A alta da inflação e consequente elevação de juros não beneficia ninguém. No universo dos investimentos, porém, há maneiras de, pelo menos, garantir uma mínima estabilidade ao patrimônio financeiro, por meio das aplicações de renda fixa, na qual o cidadão "empresta" dinheiro, com juro e data de vencimento para o Tesouro Nacional, bancos ou empresas privadas. A opinião é de especialistas em investimentos de Caxias do Sul.
Esta modalidade de investimento permite que o juro seja atrelado à inflação, que no Brasil, oficialmente, é medida pelo IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo), ou atrelado ao Sistema Especial de Liquidação e de Custódia (Selic), que é a taxa de juros determinada pelo Banco Central a fim de controlar a inflação. São diversas opções que costumam compor as carteiras de investidores, conforme o perfil de cada um.
Em um contexto no qual a taxa de juros chega a 13,75%, depois de 12 aumentos consecutivos, e a inflação anual em 2022 está em 5,79%, Marcia Dullius, sócia da RioSul Agente Autônomo de Investimentos e atuante no mercado há 33 anos, explica por que esta forma de investimento se torna protagonista e não representa, de fato, uma fonte de lucro diante da elevação de percentuais, que afeta a economia como um todo:
— Os investidores que têm recursos investidos se beneficiam com a alta da taxa de juros, pois terão uma valorização percentual maior de seu capital, no entanto, é importante salientar que uma inflação elevada reduzirá seu poder de compra, tornando este ganho relativo. Desta forma, é importante entender quanto o seu investimento gera de ganho real, ou seja, quanto eu recebo de rentabilidade acima da taxa de inflação — destaca.
Karen Fochesatto, economista da Safe Investimento, pondera que esta alternativa não está ao alcance de pessoas que vivam sem o mínimo de renda suficiente para fechar as contas do mês. Famílias e empresas com capital para investimento são o público que, de fato, consegue usufruir dessa opção.
— Quem tem dinheiro, e pode fazer investimento, tem opção de ter rentabilidade maior em título com risco controlado. Além do CDI (Certificado de Depósito Interbancário) e inflação, ainda tem a opção dos investimentos com juros pré-fixados. Quem acredita que taxa de juros tende a cair, pode aproveitar a que está agora e comprar títulos pré-fixados. Se amanhã cair, se mantém a taxa contratada — aponta a profissional que, a pedido de GZH, elencou os tipos de investimento de renda fixa (leia abaixo).
Embora ainda seja algo distante da realidade de muitas pessoas, a assessora destaca:
— É sempre interessante começar, seja o valor que for, na capacidade financeira que qualquer pessoa tiver.
É o que também defende o educador financeiro Leandro Benincá, da escola Um A Menos na Poupança, que, como o nome já sugere, incentiva pessoas físicas a optarem por investimentos que gerem mais rendimento. O profissional é curador do palco de Finanças e Investimento do Gramado Summit — evento que ocorre de 12 a 14 de abril —, onde educadores financeiros convidados palestram sobre o relacionamento com o dinheiro, promovendo a independência e a autonomia a partir da educação.
— O investidor sempre tem que pensar que o investimento é como se fosse uma caixa de ferramentas. Não existe uma melhor ferramenta, existe uma ferramenta mais adequada para aquilo que você precisa. O mercado financeiro tem modalidades de investimento adequadas pra cada coisa que você precisa na vida. A educação é o caminho. Se você buscar primeiro entender o que está fazendo, pra depois fazer, nunca vai cair em um golpe, e vai fazer as coisas com pé no chão, trabalhando dentro dos seus limites — afirma Benincá.
Poder de compra assegurado
O educador financeiro Leandro Benincá explica que a adesão à renda fixa é recomendada quando há data para uso do dinheiro investido, seja para o Tesouro Direto (governo), um banco ou um empresa. A escolha, segundo ele, precisa ser feita com a busca do equilíbrio entre risco que o investidor está disposto a correr, o retorno que quer ter, e a data de validade pra usar seu dinheiro. Quando o valor for utilizado, mesmo com a alta da inflação, ele não terá perdido poder de compra.
— A inflação acumulada em 5,79% neste ano significa que os R$ 100 que você tinha no início do ano agora compram R$ 5,79 a menos. Por isso, precisamos de mais dinheiro pra comprar: não é que as coisas estejam mais caras, é o dinheiro que vale menos. Se a pessoa tem um investimento pra compensar essas perdas, tem poder de compra garantido por mais tempo, o que garante que no futuro ela vai usar um dinheiro que não terá perdido valor — explica Benincá.
O economista Mosar Leandro Ness, professor da Universidade de Caxias do Sul (UCS), observa como a prática vira tendência em tempos de alta:
— Nós, agentes econômicos, tomamos decisões com base no conhecimento que temos a respeito do cenário econômico, daquilo que possa vir a acontecer, visando a resguardar riqueza ou especular no mercado. Nesse caso, as pessoas sabem que a inflação tende a aumentar e que o governo vai pagar taxa de juros mais elevada. Automaticamente, as pessoas investem em títulos de renda fixa ou atrelados à inflação e taxa de juros, com objetivo básico de não perder riqueza — avalia.
O economista diz que o momento instiga preocupação, uma vez que a política econômica do novo governo federal ainda não foi plenamente explicitada.
— Se o governo praticar uma política fiscal expansionista, vai ter que se financiar pela venda de títulos e, consequentemente, haverá manutenção de taxa de juros mais alta e a inflação não deverá recuar tão rápido. Até 15%, os índices andam lado a lado, mas, quando atinge 15%, consegue dobrar em seis meses pra 30% e depois descamba para uma superinflação, essa é a preocupação do Banco Central — explica o professor.
Segundo Gustavo Bertotti, economista da Messem Investimentos e professor da FSG, o cenário macroeconômico está em deterioração, com aumento das expectativas de inflação e possibilidade do ano encerrar sem corte de juros.
— Isso favorece muito títulos de renda fixa, principalmente prefixados, que garantem rentabilidade com taxa de juros bem atrativa, mas, trazendo pro lado da Economia, é extremamente ruim, porque há perda de atividade econômica, perda de poder de compra da população, sem contar o endividamento de empresas que tenham contração de dívidas grandes e, em parte, isso impacta no passivo — analisa.
Em um mercado dividido em investimentos de renda fixa e renda variável, Bertotti afirma que o ideal é a diversificação, com base no perfil do investidor.
— Muitos setores foram impactados pelo juro alto, o Brasil tem bolsa com ativos baratos e desvalorizados e, mesmo nesse cenário adverso, muitas empresas geram caixa e pagam bom dividendos. Então, eu diria que o Brasil é uma rota de investimentos para o mundo, tanto para renda fixa, quanto para a renda variável — conclui.
Tipos de investimentos em renda fixa
:: CDI - Com rentabilidade ligada à taxa básica de juros, no mercado indicada pelo Certificado de Depósito Interbancário, que segue a taxa Selic determinada pelo Banco Central. Essas aplicações são as mais comuns e normalmente são atreladas a um percentual CDI, em que 100% corresponde a próximo de 100% da Taxa Selic. À medida em que os juros continuam altos, essa aplicação continua atrativa.
:: Títulos IPCA - Outra forma de aplicar é com ganho real, assegurando o recebimento da inflação (correção) mais uma taxa fixa. Essas aplicações, disponíveis em todo o mercado para qualquer valor, remuneram ao investidor tudo o que der no período mais uma taxa fixa de ganho real, protegendo o poder de compra ao longo do tempo e ainda recebendo rentabilidade extra em cima. Pode ser uma boa alternativa conforme o cenário e a quantidade do patrimônio a ser investido.
:: Investimento prefixados - Nesta modalidade o investidor já sabe exatamente qual o valor de juros que vai ganhar na aplicação, independentemente do que aconteça com os juros e a inflação. Essas aplicações são mais recomendadas quando a tendência é que os juros caiam no futuro. Sempre, também, compondo uma parcela do dinheiro numa diversificação saudável.
:: Outras alternativas - Mesmo na renda fixa, é possível apostar em diferentes cenários para juros e inflação no futuro, se posicionar em aplicações que permitam, além rentabilidade contratada, buscar no futuro um ganho adicional (ágio) por ter comprado o investimento certo, na hora certa. Esta modalidade diz respeito, especialmente, a títulos públicos federais e créditos privados.