Cronista do Pioneiro há cerca de 15 anos, a escritora Maria Helena Balen - falecida na madrugada desta quarta-feira - publicou seu último texto no jornal no dia 28 de abril deste ano.
Releia aqui a crônica:
AQUI SE FAZ, AQUI SE PAGA
Minha singela literatura sente necessidade de pensadores, poetas, escritores que me façam participar da trama, adentrar no livro e esquecer as horas, ler um poema tantas vezes, como aqueles da minha juventude que ainda guardo e sei de cor. Não estou me referindo a gênios, não, e aqui cito alguns exemplos.
Os provérbios que eu conheço encerram verdades incontestáveis, tesouros que atravessam gerações e jamais cairão no esquecimento. Quem foram os autores dessas sacadas inteligentes, minimalistas, que conseguem dizer tudo em poucas linhas? Tem algum provérbio de efeito, contemporâneo?
O título dessa crônica parece uma ameaça, uma retribuição a quem praticou uma injustiça, um " espera pra ver". Hoje, entendo melhor o velho ditado. Todos pagam, até os santos que não morrem jovens pagam. A velhice é um pagamento, mesmo tendo dinheiro para comprar remédio, plano de saúde, casa própria.
Sei que os leitores estão pensando: logo ela falando da velhice como um castigo, logo ela, que faz apologia do sem horário, do fazer só o que dá prazer. Pois hoje vou falar da minha saudade de caminhar pelas ruas dessa cidade que tanto amo, coreografar danças com a pessoa amada, pisotear na geada para ir trabalhar, acordar de madrugada não por insônia, mas para atender uma voz chamando: Mãe!
Gosto de degustar poemas, mas não os que começam do nada e levam a lugar nenhum. Ah, também vibro com Ivan Lins, quando canta " quero sua alegria escandalosa/ vitoriosa por não ter/ vergonha de aprender como se goza".
São tão poéticos que se tornam versos para todas as idades, sem censura.
No lixo da música dá para reciclar muita melodia, uma sucessão de sons e silêncios que me fazem fechar os olhos para escutar.
Escritores , não falo em clássicos " hors-concours", falo em escritores que ultrapassam o tempo do dia de autógrafos e que ficam na minha cabeceira, lidos, relidos, assinalados e incansáveis.
Não tem opção. É morrer jovem ou ficar velho. Eu fico com o "aqui se faz, aqui se paga". E pretendo continuar pagando por muito tempo.