Tenho dificuldade em entender a insistência com que algumas expressões são pronunciadas. Por exemplo, estas: "Meu Deus, o ano passou tão depressa!" ou "Falta-me tempo para tudo!" Como assim? Afinal, nós é quem somos os administradores de nossos dias e qualquer queixa se torna inútil se não for dirigida a cada um que a provoca. Observo, também, que muitos vivem como se estivessem numa eterna maratona, só que os rivais são eles mesmos, promovendo ultrapassagens de maneira tão obsessiva que mal percebem que os concorrentes são imaginários. Tenho amigos que exemplificam isso à perfeição.
Antes de ligar, já me preparo psicologicamente. Eles fazem o relato de tantas atividades realizadas - na semana, no mês - que eu mal consigo respirar. Sei que está longe de ser uma espécie de exibicionismo, tentando mostrar como são produtivos. Eles simplesmente são incapazes de parar. Emendam uma tarefa na outra, incessantemente. Parece que suas vidas só se legitimam pela exaustão. O que há de bom em ouvir relatos assim é perceber como estão distanciados da realidade que se apresenta em meu cotidiano.
Sinceramente, desconheço esse sentimento de urgência. Sobram-me horas para realizar o que desejo. E as que mais me agradam são aquelas em que o corpo e a mente estão em repouso. É complicado encontrar justificativas para esse frêmito, essa obrigação de modificar o mundo que nos cerca. O suor do rosto é o indicador menos confiável de que soubemos aproveitar o que nos é oferecido. O que realizamos com calma e consciência tende a ser incorporado ao repertório que lembraremos com gratidão. Qual a graça, afinal, de ficar correndo desesperadamente? Quando nossas ações são apaziguadas, elas reverberam com mais intensidade dentro de nós. O que é feito às pressas consome energia e deixa quem está próximo com a impressão de que está exaurido por osmose. Uma frase atropelando a outra, os gestos feitos em renovada luta ninguém sabe contra o que.
Quem me conhece é testemunha de como eu evito proferir essas frases queixosas, especialmente em dezembro, quando a exaustão parece ser quase protocolar. Só nos sentimos realizados ao afirmar que temos a sensação de que já está terminando o que mal começou. Dê a esses competidores compulsivos mais cinco ou dez horas diárias e, mesmo assim, eles transformarão essas novas jornadas num périplo que parece não terminar nunca.A questão é sempre interior, e escapa do que está marcado no relógio. Encontrar a dose certa entre a ação e a reflexão é um desafio permanente.
É pouco saudável ter uma postura de passividade, mas há escasso mérito em manter o coração acelerado desde os primeiros minutos em que se acorda. Costumo fazer um acordo comigo mesmo: medir o êxito apenas pela satisfação do que foi realizado. Deixo a quem aprouver essa fome de lobo.Vou logo ali repousar e volto mais tarde.