O Brasil é a maior economia sul-americana e praticou nos últimos anos forte investida comercial, em especial nos países vizinhos. A Odebrecht é a maior construtora brasileira em meio a tantas que se locupletaram por décadas de malfeitos. Juntando essas duas frases, era questão de tempo e de lógica: grossos respingos do lamaçal identificado pela Operação Lava-Jato romperiam fronteiras e provocariam reações.
A Odebrecht teria pago cerca de US$ 3,5 bilhões (R$ 8,5 bilhões) em subornos envolvendo nove países latino-americanos, além do Brasil. Agora, essas nações anunciam medidas e pedidos de explicações. A região vive sobressaltos provocados por uma delação premiada que sai do cárcere de Curitiba e por investigações realizadas nos EUA.
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Recentemente divulgado, um documento do Departamento de Justiça americano mostrou os tentáculos da empreiteira pelo mundo.Em resposta à ação da Odebrecht, na quarta-feira o presidente do Conselho de Ministros do Peru, Fernando Zavala, anunciou mudanças na lei de licitações apenas para excluir o grupo de obras públicas.
A lei tem o objetivo de "impedir que empresas sancionadas por atos de corrupção participem de novas licitações ou concorrências públicas".
– A Odebrecht e outras não poderão participar de licitações enquanto permanecerem sanções por atos de corrupção – explicou Zavala, adiantando que um orçamento especial deve ser destinado ao Ministério Público para investigar esses casos e que um grupo será criado para analisar supostos subornos praticados pela empresa brasileira no Peru.
No Panamá, a Odebrecht foi alvo de ação da Procuradoria Especial Anticorrupção (FEA), que inspecionou seus escritórios. A FEA foi criada para tratar desse caso. Mais: o governo panamenho pretende cancelar contrato de US$ 1 bilhão da empresa assinado em 2014 – para construção e concessão da usina hidrelétrica Chan 2.
Também a rejeitará em licitações fazendo com que "desista do processo de qualificação da concorrência para a construção da ponte sobre o Canal do Panamá e para a linha 3 do metrô".
Na Argentina, o jornal Clarín estampou em manchete que a Odebrecht distribuiu US$ 35 milhões de propinas pelo país. O juiz federal Marcelo Martínez De Giorgi investiga para chegar aos intermediários responsáveis pela distribuição desse dinheiro no governo anterior e, claro, aos seus beneficiários.
No Equador, o governo manifestou não aceitar "sem provas" as delações de funcionários da Odebrecht sobre subornos no país, totalizando US$ 33,5 milhões.
"Não aceitaremos, sem provas, as versões de diretores de uma empresa que se declarou culpada de atos de corrupção, e que, para atenuá-los, literalmente, negocia sua responsabilidade com a Justiça americana pagando multas bilionárias", diz o governo em nota.
De fato, o presidente Rafael Correa, no poder desde 2007, surpreendeu ao expulsar a Odebrecht em 2008 por irregularidades na construção da hidrelétrica San Francisco. A medida provocou a reação de Brasília, que tomou as dores da sua principal empresa no setor e chamou seu embaixador para consultas.
Em seguida, após as acusações de que a Odebrecht pagou cerca de US$ 33,5 milhões em subornos a funcionários equatorianos entre 2007 e 2016, o Ministério Público desencadeou operação de busca e apreensão em dois escritórios do grupo em um centro comercial de Guayaquil.
Foram apreendidas 23 pastas com papéis, três livros e 23 cadernos, além de dois CDs e quatro computadores. Os agentes confiscaram, ainda, uma CPU e dois HDs externos.
"Podemos afirmar que jamais permitimos qualquer prejuízo ao nosso país. Se houve comportamentos pessoais impróprios, somos os primeiros a querer identificar os responsáveis", diz a nota do governo.
Foi símbolo de um novo Brasil, diz historiador
Na Colômbia, o presidente Juan Manuel Santos emitiu comunicado pedindo informações "que envolvam funcionários e/ou contratos". A Odebrecht detalhou que, entre 2009 e 2014, pagou na Colômbia cerca de US$ 11 milhões e obteve benefícios de mais de US$ 50 milhões.
– Por anos, a Odebrecht foi um símbolo do novo Brasil, a potência sul-americana que apostou na abertura internacional. Era, porém, uma abertura sui generis – comenta o historiador argentino Carlos Malamud, referindo-se à forma como a Odebrecht e outras empresas entravam nos países vizinhos.
Em comunicado, a Odebrecht diz que vai colaborar e que está "implantando as melhores práticas (...) baseadas na ética, na transparência e na integridade". Ao assinar o acordo de leniência, pediu desculpas "por violar os seus próprios princípios de honestidade e ética".