Por Ely José de Mattos, economista e professor da Escola de Negócios da PUCRS
A pandemia do novo coronavírus está estabelecida, nos trazendo toda sorte de desafios. E esta semana tem crescido uma polêmica sobre uma potencial escolha que precisaria ser feita: manter o isolamento ou salvar a economia. Alguns empresários semearam a polêmica ao vir às redes sociais afirmar que o número de mortes pelo vírus poderia não justificar a crise econômica na qual estaremos metidos depois que superarmos a epidemia. Uma falsa polêmica!
Comecemos pela doença. O isolamento tem se mostrado, globalmente, a melhor alternativa para conter a propagação do vírus. E isso é extremamente importante, pois a COVID19 associa uma taxa de letalidade que não é desprezível (especialmente para os grupos de risco) e uma taxa de contágio muito alta, ou seja, muitas pessoas tendem a ficar doentes ao mesmo tempo - e, assim, o número absoluto de mortes acaba sendo grande, como estamos vendo na Itália, Espanha e Irã. E em função dessas características, os sistemas de saúde são levados ao limite.
É fácil perceber o benefício de medidas mais radicais na contenção da epidemia para salvar vidas. Isso deveria bastar, não? Mas, a polêmica com a economia surgiu esta semana com força. O argumento é que o fechamento dos negócios vai provocar uma crise tão grande, que gerará mais custos do que as mortes e internações pela COVID19 em uma situação de não isolamento. Logo, as medidas seriam exageradas. Errado, por duas razões!
Primeiro, há estudos apontando que grandes recessões não causaram aumento significativo de mortalidade - ao contrário do que análises rasas por aí andam afirmando. Ainda que se atribua um valor estatístico à vida - o que já é um apelo desesperado para construir um argumento pobre - a conta não bate. Não é possível afirmar que "vai morrer mais gente de fome do que de COVID19" ou que "sairá mais caro".
Em segundo lugar, essa polêmica só teria algum sentido se ignorarmos o papel do Estado no suporte à economia. Em situações de crise como essa, é um equívoco monumental manter o apego ao ajuste fiscal. Já circulam ideias entre economistas que apontam gastos em torno de 5% do PIB para dar suporte à economia - especialmente às pessoas mais vulneráveis. É muito razoável e viável!
O governo federal precisa agir de acordo com a gravidade da crise. Caso contrário, estará plantando uma profecia auto-realizável: a crise será brutal pela sua inação.