Para a Copa, o técnico recebeu convites de emissoras de televisão, rádios, jornais e sites para fazer comentários, mas rejeitou a todos para não dar preferência a ninguém. Da mesma forma, em relação à Seleção Brasileira, desde que foi apontado como candidato a suceder Luiz Felipe Scolari, tem sido econômico nos comentários. Entre as muitas solicitações que tem recebido para encontros, palestras e entrevistas, Tite recebeu o Pioneiro na casa da família, no bairro Ana Rech. Sorvendo o cafezinho preparado pela mãe, dona Ivone, 79 anos, ele falou sobre a Copa do Mundo e o futuro.
Pioneiro: Como você projeta a Copa?
Tite: O que eu vejo nas seleções e vejo de mérito na composição do Luiz Felipe: ele trouxe os jogadores e o sistema é basicamente com as funções que os jogadores exercem em suas equipes. Isso dá confiança, e se vem de uma boa campanha como na Copa das Confederações, quando cresceu durante a competição... É verdade que passou por um jogo muito difícil contra o Uruguai, mas foi emblemática a vitória contra a Espanha. Então isso gera confiança e é o momento do Brasil, pela qualidade que tem. Este é o momento dos técnicos, e principalmente de quem conseguir usar um sistema com os jogadores jogando nas verdadeiras funções. Me caiu a ficha quando vi uma entrevista do Oscar. Ele disso: pô, na Seleção eu jogo onde gosto, onde estou acostumado a jogar. Isso gera confiança no atleta. E, se vem de uma boa campanha, melhor ainda.
Pioneiro: Quais são os favoritos para esta Copa?
Tite: A gente não foge dos favoritos tradicionais. Mas vou dizer uma coisa: a Copa do Mundo, quando começa a ter um jogo só, as oitavas, quartas, semifinal, a possibilidade da surpresa fica muito grande. Você pega um dia que não está inspirado, que não recuperou bem, que os seus principais jogadores não andam, você pega um dia em que o adversário está efetivo. Por que estou falando isso: as maiores seleções que eu vi jogar foram a de 1970 e a de 1982. Uma ganhou e outra não levou o título, mas ganhou o meu respeito, porque ela estava num dia em que a Itália foi efetiva, as oportunidades que tinha, marcava. Mas ninguém vai retirar os méritos de Falcão, Sócrates, Zico, Júnior... Aquela equipe jogava muito, então fica a marca. Como a Holanda, a Hungria, que não consegui ver mas li bastante relatos, essas equipes. Então a possibilidade de acontecer isso é muito grande. Afora isso, surpresas, eu vejo França, Bélgica e gosto muito da seleção chilena. Quem viu o Grêmio jogar em 2001 e olhar a seleção chilena, ou quem ver a seleção chilena, vai lembrar do Grêmio. Sistema parecido e velocidade nas transições. E aí é Brasil, Argentina e Alemanha. Não acredito muito na Espanha, vejo um momento de declínio da geração de ouro.
Pioneiro: E sobre esquemas, o que vai predominar? Se fala em 4-2-3-1...
Tite: Se a gente voltar no tempo e olhar o Brasil de 1970, o esquema era 4-3-3. Mas os dois atacantes dos lados voltavam. Eles fazem a mesma função que o Ribéry e Robben fazem no Bayern. É o sentido de compactação da equipe. Em números, vai ser o 4-1-4-1, 4-2-3-1 ou 4-4-2, duas linhas de quatro com dois atacantes. Exceção feita talvez ao Chile, que usa o sistema 3-5-2. A Itália usou na Copa das Confederações, não sei se poderá usar outra vez. Mas o mais importante disso é como a equipe se move, com quantos atletas ela ataca. Essa movimentação, a rapidez de atacar e voltar, é o grande desafio. Os sistemas não diferem, desde 1910 temos uma série de sistemas aplicados. O grande detalhe é como os movimentos se executam.
Pioneiro: O Brasil tem a vantagem de ser o local e, ao mesmo tempo, a pressão. Como se administra isso?
Tite: Coincidentemente, eu me hospedei no mesmo hotel do Atlético de Madri. Aí estou olhando, de fora, todo o envolvimento e estava nervoso com o jogo. Pô, eu disse: estou mais nervoso do que quando estava participando, por todo aquele envolvimento, todo o espetáculo, vocês da imprensa, tudo em volta, torcida. Cara, aquilo era uma loucura. A televisão, você ligava, toda hora os caras bombando. Aquilo é uma loucura, um espetáculo, um evento extraordinário. E, por mais experiência que você tenha, é uma moeda de duas faces. A torcida brasileira pode contribuir, dar confiança ao atleta, ou ela pode pressionar também. Eu vi o relato de 1950, acho que a ESPN estava mostrando, e aí mostrava as pressões sobre os atletas. Na hora que o Brasil tomou o gol contra o Uruguai, calou (o estádio). E aí eu ouvi as entrevistas do Obdulio Varela, do Barbosa, de jogadores brasileiros dizendo: poxa, a gente se inibiu, ninguém conseguia mais ter naturalidade. Pelo lado bom, pode acontecer o que aconteceu na Copa das Confederações, essa força. Mas daqui a pouco pode acontecer de não estar jogando bem e virar uma pressão.
Pioneiro: Como você está encarando as especulações de que é um dos favoritos para assumir a Seleção após a Copa?
Tite: Com a mesma naturalidade com que um dia você foi repórter e eu, jogador do Caxias e outros times. Claro que sabendo que eu construí uma carreira, desde o Veranópolis, Caxias, Grêmio, Inter, Corinthians. Os trabalhos me credenciaram a isso. As pessoas olham para trás e dizem: o Tite construiu uma carreira. Não caí de paraquedas, não fui um ex-jogador que surgiu e se diz o cara: é bom e vai para a Seleção. Não tive um título ou um bom trabalho que se aponta: ah, o bom trabalho do momento. Eu construí. Então, estou eu e mais uns quatro ou cinco profissionais que, se o Luiz Felipe terminar o seu ciclo, a CBF vai olhar para outros técnicos. E ela olhando para outros, o Tite vai estar entre os quatro ou cinco. Por isso do meu momento, da preparação e de encarar com naturalidade. Não vou modificar o meu jeito de ser.
Pioneiro: E se não for na brasileira, você tem como alternativas outras seleções e clubes europeus?
Tite: Quando terminar o Mundial, acabam alguns ciclos de outras seleções. Por que estou falando isso: eu recebi, quando estava no Grêmio, um convite da seleção peruana. Foi real. Eu disse: não, nós temos Libertadores e quero continuar no Grêmio. Agora, não estando empregado, daqui a pouco vá que feche o ciclo do... Japão, de uma outra seleção importante, da Colômbia, do Peru, não sei. Se for um projeto interessante, assim como os próprios clubes que comecem um trabalho, se abrem boas possibilidades.
Papo de bola
Técnico Tite fala sobre Copa do Mundo, aponta favoritos e diz ser candidato natural à Seleção Brasileira
Treinador caxiense recebeu o Pioneiro para uma conversa em Ana Rech
GZH faz parte do The Trust Project