* Psicóloga clínica, psicóloga educacional no Colégio Santa Inês, professora visitante da pós-graduação em Educação Infantil da Unisinos
Fala-se muito que as crianças precisam de limites. Do que estamos falando quando dizemos isso? Há uma discussão de fundo nessa questão, mas pouco dialogada: as crianças estão se tornando responsáveis pela felicidade dos adultos. Estão insufladas de expectativas ocultas de sucesso que definem o sucesso dos adultos frente aos demais. O tempo do bebê como majestade da casa está sendo exageradamente estendido na infância. E ser rei ou rainha o tempo todo é muito chato. As crianças gostam de serem comuns, reles plebeus a brincar espontaneamente. Penso que isso tem ocorrido por diversos fatores, mas gostaria de destacar um deles: a pobreza afetiva da vida atual dos adultos.
Que vontade de crescer hão de ter as crianças se o que elas percebem dos adultos à sua volta é uma submissão extenuante ao trabalho e às cobranças sociais? Coisa boa ser criança e ter adultos a nos contar histórias de arregalar os olhos de seus feitos corajosos; adultos que leem livros de gente grande com voracidade e nos dão provinhas das histórias maravilhosas que um dia poderemos ler; adultos que dançam; que namoram com alegria; que falam com prazer do seu trabalho; que viajam sem as crianças e não morrem de tédio por isso; enfim, adultos com uma vida interessante aos olhos das crianças. Uma vida interessante não é uma vida perfeita. É uma vida de paixões, em que os bons encontros são compartilhados com os filhos. As crianças gostam que os adultos compartilhem seus gostos com elas. Isso produz vínculo e vínculo é o que torna possível a construção de limites.
Do que o seu filho verdadeiramente precisa? Faça-se essa pergunta. Talvez a resposta seja: você. Porém, não reduza essa resposta a mais doses de atenção artificial (daquela apressada, pois você está com vontade de olhar o celular). O seu filho precisar mais de você pode significar que ele precise que você invista em você mesmo, para que a sua vida valha a pena aos seus olhos e aos dele e, quando estiverem juntos, ele conheça o seu lado brincante, criativo e inteiro. Assim, no momento das birras e teimosias, você estará mais disponível para compreender o que a criança está comunicando e será mais fácil ajudar o seu filho a crescer.