As eleições municipais de 2024 talvez tenham sido o grande despertar para a vida real que os militantes de esquerda precisavam. Faz muito, mas muito tempo mesmo que partidos como o PT e o PSOL se distanciaram do povão. O uso de termos pejorativos como “pobre de direita” ou “CEO de Uber” para rotular quem vota no espectro oposto ao socialismo de boutique deles certamente teria o devido revide. E o revide veio agora, no voto.
O PT sequer conseguiu chegar ao segundo turno das eleições em Caxias do Sul, segunda maior cidade do Rio Grande do Sul, um dos mais importantes polos metalúrgicos do Brasil. Em Porto Alegre, Maria do Rosário quase perde a vaga para Juliana Brizola (tivesse a campanha mais uma semana, seria a neta do ícone quem disputaria a prefeitura com Sebastião Melo). Em São Leopoldo, cidade considerada um dos redutos eleitorais mais importantes e estratégicos para os petistas, a esquerda perdeu para um candidato do nêmesis PL.
A enchente de maio sem dúvida pautou a campanha em Porto Alegre e São Leopoldo, e é no mínimo intrigante que os porto-alegrenses tenham “perdoado” Melo enquanto os cidadãos de São Leopoldo defenestraram Ary Vanazzi, prefeito petista que comandou a cidade por longos oito anos e não elegeu o sucessor. Tenho uma hipótese: provavelmente os gaúchos entendem que quem falhou no socorro durante a enchente e no envio de recursos para a reconstrução não foram necessariamente os prefeitos, mas o Governo Federal.
Encabeçado por Lula, o Painho líder máximo da esquerda brasileira, e aqui representado pelo tal “ministro interino” Paulo Pimenta, o governo petista foi bizarramente canhestro ao lidar com o maior desastre natural da história do país quando justamente os mais carentes sofreram mais. O socorro veio do vizinho, do pastor da Igreja, dos salões paroquiais, das organizações civis, dos familiares que os abrigaram em suas casas. A percepção geral do povo é a de que o presidente os abandonou.
Já em Caxias do Sul, praticamente poupada dos estragos da natureza selvagem, a rejeição à candidatura de Denise e Alceu se justifica pelo forte antipetismo da região, potencializado por uma inflação real percebida como muito maior que a divulgada pelo governo de Lula. Numa terra de “gringos”, o bolso sempre vai falar mais alto.
As preocupações com a economia e altíssima carga de impostos ditaram o tom das eleições municipais na Serra, e o resultado só pegou de surpresa os desavisados de sempre: intelectuais, formadores de opinião, militância e políticos cheios de teorias arrogantes achando que só eles sabem o que o povo quer, do que o povo precisa.
Quando é que os líderes identificados com um projeto de esquerda vão sair de suas bolhas e tentar entender as reais causas da rejeição contínua ao seu projeto de poder e de governo? Não adianta dizer que o povo é “burro” e que “não sabe votar”. Democracia só serve quando ganham? As eleições municipais são o retrato mais fiel do povo e do que ele anseia. Prestem atenção.