Tem uma frase que volta e meia ouço, quando começa uma conversa sobre os males do Brasil. Ela surge implacável, ensinando-nos, que "o Brasil não é para principiantes". Não o é para ser compreendido ou explicado. É chavão que congela o debate e aplaca a consciência. Mas, faz muito, concluí que não é nada disso. O Brasil é, sim, para principiantes, a pensar no Brasil. Inclusive, brasileiros.
O jogo de azar é proibido, mas a União é a banca do jogo de azar. Agentes de trânsito estacionam em local proibido, para autuar quem está em local proibido estacionado. Os juros para pessoas naturais são muito maiores do que para empresas, em bancos públicos, cujos recursos vêm dos impostos pagos pelos naturais. Os parlamentares eleitos por siglas comunistas ou socialistas vão fazer compras na pátria do capitalismo. O partido que fez carreira contra a "maracutaia" é o maior maracutaiador do Brasil. A grande empresa dá calote no IPTU e paga obra pública quando abre uma nova loja. E por aí vai.
Em tudo e por tudo, porém, atrevo-me a enxergar a "lógica", regra, patente no agir, dizer, e na lei. É a filosofia de fins, espontânea, do Brasil: o privado é público; o público é privado.
Os governos (União, Estados, municípios) abocanham em torno de 60% da renda da população, tornando público, seu, o que é privado; mas é ao bem comum, alega-se. Falso. As obras públicas são puro desvio e viram ruínas antes de prontas. O transporte público está há décadas atrasado. O chão que compraste é teu. Mas o subsolo pertence à União. A palavra "público" nem mesmo significa "o público", mas, sim, "do Estado". Lembra de Mussolini. Isso não é "não ser para principiantes". Qualquer um vê o que é. Prensa a mente e pensa.
E, de tanto as esferas de governo terem se apropriado do que é de cada um, os indivíduos, na naniquice de seu cotidiano, foram se adonando do que é de todos, foram privatizando, aqui e ali, momentaneamente, o que é do Estado, supostamente público. Todos reclamam do governo, mas é do Estado que deveriam se queixar.