O caso que provocou comoção do país inteiro, ocorrido na pacata Três Passos, no noroeste gaúcho, completa três anos sem uma definição sobre o julgamento dos réus. Bernardo Uglione Boldrini, então com 11 anos, foi morto pela madrasta Graciele Ugulini, com ajuda da então amiga, Edelvânia, e do irmão dela, Evandro Wirganovicz, em 4 de abril de 2014. O mentor de tudo, segundo o Ministério Público, foi o pai da criança, o conhecido médico da região Leandro Boldrini.
Bernardo foi morto após ingerir quantidade excessiva de sedativos e teve o corpo enterrado numa cova, próximo a um rio, no interior de Frederico Westphalen.
Os advogados de Leandro Boldrini ingressaram com agravo contra a decisão da 2ª vice-presidência do Tribunal de Justiça, que negou seguimento ao recurso especial movido pelo réu. Com isso, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) terá de decidir se admite analisar o recurso para depois julgar o mérito dele. Caso admita, o julgamento dos réus vai demorar ainda mais.
O advogado de Evandro, Hélio Sauer, tentou o julgamento de seu cliente em processo separado, mas não conseguiu. Para ele, Evandro está preso injustamente durante três anos e é tão vítima quando Bernardo.
"A diferença do Evandro com o Bernardo foi que o Bernardo, mataram cruelmente, covardemente. E o Evandro, enrolaram no meio", sustenta Sauer.
Evandro foi preso após o depoimento de uma testemunha, que viu o carro dele próximo ao local onde foi cavado o buraco para enterrar o corpo de Bernardo, dias antes do crime. Ele é acusado de ajudar a fazer a cova.
O advogado de Edelvânia, Gustavo Nagelstein, critica o tempo em que sua cliente está presa sem o julgamento.
"Ela está presa sem a culpa estabelecida. E a regra é que a pessoa é inocente até que se prove o contrário", destaca Nagelstein.
Nagelstein tenta desclassificar o crime para homicídio culposo, quando não há intenção de matar, evitando o julgamento pelo Tribunal do Júri e fazendo com que os réus sejam julgados por um juiz de 1ª instância. Busca ainda afastar as qualificadoras de motivo torpe, em função da herança de Bernardo, motivo fútil, porque o menino era considerado um "um estorvo" para o casal, emprego de veneno e recurso que dificultou a defesa da vítima.
"Nós negamos a autoria. Numa hipótese alternativa, que ela seja submetida ao Tribunal do Júri sem as qualificadoras", afirma Nagelstein.
Os advogados de Leandro e Graciele preferiram não se manifestar sobre o caso. Para o advogado da avó do menino Bernardo, Jussara Uglione, Marlon Taborda, o processo teve andamento célere na 1ª instância, mas agora está com tramitação demorada no Tribunal de Justiça.
"Depois desse divisor de águas, nós vemos que o Tribunal de Justiça analisou, mesmo que tecnicamente de forma elogiável, analisou de forma bastante morosa. Somente agora, depois de um ano, o processo vai para o Superior Tribunal de Justiça, em Brasília", afirma.
Leandro, Graciele, Edelvânia e Evandro (Foto: Ricardo Duarte/Agência RBS)
Longo processo
Sem entrar no mérito do caso específico, o presidente da Associação dos Advogados Criminalistas do Rio Grande do Sul, César Peres, considera três anos de prisão um período excessivo para quem ainda não foi julgado.
"O Estado quando quer agir, prender, atacar o cidadão no seu bem maior, na liberdade individual, ele tem que ser rápido, com presteza. Não é possível que réus aguardem por três, quatro cinco anos, sem ter o seu direito constitucional de verem o seu pleito apreciado pelo Poder Judiciário. O Poder Judiciário se quiser prender o cidadão, tem que atuar rapidamente", sustenta o advogado.
O presidente da Associação do Ministério Público, Sérgio Harris, lembra que o processo só está mais demorado em razão de recursos dos réus.
"O manejo dos recursos gera um retardamento natural no trâmite do feito. Veja que a sentença de pronúncia foi prolatada num prazo normal. O Tribunal de Justiça julgou num prazo legal e os réus que é interpuseram recurso para Brasília".
O presidente do Conselho de Comunicação do Tribunal de Justiça, desembargador Túlio Martins, considera a tramitação do processo razoável. Lembra que o tempo tem relação direta com os recursos interpostos.
"E agora a defensa ingressou com um recurso para o Superior Tribunal de Justiça. Isso é uma coisa que o Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul não tem nenhum domínio. Quanto mais você recorre, obviamente mais o processo demora".
Sobre a reclamação do excesso de prazo na prisão dos réus que ainda não foram julgados, lembra que as decisões tiveram como base permissivos legais.
"A gravidade do crime, me parece, que é indiscutível. São todas as decisões muito bem fundamentadas e que vêm sendo sucessivamente confirmadas. Tanto as do 1º grau, quanto aos do 2º grau pelo Superior Tribunal de Justiça".
Histórico
Leandro, Graciele e Edelvânia estão presos desde 14 de abril de 2014, quando o corpo do menino foi encontrado. O assassinato ocorreu 10 dias antes. Já Evandro foi preso quase um mês depois, pela acusação de ter ajudado a irmã e a madrasta a ocultar o cadáver do menino.
Leandro está na Penitenciária de Alta Segurança de Charqueadas (Pasc); Edelvânia, na Penitenciária Estadual Feminina de Guaíba; Graciele, na Penitenciária Feminina Madre Pelletier, em Porto Alegre; e Evandro, no Presídio Estadual de Três Passos.
Passados três anos, a avó do menino Jussara Uglion, diz que ainda não acredita no que aconteceu. "Penso que isso é um pesadelo. Que eu sonhei mal. Aí eu acordo mais agitada", desabafa emocionada.
Jussara só tem um desejo para este caso. "Eu vou continuar rezando e esperando a justiça dos homens, porque a de Deus não falha", conclui.