Os moradores de 1.632 casas da Granja Esperança, em Cachoeirinha, iniciaram 2019 com um novo fôlego na luta pela regularização do bairro, ocupado há mais de 30 anos. O processo entre a Cooperativa São Luiz, responsável pela construção do loteamento, e a Habitasul, agente financeiro do empreendimento, que determinava prazo de 180 dias a contar de 12 de novembro para que os moradores realizassem a compra judicial de suas casas, foi suspenso até 15 de março.
O caso foi remetido ao Centro Judiciário de Solução de Conflitos e Cidadania (Cejusc) de Porto Alegre para que ocorra uma tentativa de conciliação entre os moradores e a Habitasul. Com isso, de acordo com a Comissão de Moradores da Granja Esperança, pela primeira vez, eles terão voz.
– Antes, havia um processo entre a Habitasul e a cooperativa. Com esse encaminhamento, há o reconhecimento de que nós somos parte disso – diz José Renato Mattos dos Reis, 56 anos, um dos membros da comissão e morador da Granja desde 1987.
A primeira reunião com a Cejusc, que contou com a presença de membros do Ministério Público, moradores e a Habitasul, ocorreu no dia 17 de dezembro. As partes puderam explicar suas posições, e os próximos passos foram definidos, como explica Valci Guimarães, 69 anos, também da comissão:
– Para a próxima reunião, em fevereiro, os moradores devem apresentar uma contraproposta à que foi definida pela Justiça e que a Habitasul vinha nos cobrando. Vamos discutir isso em uma assembleia, no dia 14 de janeiro.
Sem prazo
Esta possibilidade é considerada uma vitória.
– Temos o maior interesse em regularizar. Mas em condições mais favoráveis. Nosso objetivo é que nenhum morador precise sair daqui – diz Valci, que vive com a mulher, a dona de casa Maria da Graça Svierscz, 56 anos.
Juíza responsável pela conciliação, Geneci Ribeiro de Campos explica que a Cejusc já trabalhou com inúmeros conflitos semelhantes. Ela vê como positivo o movimento, apesar de ainda inicial:
– Entendo que o Cejusc atendeu sua finalidade, que é facilitar o diálogo e construir alternativas de solução dos conflitos.
Ela explica, porém, que não é possível definir um prazo para uma decisão.
– Vai depender do desenvolvimento das negociações. Procuramos respeitar o debate interno que precisa ocorrer dentro da comunidade para que todos se comprometam com o resultado final – afirma.
"Estamos mais perto da solução"
Ao mesmo tempo em que os moradores ganham a possibilidade de negociar, segue o processo administrativo para regularizar a área através do Reurb. A lei federal, que está em vigor desde 2017, desburocratiza e agiliza casos de regularização fundiária. Até março, a prefeitura de Cachoeirinha deve realizar um levantamento socioeconômico do bairro para que, depois disso, seja possível encontrar soluções para que os moradores tenham o título de propriedade de suas casas.
– Nós estamos apostando que a negociação vai ocorrer dentro do Reurb, que as duas coisas (conciliação e Reurb) vão convergir. A suspensão do processo nos dá mais prazo para isso. Este é o momento em que estamos mais perto de uma solução. Eu acredito nisso – diz José Renato.
Por meio de sua assessoria de imprensa, a Habitasul informou que recorreu da decisão que suspende o processo e aguarda uma nova análise da Justiça. Enquanto isso, a empresa participou da primeira reunião de conciliação e aguarda a proposta dos moradores, no próximo encontro, em fevereiro.
Entenda o caso
/// Na década de 1980, a Cooperativa São Luiz buscou recursos com a Habitasul Crédito Imobiliário para construir as casas da Granja Esperança. Porém, a Habitasul não recebeu o valor que foi financiado. Em 1987, 1.632 casas começaram a ser ocupadas. Muitas não estavam terminadas.
/// Em 1992, a Habitasul entrou na Justiça contra a cooperativa e, desde então, o impasse segue.
/// No início de 2018, a Justiça determinou o prazo de seis meses para que os moradores realizassem a compra judicial dos imóveis. Este prazo foi, inicialmente, prorrogado por mais seis meses. Em dezembro, foi suspenso até o dia 15 de março.
/// A condição oferecida para os moradores foi a seguinte: 10% do valor definido pela Justiça de entrada (que poderia ser parcelada em até 12 meses) e o restante financiado em 180 meses. Os moradores, apesar de afirmar que não se negam a pagar, alegam que os valores e condições não são favoráveis.