"Durmo com o celular do lado da cama, esperando a ligação de que arrombaram", diz um lojista, preocupado com a segurança no bairro São Pelegrino. Vinte moradores e comerciantes reuniram-se na última sexta-feira (14) para relatar o sentimento com relação a um novo aumento de casos de arrombamentos, furtos e assaltos no último mês. Mais uma vez, o foco está em uma área de Caxias do Sul que já foi alvo de furtos de cabos no final do ano passado.
Um dos casos é o de um empresário que atua há dois anos no bairro. No último mês, o restaurante dele foi arrombado quatro vezes. Os criminosos levaram equipamentos de informática, eletrônicos, itens de cozinha, vinhos e até mesmo mesas e cadeiras. Após os casos, o empresário decidiu reforçar o sistema de alarme e contratar segurança particular.
— Amplificou muito. É o meu, é aqui, é ali (aponta para vizinhos, sobre o furto em outras lojas). Com quem conversar, terá algo. É muita frequência e não era assim. Isso que chamou a atenção — lamenta o empresário.
Já um lojista calcula que apenas em julho teve cinco arrombamentos em quatro das lojas dele — três dos casos são em São Pelegrino. Em um dos furtos, o prejuízo foi de R$ 50 mil. Os casos não são apenas na madrugada. Em uma das vezes, o crime ocorreu às 18h30min. Além do sentimento de preocupação, que não desaparece nem mesmo quando está de folga, o dono das lojas de roupas teme que esse tipo de situação comece a inviabilizar negócios no bairro e no centro de Caxias:
— Se isso continuar assim, nossos negócios vão ser inviáveis. O seguro está aumentando muito, não tem mais como continuar assim.
Em uma terceira loja, que também vende roupas, o gerente desabafa que nunca sentiu uma insegurança como a de agora. O homem trabalha há 25 anos no comércio local.
— Todo dia é uma vitrine estourada ou uma loja assaltada. O que a gente está vivendo nesse bairro, eu nunca vi nada parecido. Parece que estão se desafiando entre eles quem assalta mais. Todo dia é um caso — conta o gerente.
Furtos à luz do dia
Outros lojistas ouvidos pela reportagem relatam também furtos à luz do dia. Suspeitos entram nas lojas, tentam enganar os vendedores e levam os itens. Mesmo quando são pegos, intimidam os funcionários dos negócios. As lojas mais atingidas estão na Avenida Júlio de Castilhos. Em um dos estabelecimentos de São Pelegrino, o proprietário percebeu pelas câmeras de segurança o que os indivíduos faziam para furtar. Quatro cafeteiras foram levadas em uma ação em que, pelo menos, sete pessoas participaram:
— Identificamos sete pessoas que têm uma jogada ensaiada. Um pega (a caixa com o produto), bota no carrinho e sai caminhando. E aí, vai em outro setor, tira o produto da caixa e bota num canto. Fica com a caixa dentro do carrinho, fica circulando e devolve a caixa na gôndola. E aí, outro cara cruza com esse primeiro, pega a cafeteira e joga dentro de uma sacola. Nem olham no rosto. Enquanto isso, outros distraem os atendentes. É tudo rápido.
Por medo de retaliação, os lojistas e moradores preferiram não se identificar. A presidente da Associação de Moradores do Bairro (Amob) São Pelegrino, Tita Gottert, iniciou um abaixo-assinado para ser entregue às forças de segurança, pedindo ajuda por conta da situação da área. Tita calcula que têm recebido de quatro a cinco relatos por dia no último mês e preocupa-se com o abandono da região por conta da insegurança:
— Todas as lojas estão (atendendo com portas) fechadas. Tudo está fechado. Sem falar de quantos comerciantes que já desistiram e acabaram com o negócio. O povo está desistindo de São Pelegrino.
Desafio após as prisões
O comandante do 12º Batalhão de Polícia Militar (12º BPM), tenente-coronel Ricardo Moreira de Vargas, explica que a maior parte dos registros na área central de Caxias são de furtos e arrombamentos. As lojas mais visadas são de aparelhos eletrônicos, celulares e artigos esportivos.
Vargas chama a atenção que quase 1,6 mil pessoas já foram presas pela BM no primeiro semestre, sendo 14 no Centro — todos com antecedentes criminais. Destes 14 suspeitos, apenas quatro permanecem presos. O comandante explica que um desafio é a legislação nacional, que permite a soltura dos suspeitos até no mesmo dia do delito.
— É um crime que infelizmente a legislação brasileira permite que seja tratado como menor potencial ofensivo. O que acontece é que não há grave ameaça, como acontece com o roubo, então é difícil desse indivíduo ficar preso em Caxias do Sul por mais de alguns dias. Normalmente, é colocado na rua no mesmo dia ou dois ou três dias depois. Nós vamos continuar fazendo prisões, vamos continuar com as nossas ações em cima deles. Se voltarem para a rua, vamos continuar prendendo. Mas, entendemos que a segurança pública não é só com a Brigada Militar. Tem um arco maior na questão da segurança que envolve outros poderes e outras forças policiais, que também tem que estar fazendo a sua parte — declara o comandante.
O tenente-coronel lembra ainda que o combate a esse tipo de crime é mais uma forma de combater o tráfico de drogas, já que muitas vezes o vício está por trás da ação dos criminosos.