A poucos minutos do início das aulas da noite, o silêncio pairava sobre os corredores praticamente vazios do Bloco G, na Universidade de Caxias do Sul (UCS). Dos quatro andares cheios de salas, um laboratório do terceiro pavimento sediou a única prática presencial da quarta-feira (23) naquele bloco, com uma turma da disciplina de Corrosão e Proteção Superficial I, do curso de Engenharia de Materiais. Pela primeira vez desde o início do semestre letivo, a professora e os estudantes, que vinham encontrando-se nas aulas teóricas e virtuais, se viram pessoalmente.
Na chegada, a alegria do retorno ao campus, mesmo que de forma pontual, foi momentaneamente contida pela atenção despendida ao cumprimento do protocolo sanitário estipulado. Além das orientações prévias recebidas, o estudante precisa assinar um protocolo de acesso, ainda em área externa.
Recepcionados por funcionários que verificam a temperatura corporal na porta de entrada, os alunos percorreram o trajeto indicado, obedecendo demarcações de distanciamento na fila para higienização de mãos e calçados, e também para vestirem seus jalecos.
Instruídos a levarem o mínimo de objetos possíveis, os frequentadores da prática de laboratório deixam tudo em armários antes de vestirem as luvas e, finalmente, adentrarem à sala preparada com tubos, reagentes e outros materiais a serem utilizados de forma individual, posicionados com distanciamento entre si.
— A gente estava habituado com aquele monte de gente, tumulto nos corredores. Chegar aqui com tudo diferente causa impacto, sim, mas decidi participar porque me sinto segura e práticas como a desta disciplina, que é bem específica, são muito importantes — afirma Franciele Biotto Rodrigues, 30, que, na noite de quarta-feira, voltou ao campus pela primeira vez desde março.
— O risco existe, mas todo o cuidado está sendo tomado. Uma aula como esta costumava ser em duplas ou trios, com o laboratório cheio, hoje está bem diferente e existe uma atenção da UCS com todos os protocolos. Só na teoria a gente não consegue aprender determinadas práticas — complementa o colega, Rodrigo Ribeiro, 36, que também participou da atividade presencial de quarta-feira e continua cumprindo as demais disciplinas por meio das aulas síncronas online.
O cuidado em todos os detalhes
O novo cenário ainda causa impacto em uma primeira avaliação, até mesmo de quem fez parte da fundamentação dos protocolos.
— No início é sempre aquele choque, uma readaptação mesmo, mas, aos poucos, todo mundo vai se apropriando dos procedimentos e percebendo que o ambiente está seguro, isso vai tornando tudo mais confortável — afirma a professora Roselaine Cristina Mignoni, que leciona para os cursos da Área do Conhecimento de Ciências Exatas e Engenharia da UCS e integra o GT Valida Práticas, grupo interno responsável pela aplicação dos protocolos formulados pelo Centro de Operações de Emergência em Saúde para a Educação Local (COE E Local — UCS).
A Área do Conhecimento de Ciências da Vida, que abrange cursos como Medicina, Medicina Veterinária, Odontologia, Farmácia e Educação Física, conta com 90% das disciplinas com aulas práticas presenciais realizadas neste momento. Os 10% restantes são de cursos das áreas de Ciências Exatas e Engenharias, Humanas, Ciências Sociais, Ciências Jurídicas, além de Artes e Arquitetura, autorizados a partir da flexibilização estadual.
De acordo com Roselaine, uma rigorosa avaliação é realizada antes da aprovação de cada aula, solicitada pontualmente pelos professores, verificando-se, inicialmente, se há real necessidade de realização presencial do encontro ou se ele pode ser adaptado para o formato online. Quando confirmada a realização presencial, a equipe passa à fase operacional.
— O decreto governamental permite 50% de ocupação, mas sempre reavaliamos as estruturas para que o distanciamento seja o maior possível, ficando bem abaixo deste percentual. Pensamos em todos os procedimentos que garantam segurança a cada movimento que alunos e professores fizerem durante a aula. Para isso é realizada uma simulação com as equipes internas, onde adaptamos os protocolos à realidade de cada disciplina. Além disso, mantemos a higienização permanente das superfícies e a sanitização que é feita com validades de três meses — explica a professora.
Um jeito novo de ensinar e de aprender
No laboratório, uma demarcação também limita a aproximação da professora às bancadas onde ficam os alunos. Eliena Jonko, que desde o início da pandemia têm remodelado suas aulas em função do isolamento, diz que é perceptível o entusiasmo dos participantes das aulas práticas, mesmo que elas ainda ocorram de forma limitada e com contingente reduzido.
— Na semana passada, de uma turma de 18, oito compareceram. Os outros dez acompanharam a aula por transmissão direta, permanecendo muito atentos e participativos. Eles reconhecem todo nosso esforço para que as aulas aconteçam da melhor forma possível neste momento — afirma a docente.
A participação ativa dos estudantes, de forma ainda mais efetiva do que no modelo totalmente presencial, que ocorria antes da pandemia, tem sido uma das transformações no universo escolar, identificada no contexto acadêmico pela diretora da Área do Conhecimento de Ciências Exatas e Engenharia, Neide Pessin. Ela acredita que as adaptações exigidas pelo distanciamento social estão proporcionando um amadurecimento dos estudantes, assim como a revisão da construção pedagógica anteriormente exercida pelos professores.
— A gente passou a ter outra dimensão, com um avanço significativo na maneira de posicionar a prática de cada curso, mantendo o olhar para o universo de possibilidades de aprendizagem que o aluno pode ter. Não existe aprendizagem se ela não for ativa e, com a autonomia e responsabilidade que o aluno passou a desenvolver, acompanhando as aulas de casa, isso foi ainda mais desvelado. Acredito que sairemos desse processo totalmente distintos e muito melhores — avalia a diretora.
Ela também projeta um reflexo da pandemia na evolução da capacidade de aprendizagem dos estudantes de Ensino Médio que, futuramente, chegarão à universidade com uma nova percepção.
Prioridade continua sendo online
De acordo com a UCS, as aulas práticas presenciais têm contado, desde agosto, com uma média semanal de 1,2 mil alunos participantes (cerca de 240 por dia), em todos os campi da região. Com 18 mil estudantes de graduação, a universidade continua priorizando o formato de aulas online síncronas, adotado desde o início da pandemia, em março, como forma de garantir a segurança dos professores e outros funcionários, assim como dos alunos matriculados.
Como forma de facilitar a conversão de 2,7 mil disciplinas presenciais em 3,7 mil turmas online, a universidade forneceu kits para estudos em casa, disponibilizando ainda softwares e acompanhamento contínuo, assim como o serviço delivery de livros pelo sistema da biblioteca.
Para professores e alunos das aulas práticas presenciais a UCS orienta:
ANTES DE IR
:: Praticar o autoteste, atentando para possíveis sintomas como febre, tosse, dor de cabeça, entre outros. Caso alguns dos sintomas se apresente, ou alguém do convívio familiar esteja com suspeita/confirmação para covid-19, a orientação é de não dirigir-se à UCS.
NO PERCURSO
:: Seja no uso de veículo próprio, táxi ou aplicativo e transporte coletivo, as mãos sempre devem ser higienizadas, evitando-se tocar em superfícies desnecessárias.
NA UCS
:: Além do uso correto da máscara (no acesso, permanência e saída da instituição), o acesso aos blocos só é permitido após medição de temperatura e preenchimento de protocolo de acesso.
:: Chegar antes do início efetivo da atividade para evitar aglomerações de pessoas e respeitar o distanciamento demarcado para realização do protocolo de acesso, assim como as medidas adotatas dentro dos blocos, com orientações disponibilizadas nos murais, pisos e local da prática.
:: A realização de lanches não está permitida e os bebedouros estão interditados.
:: Itens desnecessários devem ser evitados, com pertences depositados em local seguro e higienização das mãos antes do acesso à estação de estudos.
NO RETORNO
:: Não tocar em nada antes da higienização, mantendo próximo à entrada da residência álcool 70% ou solução de água sanitária, uma caixa para guardar pequenos pertences (como chaves, carteira, controle do carro, etc.) e calçados limpos para usar em casa, deixando na entrada o calçado que usou na rua.
:: Objetos como óculos e celular devem ser higienizados e, se possível, a orientação é tomar banho ou higienizar com álcool as áreas não protegidas pelas roupas. Estas devem ser retiradas e colocadas direto no cesto de roupas.