A baixa oferta de leitos do Sistema Único de Saúde (SUS) e a lotação decorrente de doenças típicas do inverno, somada às dívidas acumuladas pelo governo do Estado junto a instituições de saúde, influencia no destino de quem espera por uma cirurgia eletiva (procedimento não emergencial agendado com antecedência) em Caxias do Sul: a estimativa é de que, desde junho, cerca de 10 operações sejam canceladas por semana no Hospital Pompéia - Hospital Geral (HG) e Virvi Ramos, que também realizam operações pelo SUS, não precisaram suspender os procedimentos. De lá para cá, seriam cerca de 90 adiamentos, número que não é exato porque algum destes procedimentos pode ter sido realizado posteriormente.
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Enquanto amargam a espera, pacientes acumulam dores e, para piorar, podem ter o problema de saúde agravado. Sem aval e dinheiro para construir mais leitos, o município está de mãos atadas.Traumatologia, vascular e geral são as modalidades de cirurgia que lideram a fila de espera, mas, até o fechamento desta reportagem, a Secretaria Municipal de Saúde não tinha dados sobre o número de cirurgias em espera. Apesar de as operações adiadas não serem de urgência, as mais severas requerem leito de UTI à disposição, para que o paciente inicie a recuperação ou para uma internação no caso de complicações.
Pompéia e Hospital Geral possuem 72 leitos de UTI, que servem a uma cidade de quase 500 mil habitantes e que atende a pacientes de outros 48 municípios da região. Uma estimativa da Secretaria Municipal de Saúde indica que 30% dos pacientes eletivos operados em Caxias sejam de outras cidades. O Virvi Ramos realiza cirurgias eletivas de menor complexidade pelo sistema público porque não disponibiliza leito de UTI pelo SUS.
– A cirurgia que pode aguardar, nós liberamos os hospitais para fazerem isso (adiar). Mas é flutuante: daqui a pouco essas pessoas passam a ser atendidas – prevê a secretária de Saúde, Dilma Tessari.
Referência em procedimentos na área de traumatologia, o Pompéia é o hospital para onde vítimas de acidentes, crimes violentos e pacientes de toda a região são encaminhados para cirurgia. Essa alta demanda, aliada ao número limitado de vagas na UTI, é um dos pontos elencados como justificativa para a longa espera, conforme explica o superintendente geral, Francisco Ferrer.
– A demanda é muito expressiva para a nossa capacidade instalada. Houve um aumento da complexidade do tratamento hospitalar: aumento o número de idosos com doenças, e há também a questão do politrauma, causado por acidentes ou violência, quando o paciente requer leito de UTI e a permanência no hospital é maior. Há ainda as doenças cardiovasculares, com complicações como o diabetes, que somaram muito os atendimentos. Há uma procura maior por internações com essas complexidades, e aí os leitos giram menos – analisa Ferrer.
Por mês, o Pompéia realiza uma média de 850 cirurgias, sendo que destas, entre 40% e 47% são pelo SUS, incluindo eletivas e de emergência.
LEITOS DE UTI PELO SUS*
Hospital Pompéia
Adulto: 20
Neonatal: oito
Total: 28
Hospital Geral
Adulto: 10
Neonatal: 25 leitos (cinco são do tipo canguru, para ganho de peso do bebê)
Pediátrica: nove
Total: 44
*Em hospitais que realizam cirurgias eletivas pelo SUS
Mulher desistiu de aguardar
Cansada de esperar, a operadora de caixa Gecielen da Silva Pinto, 32 anos, resolveu administrar o problema e desistiu de pleitear cirurgia pelo SUS. Ela sofreu uma lesão no menisco do joelho direito quando treinava muay thai, no início do ano passado. Entre março e abril e daquele ano, começou a maratona em busca de consultas e recebeu o aviso do médico.
– Ele disse que a lesão ia se agravar se eu não fizesse a cirurgia – conta.
Mesmo assim, a operação não saiu. Por cerca de dois meses após se machucar, teve de usar muleta para caminhar. Voltar a praticar o esporte está fora de cogitação, assim como levantar peso ou praticar outras atividades físicas. O problema causa desconforto e, se ela realiza movimentos bruscos, diz ter a sensação de que o joelho "desencaixa", o que gera dor.Diante da demora e por estar em um novo emprego desde fevereiro deste ano, Gecielen parou de correr atrás da cirurgia. A meta dela é fazer plano de saúde e, assim que possível, realizar a operação, possivelmente em um período de férias.
– Chegou em um ponto que eu não soube mais o que fazer. Não dá mais para depender do SUS – avalia.