Com o aumento da taxa Selic para 7,75% ao ano — o maior patamar desde 2017 — anunciado nesta quarta-feira (27) pelo Comitê de Política Monetária (Copom) do Banco Central, o momento é de segurar o dinheiro e evitar dívidas. A dica é da economista e professora Maria Carolina Gullo. Em entrevista ao Gaúcha Hoje na Gaúcha Serra nesta quinta-feira (28), a especialista destacou a importância em adiar compras que exijam empréstimo ou financiamento para evitar o pagamento de juros altos.
— O gasto com o dinheiro tem que ser com parcimônia porque ele vai custar muito caro ali na frente. O consumidor precisa entender isso: vale a pena gastar agora, vale a pena antecipar uma compra desde que eu não precise pegar financiamento — disse.
Guardar dinheiro também será positivo para conseguir um maior rendimento, segundo Maria Carolina:
— A tendência é que a renda fixa e a poupança comecem a ter valores melhores a partir do aumento da Selic, principalmente quando passar de 8%, e provavelmente isso vai acontecer em dezembro. A poupança muda o cálculo, passa para um que dá uma remuneração melhor.
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A economista também analisou o reajuste dos combustíveis — o mais recente aumento entrou em vigor na terça-feira (27) e, com ele, a alta da gasolina já chega a 73,4% em 2021. Maria Carolina explicou que os reajustes têm relação com o cálculo utilizado pela Petrobras e com o preço do barril de petróleo que já passou da barreira dos 80 dólares. A Petrobras, na visão da economista, teria que mudar a política de preços que usa atualmente pelo menos por um tempo. Já com relação ao barril de petróleo, o país não tem ingerência porque é determinado pelo mercado internacional
— Precisamos conter o câmbio e o Banco Central tem mecanismos para fazer isso. Esse é o primeiro ponto. O segundo ponto é que o governo precisa parar de falar bobagem e colocar frases desconexas ou vir com ações que ele sabe que vão perturbar o mercado, e aí o câmbio vai disparar de novo. É preciso um pouco mais de responsabilidade nas ações governamentais para poder fazer isso acontecer e aí sim a gente pode ter algum sossego, alguma melhora no preço do combustível. Mas não há perspectiva de se ter uma queda nos preços nos próximos meses, no sentido de uma queda forte para voltar aos patamares que tínhamos antes — completou.
Veja o que disse a economista na entrevista ao Gaúcha Hoje:
A Selic mais cara tem dois lados
Para quem produz e para quem precisa de crédito, o custo do dinheiro encarece com o aumento da Selic. Cada subida deixa o dinheiro mais caro. Está valendo mais a pena guardar o dinheiro e protelar uma compra.
Aumento demora, mas chega
O aumento da Selic demora um pouco mais, mas chega no consumidor final através dessas taxas que impactam não só a vida do consumidor, mas a atividade produtiva e isso tende, no futuro, a trazer uma certa desaceleração na produção. Por isso que se fala que os números do PIB do ano que virão bem baixos, porque a tendência da Selic é subir ainda mais.
Por que a Selic está subindo tanto?
Porque estamos com uma inflação muito alta. Pelo IPC (Índice de Preços ao Consumidor) calculado pela universidade (de Caxias do Sul) já está no acumulado nos últimos 12 meses em 8,90% e o IPCA (Índice de Preços ao Consumidor Amplo) nos últimos 12 meses está em mais de 10%.
Desestimular o consumo está sendo o remédio
O que o governo está tentando fazer, via taxa de juros, é desestimular um pouco o consumo e esse é o remédio que normalmente se dá para esse tipo de situação. Mas aí temos um problema. A maior parte dessa inflação não é de demanda e não é causada pelo excesso de procura e de consumo e sim por custos da produção. É o aumento dos principais insumos: a energia, o petróleo, o minério de ferro, o próprio dólar, o câmbio que disparou muito e que encarece a nossa vida aqui dentro. Favorece bastante as exportações, mas encarece todo o produto importado. Estimula muito a exportação e as empresas acabam preferindo exportar do que colocar no mercado interno.
Atrair capital externo
Existe uma corrente de economistas na qual eu me incluo que atribui esse aumento muito mais para tentar fazer uma atração de capital externo, de investidores que venham para cá atraídos por essa taxa mais alta, do que propriamente para segurar a inflação. Se isso acontecer, a gente teria uma derrubada no câmbio, o que seria bom, ajudaria a inflação de outra forma.
Combustíveis
A questão do combustível tem a ver com a fórmula que a Petrobras usa para calcular o preço. Com o barril do petróleo houve aquecimento no mundo inteiro, todo mundo voltou a produzir ao mesmo tempo e existe uma pressão muito grande sobre a compra de petróleo. Hoje o barril já passou da barreira dos 80 dólares. No nosso caso, além do valor estar alto, a nossa taxa de câmbio está muito alta e ela tem impacto muito grande sobre a fórmula que a Petrobras usa para calcular a política de preços. Por isso que o preço dos combustíveis está aumentando. Está subindo pelos dois motivos. É a tempestade perfeita.
Conter o câmbio
A Petrobras teria que mudar a política de preços que usa atualmente pelo menos por um tempo. Com relação ao barril de petróleo, não temos ingerência. Ele é determinado pelo mercado internacional. O que o governo talvez pudesse fazer nesse momento é diminuir a importância do câmbio nessa política de preços que tem hoje. No momento em que a gente tem uma taxa de juros mais alta e essa taxa, a Selic, fica mais alta que a inflação, a gente passa a ter o que chamamos de taxa real. Isso passa a ser um atrativo para o capital externo, para que investidores do mundo inteiro se interessem em investir no Brasil em busca dessa taxa real positiva que paga melhor do que em qualquer lugar do mundo. É o que a gente sempre teve, mas não está tendo desde o primeiro semestre de 2020, quando a inflação começou a disparar. Tivemos até taxa real negativa. Precisamos conter o câmbio e o Banco Central tem mecanismos para fazer isso: entrando no mercado, comprando e vendendo, fazendo o que for possível para segurar essa cotação.
Parar de falar bobagem
O segundo ponto é que o governo precisa parar de falar bobagem e colocar frases desconexas ou vir com ações que ele sabe que vai perturbar o mercado. É preciso ter um pouco mais de responsabilidade nas ações governamentais para poder fazer isso acontecer e, aí sim, a gente pode ter algum sossego, alguma melhora no preço do combustível. Mas não há perspectiva de se ter uma queda nos preços dos combustíveis nos próximos meses, no sentido de uma queda forte para voltar aos patamares que tínhamos antes.
Problema do etanol é a oferta
O problema do etanol é a oferta. Primeiro que houve uma quebra na safra e, segundo, que com o valor do câmbio e a demanda internacional por alguns produtos, parte da cana de açúcar que iria para a produção de etanol está sendo desviada para produzir açúcar para o mercado internacional. Temos a concorrência da matéria-prima.
Poupança e renda fixa
A tendência é que a renda fixa e a poupança comecem a ter valores melhores a partir do aumento da Selic, principalmente quando passar de 8%, e provavelmente isso vai acontecer em dezembro. Digo que guardar dinheiro é bom porque o custo do dinheiro está caro, o gasto com ele tem que ser com parcimônia porque ele vai custar muito caro ali na frente. O consumidor precisa entender isso: vale a pena gastar agora, vale a pena antecipar uma compra desde que eu não precise pegar financiamento.