Não se sinta culpado em se divertir com as bizarrices cometidas por um cara de mullets descolorido, vestido como um integrante de banda poser oitentista, que ganha dinheiro explorando felinos de grande porte e dedica seu tempo livre matutando estratégias (geralmente criminosas) para acabar com sua maior inimiga, uma defensora dos direitos dos animais. Ao que tudo indica, você não está sozinho ao ser fisgado pelo universo absolutamente pitoresco presente na série documental Tiger King – que por aqui ganhou o nome de A Máfia dos Tigres. A produção já é uma das mais vistas da história da Netflix, o que só confirma seu exuberante potencial narrativo e a complexidade surreal de seus personagens.
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Dar play em A Máfia dos Tigres é ser engolido por uma história absolutamente eletrizante, que envolve elementos como violência, traição, crimes, sexo, drogas, ganância e muito exibicionismo. É como visitar os porões secretos do “american way of life”, onde a paixão pelas armas e por felinos de grande porte é uma realidade maciça. Já no trailer da série surge a informação de que existem mais felinos em cativeiro nos Estados Unidos do que na natureza do mundo todo – isso diz muito sobre o universo de A Máfia dos Tigres. Esses animais dão molho à produção documental, conduzida por donos de coleções, zoológicos, parques ou santuários repletos deles. E assim como os próprios tigres e leões, os humanos da série também são tão cativantes quanto perigosos.
Joseph Maldonado-Passage, o Joe Exotic, é a figura central da série. Dono de um parque de felinos de grande porte em Oklahoma, ele é a peça mais importante de um quebra-cabeças cheio de desdobramentos trágicos; e de personagens de índole duvidosa. A personalidade hipnótica de Joe – um caipira metido a cantor, obcecado por atenção e casado com dois homens – e todas as fases vividas por ele nos pelo menos cinco anos de gravação da série já dariam conta de uma grande história. Mas há ainda as figuras que correm pela beirada da trama, como a ativista pelos direitos dos animais Carole Baskin (arquirrival de Joe suspeita de ter matado o ex-marido e alimentado tigres com o cadáver), o também dono de parque de felinos Bhagavan “Doc” Antle (casado com três mulheres e acusado de “escravizar” funcionárias), o sócio sacana de Joe, Jeff Lowe, e muitos outros.
Entre tantas pessoas de caráter duvidável, o espectador encontra mais verdade nos próprios funcionários do parque de Joe (grande parte deles ex-presidiários). Em comum, todos possuem a paixão pelos animais, e acabam aguentando as maluquices do chefe para poderem estar em contato com os felinos. Nesse contexto, chama muita atenção a participação do tratador de tigres Saff (homem trans que foi incorretamente creditado como mulher na série). Ele participa de uma das cenas de acidente envolvendo ataque de animais mais apavorantes da série, e lida com isso de uma forma extremamente racional e madura. Outros funcionários como John Reinke, ex-gerente do zoológico que exibe próteses “tatuadas” em ambas as pernas, e o loiro cabeludo Erik Cowie também entram na leva de “pessoas gente fina” que causam empatia no espectador. Ainda do universo de funcionários de Joe estão Joshua Dial, que conduziu as campanhas políticas de Tiger King (sim, claro, porque a política é sempre um cenário ótimo para qualquer circo de absurdos), e Rick Kirkham, que era responsável pela série que Joe mantinha no YouTube.
Por falar em YouTube, outra particularidade é a presença das câmeras em toda e qualquer situação. E aí não entra somente o trabalho dos diretores, Eric Goode e Rebecca Chaiklin. Também estão presentes muitos registros em vídeo já feitos para canais que os protagonistas possuíam nas redes sociais. Até mesmo as câmeras de segurança são importantes aliadas na narrativa, pois captam a morte trágica de uma pessoa no zoo de Joe. Impossível não refletir sobre a era da imagem, da vaidade, do jogo de cena transportado para a vida real.
Em tempos de distanciamento social e incertezas perante à pandemia, A Máfia dos Tigres é um bom lembrete de que o mundo nunca foi um lugar normal.
Ficha
:: O quê: série “A Máfia dos Tigres” (2020).
:: Onde ver: disponível na Netflix.
:: Duração: sete episódios, com cerca de 45 minutos cada.
:: Novidade: devido ao sucesso da série, a Netflix disponibilizou recentemente um novo episódio, no qual alguns personagens contam o que acharam da produção.
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