Terezinha Fernandes de Moura, 50 anos, moradora do bairro Santa Fé, em Caxias do Sul, descreve o sentimento de ver, finalmente, a Unidade de Pronto Atendimento (UPA) Zona Norte de portas abertas a partir desta quarta-feira.
— Sabe o que é deitar tranquila, sabendo que se acontecer alguma coisa grave vamos ter um médico bem perto de casa? Há anos não sei o que é isso. Dormia sempre receosa, com medo de ter que esperar a ambulância atravessar a cidade para nos socorrer e algo pior acontecer — diz a mulher.
Terezinha é parte de um contingente de milhares de pessoas que sempre precisam recorrer ao Pronto-Atendimento 24 horas (Postão) para consultas de urgência ou emergência. Nos últimos anos, a demanda por consultas no plantão aumentou e ampliou a angústia de quem depende do Sistema Único de Saúde: esperar cinco ou seis horas por consulta no Postão ou até mesmo não ser atendido.
Há quase 15 anos, Terezinha ajuda nos cuidados com a enteada, que vive a maior parte do dia deitada numa cama por conta de uma neurocisticercose, doença que tira os movimentos do corpo: Lorete Aparecida Chaves da Silva, 45, não enxerga, nem fala e usa uma sonda para se alimentar. Eventualmente, era necessário levar Lorete para avaliação de urgência no Postão. A situação, que por si só já é complicada, se agravava com a distância entre a moradia da família e o plantão do SUS, no Centro, uma dificuldade que será amenizada com a abertura da UPA.
— Agora, vai ser uma nova vida — projeta Terezinha.
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Marco histórico — A cerimônia de inauguração ocorre às 10h, mas os primeiros pacientes só serão recebidos à tarde. A abertura do serviço é o desfecho de um imbróglio. A UPA teve o prédio concluído em 2014, mas não abriu por falta de recursos para compra de equipamentos e custeio das atividades. A unidade só receberá pacientes a partir de hoje devido a um ajuste nas contas públicas para priorizar a saúde. O Executivo fez corte de CCs e de verbas da representação, mas também reduziu repasses para setores que dependem de financiamento do município, o que desagradou muita gente que trabalha com projetos sociais, culturais e esportivos.
Construída na Zona Norte, maior região geográfica de Caxias, a abertura da unidade também pode ser vista como um marco na saúde pública do município. Mesmo sendo a segunda maior cidade do Estado e uma das 100 maiores do país, desde 1992 Caxias do Sul contava apenas com o criticado Postão para pacientes de urgência e emergência. Além disso, a abertura do serviço vai transformar a rotina principalmente dos moradores de bairros como Belo Horizonte, Cânyon, Vila Ipê e Santa Fé. Com uma população que se aproxima de 90 mil habitantes, as comunidades foram penalizadas durante décadas pela falta de uma assistência mais abrangente.
Conforto — Mesmo inserida numa região populosa, a UPA poderá atender pacientes de todos os cantos da cidade, o que deve desafogar o Postão, que sofre com a constante superlotação e infraestrutura deficitária. Para isso, a UPA terá uma equipe com mais de 270 profissionais de diversas áreas, distribuídos em turnos. A capacidade da unidade é receber, por dia, uma média de 350 pessoas.
A unidade, de porte III, oferece uma série de equipamentos para dar um pouco de conforto aos pacientes: haverá ar-condicionado na recepção e em algumas salas, espaços com decoração infantil e com brinquedos para as crianças, vagas de estacionamento público e poltronas para acompanhantes na ala de observação. Todas as salas e equipamentos serão mantidos pelo Instituto de Gestão e Humanização (IGH), entidade vencedora da licitação para administrar a UPA de forma compartilhada com a prefeitura.
— Das UPAs que já trabalhei, nunca vi algo parecido como a de Caxias. Temos um espaço qualificado para atender muito bem a população. Torço para que tenhamos uma rotina de trabalho compatível com a expectativa — confia a diretora administrativa Eliana Ferreira, que tem especialização em gestão hospitalar e já era ligada ao IGH.
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A equipe — Os 70 médicos clínicos e pediatras que vão atender na UPA de Caxias possuem experiências em pronto-atendimento. Conforme o diretor técnico da unidade, o médico de Caxias do Sul Walter Porto, alguns profissionais trabalham no Postão 24 horas e nas unidades básicas de saúde (UBSs). Outros não atendiam na rede pública, mas trabalham nos plantões de hospitais. Também foram selecionados médicos com passagem pela UPA de Bento Gonçalves e pela região de Vacaria.
— Eles (médicos) têm conhecimento da situação de Caxias e estão cientes já da demanda que deve migrar para a UPA. Só não conseguimos montar uma equipe médica inteira da região da Serra, pois tivemos dificuldade em encontrar pediatras. Mas todos são do Rio Grande do Sul — explica Porto.
As escalas dos médicos foram organizadas de acordo com cada dia da semana. Caso haja um imprevisto na equipe, alguns profissionais ficarão, eventualmente, de sobreaviso para serem chamados em substituição de um colega. O plano foi montado para que em nenhum momento faltem médicos para atender a população, problema que acontece com certa frequência no Postão 24 horas.
Para o diretor técnico, o primeiro mês será de adaptação e, portanto, vai exigir mais paciência dos pacientes. Ele acredita que neste momento ainda será complicado zerar a fila de espera por conta do perfil de público que deve procurar a unidade.
— Sabemos que chegarão até a UPA pacientes que queriam apenas uma consulta sem urgência, mas isso acontece na maioria das UPAs do país. Obviamente, que casos graves terão prioridade e os demais deverão esperar. Quando a UBS estiver funcionando bem, alivia a situação tanto do Postão quanto da UPA para trabalhar melhor, porque a grande maioria destes pacientes que procuram uma unidade de urgência e emergência não precisaria estar ali. É por isso que acaba gerando essa superlotação.
Transporte — Um ponto de táxi nas proximidades do Posto São Luiz, na Rota do Sol, e uma das linhas de ônibus que passa em bairros da Zona Norte tiveram, respectivamente, a localização e o percurso alterados para atender a demanda de pacientes da UPA. As mudanças, que entraram em vigor na segunda-feira, foram solicitadas pela Secretaria Municipal de Trânsito, Transportes e Mobilidade (SMTTM).
— As alterações eram necessárias para fazer o atendimento de quem precisa chegar e sair da unidade. Com a abertura do serviço, muitas pessoas de outros bairros devem procurar o local e, por isso, precisávamos fazer estes ajustes. No caso do ônibus, o veículo deve passar pela rua da UPA nos dois sentidos e por vários horários do dia — explica o secretário Cristiano de Abreu Soares.
:: Para quem não reside na Zona Norte, haverá opção de ônibus do transporte coletivo urbano para se deslocar até a UPA. Contudo, é necessário ir até a área central e ou embarcar em paradas ao longo do Pio X, São José e Fátima. A referência é a linha L18-Santa Fé/Vila Ipê/Belo Horizonte.
:: Quem sai do Centro, pode pegar o ônibus no paradão da Rua Bento Gonçalves. O itinerário da linha L18 será estendido nas próximas semanas e por isso, além do percurso original, também passará pela Rua João Gregório Paniz, na frente da UPA.
:: O primeiro horário de saída do ônibus do Centro é às 5h30min e o último horário de saída em direção ao bairro é às 23h. A frequência da linha é de 30 em 30 minutos. O coletivo passa pelas ruas Visconde de Pelotas, Moreira César e pela ERS-122 (região do Fátima) e RSC-453 (Rota do Sol, região do Santa Fé). No retorno, o ônibus passa pelas ruas do Centenário e retorna ao Centro pela Rua Pio XII.
:: Há também um ponto de táxi na Rua João Gregório Paniz.