Há elementos curiosos no mundo que me encantam e trazem elementos para entender melhor a realidade ao nosso redor. Nesta semana, me deparei com o conceito de “Ancient Lights”: essa lei britânica das “luzes antigas” ou de “direito à luz” garante que uma janela que tenhacandice recebido luz natural por pelo menos 20 anos tenha proteção legal contra obstruções. Isso impede que construções futuras bloqueiem a entrada de luz solar, garantindo iluminação contínua aos proprietários de imóveis. Se procurar na internet, você verá fotos de casas e sobrados com plaquinhas sob o parapeito das janelas onde se lê “Ancient Lights”, herança do direito adquirido a partir de 1832.
O mais interessante é que lá no Oriente, mais precisamente no Japão, há uma regulamentação parecida chamada nisshoken (literalmente “direito à luz do sol”). Acredito que tal conceito seja um reflexo de alto grau civilizatório, quando uma sociedade compreende o bem-estar — reforçado aqui por um lar ensolarado — como um direito adquirido que deve ser preservado tanto quanto uma edificação antiga considera patrimônio histórico.
O mesmo deveria valer para ar limpo e perfumado pelas flores e vegetação, para a água limpa e potável, para parques e ruas arborizadas. A natureza deveria ser considerada um bem maior a ser preservado e usufruído pelos cidadãos ao longo dos anos, jamais depredado, poluído e vilipendiado de uma hora para outra em nome de um falso progresso. Contudo, vivemos numa era em que certas ideias de desenvolvimento não passam de grandes retrocessos. Confundem desavisados e despertam grande preocupação em ambientalistas. Um adendo: não me refiro aqui a ambientalistas de boutique cooptados por pautas e narrativas a serviço de determinada ideologia. Falo daqueles que, sejam de direita ou de esquerda, realmente compreendem que a natureza — a fauna, a flora, as águas, o solo, a vegetação, o relevo, a luz solar — são os maiores patrimônios que temos e que devem ser preservados a todo custo.
É muito triste quando se constroem edifícios de 14 andares jogando sombras em centenas de metros quadrados de uma zona urbana, ou pior ainda, de uma praia. Há tempos nos tiraram o direito ao sol com a desculpa de verticalizar cidades para deixar as pessoas mais perto de escolas, comércio, escritórios, do trabalho. Não é bem assim: a verticalização faz parte de projetos de gentrificação que vão beneficiar poucos e gerar outros problemas em vez de resolver os que já temos. Mais gente vivendo na mesma quadra significa mais lixo e mais esgoto produzido num único local, e menos qualidade de vida.
E se essa verticalização for à beira-mar, torna-se ainda mais aterradora, como no caso preocupante do projeto dos edifícios de 14 andares junto ao Parque Estadual José Lutzenberger, o Parque da Guarita, em Torres. Os danos paisagísticos, ecológicos e urbanos talvez sejam inúmeros, e as propostas que contemplem a proteção do Parque da Guarita e de seu entorno, infelizmente, ainda são débeis. Aguardemos os próximos capítulos.