Até a semana passada, o haitiano Anel Exalien, 35 anos, e os gambianos Ebrima Bereteh, 30 anos, e Hamidou Keita, 28 anos, tinham o chimarrão como a única referência da culinária do Estado em que escolheram viver. Com pouca noção do que é um churrasco, sem jamais ter ouvido falar no fruto da araucária ou sentido o doce da mistura de leite, ovos e açúcar, o trio provou três delícias da nossa gastronomia: o costelão, a paçoca de pinhão e a ambrosia.
Há três meses em Porto Alegre, eles vivem na Unidade Central de Atendimento e Ajuizamento e estão reiniciando a vida longe do Haiti, localizado no Mar do Caribe, e de Gâmbia, na África. Deixaram pais e irmãos em busca de emprego, oportunidades e com o desejo de construir família aqui. Eles têm feito refeições com frango, arroz, feijão, saladas, café e pão.
Paçoca de pinhão foi uma das iguarias
Foto: Tadeu Vilani
Carne diferente
O primeiro prato foi apreciado no DTG Sangue Nativo, onde experimentaram o costelão preparado pelo patrão - e cozinheiro - Anderson Santos de Andrades. O prato foi acompanhado de maionese de massa e salada de tomate e alface. Anel gostou do tempero:
- Nunca comi nada assim!
Até então, o frango era a única carne assada que Ebrima já havia experimentado. Depois do costelão gaudério, abriu os horizontes para o churrasco:
- A carne é macia. É um gosto novo - disse ele, após comentar que, em Gâmbia, se come muito peixe.
Amigos gostaram da visita
Foto: Tadeu Vilani
Entre uma provinha e outra, um pouco de história
Anderson também preparou um café de cambona. A água é aquecida em chaleira no fogo de chão. Ao ferver, se adiciona o pó e mergulha um pau com fogo até apagar. Eles ficaram receosos e quase hesitaram, mas gostaram do cheiro e aprovaram outro hábito muito antigo do gaúcho.
Depois, o trio provou a paçoca de pinhão no Piquete Lendas do Sul. Maria da Graça Spindola não só mostrou como se prepara o prato como contou a origem do ingrediente principal, o pinhão, desconhecido por Ebrima e Hamidou.
- Esse era um prato típico dos índios do Sul que caminhavam longas distâncias e precisavam de energia. Eles socavam a carne e o pinhão com a mão e comiam - explicou dona Graça.
- É um misto de sabores - comentou Anel.
- Eu até faria em casa se tivesse todos os ingredientes - brincou Ebrima.
Para ele, a paçoca, que leva sobras de churrasco, é ainda melhor do que o costelão.
A imersão gastronômica chegou ao fim com ambrosia, que foi aprovada pelo trio. Eles contaram que não costumam comer doces após as refeições com frequência.
*Diário Gaúcho