A casa de Ana Rúbia Ruzzarin, no bairro Cinquentenário, em Caxias do Sul, exala aroma de chocolate – e não é somente no período de Páscoa. Durante todo o ano, os vizinhos "sofrem" com a essência doce que sai pelas janelas — e é difícil alguém não gostar. Na minifábrica, a produção é totalmente artesanal e livre de aditivos químicos.
Ana faz chocolate bean to bar — do grão à barra —, modelo que inclui desde a compra do cacau direto do produtor até o embalamento manual do produto final. O estilo diferente de fazer chocolate já é uma realidade nos Estados Unidos desde 2005 e começa a ganhar adeptos no Brasil.
Ana adotou a "modalidade" há um ano, depois de outras experiências com chocolate. Em tão pouco tempo, já ganhou bronze no prêmio Bean to Bar Brasil 2018 na categoria chocolate amargo (70% a 80% cacau) — premiação que foi dividida com as marcas Saramento’s, de Itapema (SC), e Cacau do Céu, de Ilhéus (BA).
— Imagina! Primeiro ano e já ganhei! — conta, feliz.
O chocolate premiado da Negro Doce, marca de Ana, é feito com cacau que ela compra de uma propriedade do Pará. Ela também usa fruta — "premiada", frisa — de uma fazenda de Linhares (ES).
— O que é bonito no bean to bar é que a gente dá emprego para a população ribeirinha. No Pará, são cooperativas de produtores rurais que moram nas zonas de cacaueiras. Trabalham na colheita do cacau o ano inteiro — orgulha-se.
A produção da Negro Doce é de 70 quilos de chocolate por mês. As barrinhas são deixadas em diferentes pontos de venda em Caxias, São Marcos, Farroupilha, Bento Gonçalves, Porto Alegre e São Paulo. O valor no mercado varia de R$ 9 a R$ 28, dependendo do estabelecimento.
Ana gostaria de baratear o preço de fábrica. Mas uma praga afetou o cacau nos últimos anos e elevou o preço. O quilo da fruta está em torno de R$ 28. Há cacau mais barato, mas, segundo ela, de qualidade bem inferior, o que acabaria prejudicando a qualidade do chocolate.
— Nesse cacau "podre" vou ter mais perda, vou ter que usar mais manteiga de cacau, vou ter que colocar um monte de saborizante.
Ainda engatinha
No RS há apenas duas empresas de chocolate bean to bar. Ana estima que nem 1% da produção de chocolate no Brasil é bean to bar.
Ovos para a data tradicional foram todos vendidos
Na quarta-feira, Ana já não tinha mais nenhum ovo de Páscoa. Todos já haviam sido vendidos. Restaram somente alguns coelhinhos. Ela fez uma produção extra para o período, que ficou entre 30% e 40%, mas resolveu não focar na data comemorativa, não por falta de tempo, mas porque não era o objetivo, explica:
— Se eu trabalhasse focada na Páscoa, venderia duas vezes mais. Mas eu quero criar pouco consumidor e fidelizar.
Conforme Ana, o cliente do bean to bar retorna porque, depois de comer, fica com a memória sensorial e acaba dispensando chocolates convencionais.
— Outra característica é que tu come um ou dois pedacinhos e se satisfaz porque é alto teor de cacau — acrescenta Ana, que produz chocolate com teores 45%, 55% e 70% cacau, além de diet e vegano.
Opção é renda extra para depois da aposentadoria
Embora ainda não esteja lucrando com a empresa, Ana garante que vale a pena investir. Apaixonada pela bean to bar, ela vê na Negro Doce sua renda extra após a aposentadoria. Personal trainer e proprietária de academia, ela pretende se dedicar exclusivamente à produção de chocolate em dois anos.
— O bom do chocolate é que ele demora dois anos para estragar. Ele fica dois anos na prateleira íntegro, a 23 graus. Qual produto alimentício tem essa durabilidade? Posso fazer um monte de chocolate e coloco nos pontos de venda — diverte-se.
Enquanto não se aposenta, ela vai conciliando os dois negócios. Ao lado do sócio, que mora em Zurique, ela projeta um crescimento de 10% a 12% anual. Para o próximo ano, planeja exportar para a Suíça e abrir uma loja conceito com outras marcas bean to bar em Canela. A ideia é continuar produzindo somente barras e introduzir, dentro de alguns anos, fruta brasileira.
O que é "BEAN TO BAR"
> Bean to bar significa do grão à barra.
> Na produção, o fabricante controla todo o processo, desde a fermentação dos grãos até o embalamento.
> Os grãos são selecionados de uma única origem, fermentados e torrados adequadamente.
> Há redução ou ausência de aditivos.
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