Paralelo à rotina acadêmica, nos bastidores, alunos de engenharia (mecânica, elétrica e de automação) se reúnem para transformar a teoria em prática. Anualmente, universidades de diversos estados brasileiros se articulam para participar do Baja Sae Brasil, competição que promove a criação de veículos off-road, desde a concepção de projeto, estética, construção de sistemas e testes de funcionamento.
Na etapa preparatória sul deste ano, a 17ª edição do evento ocorre em Caxias do Sul, onde cerca de 500 estudantes apresentam seus projetos neste fim de semana. As atividades se iniciaram na sexta-feira e prosseguem até domingo. O evento é aberto ao público e ocorre no campus-sede da Universidade de Caxias do Sul, no acesso pelo Travessão Solferino (entre os bairros Presidente Vargas e Cruzeiro), em frente à Mecatrônica.
Vinte e nove instituições de quatro estados (Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Paraná e Mato Grosso do Sul) disputam três provas. Entre as 29 equipes, três são da Serra: Tobaja (UCS — campus Caxias), Bajagual (UCS — campus Bento Gonçalves) e Lanceiros Negros (IFRS de Farroupilha).
Embora se trate de uma competição, teoricamente, para os envolvidos, a grande conquista já se configura no próprio produto criado.
— É um projeto completo em termos de engenharia e controle de produção, que envolve todas as fases, planejamento e concepção de sistema. Mas, além das questões técnicas, desenvolvem-se também habilidades como trabalho em equipe e resolução de conflitos — destaca o coordenador dos cursos de Engenharia Mecânica e Automotiva da UCS, Alexandre Viecelli.
Na sexta-feira, os veículos passaram por inspeção técnica de segurança estática e dinâmica. No sábado, ocorre a apresentação oral e provas dinâmicas de aceleração, retomada, tração, manobrabilidade, suspensão e superprime e no domingo encerra-se com enduro de resistência e premiação.
— A participação de grande número de estudantes é oportunidade de intercâmbio de conhecimento para a instituição e também divulga Caxias como referência na área de engenharia, nos coloca de maneira bastante positiva no posicionamento regional, estadual e brasileiro frente aos indicadores de inovação — ressalta a diretora da Área do Conhecimento de Ciências Exatas e Engenharias da UCS, Neide Pessin.
Desde 2017 a Universidade de Caxias do Sul não apresentava projetos no Baja, embora participe do evento desde 1999.
Interesse das grandes
Segundo ela, a própria participação efetiva de investidores na organização demonstra a representatividade do evento para as áreas. Patrocinam a atividade as empresas Marcopolo, Randon Implementos, NSK, Danfoss, Dana e Voestalpini.
— Além dos investidores, temos a comunidade que nos percebe referência numa competição tão visada nos segmentos automotivo, eletro e e mecânico — complemente Neide.
Três equipes serão premiadas na competição pela somatória de pontos de todas as fases, que acontecem desde início do ano. Além da preparatória Sul, há outras duas regionais, as etapas Sudeste e Nordeste. Já de 11 a 15 de março de 2020 ocorre a competição nacional, em São José dos Campos.
O VEÍCULO
Os veículos Baja SAE são protótipos de quatro rodas, estrutura tubular em aço, off-road, com motor padrão de 10 HP, capazes de transportar uma pessoa com até 1,90m de altura e 113 kg. Composto de estrutura tubular dobrada, é formado por um cockpit onde fica o piloto e motor na parte traseira. Os sistemas de suspensão, transmissão e freios, e chassis são desenvolvidos pelas equipes, que também buscam patrocínio para viabilizar o projeto.
NÃO PERCA
Sábado: das 11h às 16h — provas dinâmicas (aceleração, retomada, tração, manobrabilidade, suspensão e superprime).
Domingo: 9h às 13h — enduro de resistência.
Simulação de mercado
Apesar de o evento ter caráter acadêmico, todas as fases da competição são análogas à atuação profissional. Se na futura profissão, estudantes decidirem seguir carreira na indústria automotiva de grandes marcas, o preparo para o mercado já é garantido no Baja Sae Brasil.
— Ex-integrantes das equipes que tínhamos estão no mercado trabalhando na área automotiva. E esse interesse despertou durante o processo de desenvolvimento do produto. Na vida profissional pode ser que eles não usem o mesmo motor, a mesma suspensão, mas os sistemas são semelhantes. Embora sejam diferentes em composição, o princípio é o mesmo — afirma o coordenador dos cursos de Engenharia Mecânica e Automotiva da UCS de Caxias, Alexandre Viecelli.
Ele acrescenta:
— Engenharia não consiste só em executar projetos. Muitas vezes os recursos são limitados, tem de aprender a lidar com todas as dificuldades. A competição mexe com a emoção, equipe vibra, procura resolver os problemas. Vão ter quebras de alguns sistemas, mas é isso, tem de resolver.
Além de demandar a aplicação de conhecimentos, alunos e professores precisam organizar a idealização e concepção de seu projeto em meio ao calendário acadêmico e a própria vida profissional.
— Por ser atividade extracurricular e extradisciplinar, tem de dar um jeito em arranjar tempo de aluno e professores. Mas vale a pena, a mentalidade dos envolvidos muda completamente do início até o fim do projeto, saem muito mais amadurecidos — exalta o professor orientador da equipe Tobaja, Sérgio da Silva Kucera.
O evento historicamente contou com participação recorrente de engenheiros hoje renomados em grandes marcas, entre as quais Volkswagen e Mitsubishi.
Criar carro do zero
Desde os 16 anos, Adriano Degregori se especializa em engenharia automotiva. Inicialmente, fez curso técnico na área, e atualmente, graduação pela Universidade de Caxias do Sul (UCS). Apesar de já atuar na "parte pesada" da área, trabalhando na Mercedes, desenvolvimento da Tobaja, projeto da equipe do campus Caxias da UCS, foi uma experiência completamente diferenciada para o estudante:
— No serviço já temos o passo a passo que algum engenheiro já elaborou. Neste projeto nós temos de fazer o carro do zero — comenta Degregori, capitão da equipe.
Ele ressalta que a concepção do veículo é, em tese, a aplicação do conteúdo estudado nas aulas. Em tese...
— É a oportunidade que temos de fazer testes da teoria, só que muitas vezes a teoria não fecha com a prática, só na hora que formos montar o produto é que achamos o defeito. Porém, é neste momento que aprendemos a trabalhar em equipe e resolver os problemas.
Criar o carro do zero significa não só definir os parâmetros de funcionamento e executá-los, mas pensar a estética e o apelo de marketing do produto. A Tobaja, por exemplo, explica Degregori, baseia-se, primordialmente, em elementos encontrados na tradicional marca de veículo agrícola, a Tobata.
— Por ser off-road, andar bastante no barro, a nossa proposta de marketing é para a diversão e para o campo. Testamos pneus traseiros de tobata para dar boa tração e foi o que melhor se adaptou. Por isso o nome. Tobaja seria a mistura de "Tobata" e "Baja".
A ideia, afirma, seria aprimorar o modelo nos projetos das futuras equipes da UCS:
— Concebemos como sendo uma empresa. A Volkswagen, por exemplo, tem o Gol, a gente tem Tobaja. As próximas equipes poderão fazer o Tobaja 2, ou fire, ou alterar o projeto.