de mercado e ajustes fiscais mais severos estão pedindo mais ação do governo — analisa o professor da pós-graduação da UFRGS Fernando Ferrari Filho.
Professores da Faculdade de Ciências Econômicas da UFRGS lançaram um manifesto com 32 sugestões para ampliar a política de emergência econômica (veja abaixo na íntegra), que já foi subscrito por mais de 60 doutores, pesquisadores e docentes de diferentes instituições. Incluem propostas como ampliar o Bolsa Família em 20% e oferecer empréstimos a juro zero para pequenos empreendimentos.
O economista-chefe da Câmara de Dirigentes Lojistas de Porto Alegre, Oscar Frank, também acredita que será preciso mais empenho para aliviar a crise que se avizinha:
— As medidas estão no caminho certo, ajudam a amenizar o impacto sobre a renda e na manutenção do emprego. Mas, se são suficientes, acho que não. Apenas atenuam.
O economista da CDL lembra que países europeus e os EUA têm mais folga fiscal para fazer jorrar dinheiro neste momento. O Brasil, que já vinha se recuperando de uma recessão, tem um poder financeiro mais limitado. Por isso, Frank defende, além das medidas econômicas, uma "volta com responsabilidade" das atividades econômicas, a ser definida em acordo com autoridades governamentais e médicas. Essa medida também é apoiada pelo economista e professor da UFRGS Marcelo Portugal.
— O governo tem de emprestar dinheiro para as empresas não quebrarem, transferir dinheiro para os mais pobres. Mas tudo vai depender de quanto tempo vai ficar tudo fechado. Mais uma semana, ok, mais um mês e meio, não. Podemos manter apenas as pessoas dos grupos de risco em isolamento — argumenta Portugal.
Ferrari considera uma "irresponsabilidade" afrouxar as regras de confinamento social agora, mesmo que alivie as finanças, pelo risco de multiplicar o número de mortes.
O que outros países estão fazendo
Estados Unidos: desenhou o maior plano de resgate econômico de sua história, com promessa US$ 2 trilhões (cerca de R$ 10 trilhões), em auxílio a empresas e pessoas. Veja o detalhamento de algumas medidas:
- Criação de um fundo para auxiliar grandes empresas por meio de empréstimos no valor de US$ 500 bilhões e outro tanto para pagamentos diretos de até US$ 3 mil para famílias dos EUA
- US$ 367 bilhões para empréstimos a pequenas empresas e US$ 250 bilhões para expansão do auxílio-desemprego reposição integral de layoff por quatro meses
- Outros US$ 100 bilhões para hospitais e sistemas de saúde, junto com dinheiro adicional para outras necessidades ligadas a saúde.Previsão de US$ 150 bilhões para ajudar governos municipais e estaduais no combate à pandemia
- Cerca de US$ 130 bilhões para serviços de saúde
- Total estimado: cerca de US$ 2 trilhões, correspondente a 10% do PIB
Inglaterra: uma das principais medidas destinadas a amenizar o efeito da covid-19 é a oferta de 330 bilhões de libras (cerca de R$ 2 trilhões) em empréstimos, muitos com juro zero pelos primeiros seis meses, para ajudar as empresas do país a enfrentar a recessão. Outras iniciativas:
- Cerca de 5 bilhões de libras para a saúde, e outro 1,5 bilhão para auxiliar Escócia, País de Gales e Irlanda do Norte
- Criação de fundo especial de 500 milhões de libras para amparar trabalhadores autônomos
- Transferências de 20 bilhões de libras para empresas do varejo, micro e pequenos empresários
- Reposição de até 80% da renda dos trabalhadores em layoff, até 2,5 mil libras por mês
- Total estimado: 390 bilhões de libras, cerca de 17% do PIB
Espanha
- Garantias em operações de crédito para auxiliar empresas no valor de 110 bilhões de euros
- Suspensão de pagamentos das hipotecas imobiliáriasGoverno garantirá o fornecimento de serviços públicos de água, eletricidade e internet aos mais vulneráveis
- Suporte financeiro para os trabalhadores informais que perderem renda
- Recursos para desenvolver a cura do Covid-19
- Total estimado: 220 bilhões de euros, ou 17% do PIB