Alfredo Fedrizzi, conselheiro e consultor
Em tempos de guerras e polarizações, o ódio está no ar. Há poucos dias li o livro “A Máquina do Caos”, de Max Fisher. Imperdível para entender como plataformas como Facebook, Youtube e Twitter/X manipulam a mente humana e ganham muito dinheiro com isso.
Através de depoimentos de dirigentes, funcionários e pesquisadores mostra como as redes manipulam a mente humana para ganhar mais dinheiro.
E me dei conta que andamos por aí com “a máquina do ódio” no bolso. Trata-se do onipresente celular, com seus aplicativos de redes sociais.
A máquina do ódio você carrega no bolso
E pensar que um dia chegamos a acreditar que a internet iria tornar o mundo melhor! Mas o sonho bom, onde cada um teria sua voz e poder de manifestação, virou um pesadelo! O espaço de exibicionismo deu lugar à incitação de violência, ódio, conspiração, extremismo, distorção da realidade e mentiras. As mídias sociais tornaram-se tóxicas. Os mais atentos desconfiam do que recebem. Poucos checam a veracidade dos fatos. Sequer identificam quem veiculou. Conteúdos distribuídos por plataformas como Facebook e Twitter, se eximem de qualquer responsabilidade.
Sean Parker, primeiro presidente do Facebook, explica o raciocínio usado para construir esses aplicativos: "Como consumir o máximo possível do seu tempo e da sua atenção? Precisamos provocar em você um pico de dopamina, quando alguém curte ou comenta sua foto ou postagem. Isso o leva a contribuir com mais conteúdo, que vai render mais curtidas e mais comentários […] Um ciclo de retroalimentação da validação social, explorando um ponto vulnerável na psicologia do ser humano. Compreendemos isso desde o início. E fizemos mesmo assim". Nir Eyal, consultor do Vale do Silício, acrescenta: "Nossas ações foram projetadas por outros. Serviços como Twitter e Youtube modificam habitualmente nosso comportamento cotidiano, tal como seus desenvolvedores pretendiam".
As plataformas decidem quais dos nossos comentários vão distribuir a quem e em qual contexto. E essas decisões são invisíveis. A dopamina induz o usuário a repetir essas ações. É cúmplice das mídias sociais dentro do nosso cérebro. Apoderam-se de uma compulsão: a necessidade de se conectar. Assim, as pessoas passaram a ficar mais tempo nas plataformas do que socializando fora delas. Ganham mais dinheiro quando as pessoas brigam. Não querem perceber os limites entre liberdade de expressão e discurso de ódio. E terminam incentivando o terrorismo, genocídio, manipulação de eleições, destruição de reputações, cancelamentos, ataques pessoais irresponsáveis. Democratizaram a intimidação. E a desinformação corre sem freios.
O poder de persuasão e amplificação que uma mídia social tem é inimaginável. Exploram a atração do cérebro humano pela discórdia. Tornaram-se um dos maiores perigos do nosso tempo, "levando pessoas a auto reforçar as câmaras de eco do extremismo, adestrando-as a odiar", apontou uma auditoria independente feita no Facebook em 2020.
Enquanto os veículos tradicionais conseguem filtrar e checar a veracidade do que é veiculado, nas mídias sociais isso não acontece.
Com dificuldade de localizar e processar os mentirosos, as instituições democráticas, leis e controles não conseguem acompanhar a velocidade com a qual as coisas são feitas. É impossível estar à frente dos hackers. Se juntarmos a inteligência artificial, que recombina coisas e faz com que pessoas digam coisas que nunca disseram, cria, modifica e corrompe imagens e falas de maneira criminosa, estamos diante de algo que transforma o jeito como pensamos e como nos comportamos, atingindo como nos relacionamos uns com os outros.
O efeito, multiplicado por bilhões de usuários, tem sido a transformação da própria sociedade. O que fazer? Primeiramente, tomarmos consciência e sermos mais seletivos na escolha das plataformas que vamos estar. Dar menos curtidas, nas que ficarmos, especialmente em opiniões polêmicas. Buscar construir diálogos possíveis e, se tudo isso não for suficiente, que tal fazer um detox de redes sociais e perceber como você se sente?
Lembre-se: você pode carregar a máquina do ódio no bolso, mas quem decide se vai acionar ela, ainda é você.