
No dia do segundo turno das eleições legislativas mais incertas da história do país, que poderá obrigar o presidente Emmanuel Macron a compartilhar o poder com um novo governo de extrema direita na Europa, os quase 50 milhões de franceses convocados às urnas têm diante de si um dilema nestas eleições antecipadas: votar no partido de extrema direita Reagrupamento Nacional (RN), de Marine Le Pen, ou na "frente republicana", formada pela esquerda e pela coalizão de centro-direita.
As seções eleitorais abriram neste domingo (7) às 8h locais (3h de Brasília), após os eleitores que vivem nos territórios franceses na América e em outros países do continente americano votarem no sábado (6).
— O que está em jogo neste domingo é, pela primeira vez na história de nosso país, a possibilidade de uma vitória da extrema direita nas urnas — alertou na sexta-feira (5) o líder social-democrata Raphaël Glucksmann.
O partido sucessor da Frente Nacional, de Marine Le Pen, conhecido por seus comentários racistas e antissemitas, e seus aliados, venceu o primeiro turno com 31,37% dos votos e agora espera alcançar uma maioria absoluta.
— Temos muitas chances de obter a maioria absoluta de 289 deputados — assegurou na sexta-feira Le Pen, cujo partido propõe como primeiro-ministro o jovem Jordan Bardella, 28 anos.
Seu programa se baseia em três pontos: controle da imigração, segurança e poder de compra. O RN promete um "big bang" na autoridade escolar, além de reservar a nacionalidade para crianças com pelo menos um progenitor francês, entre outras medidas.
A vitória da extrema direita na segunda maior economia da União Europeia e potência nuclear também poderia enfraquecer a influência da França em Bruxelas, onde tem sido um dos principais motores da integração europeia, e minar o apoio político à Ucrânia.
E acrescentaria um novo governo com ultradireitistas na Europa: na Itália, a pós-fascista Giorgia Meloni é a primeira-ministra; e também fazem parte do Executivo em outras nações como Finlândia, Eslováquia e Países Baixos.
Para evitar isso, a Nova Frente Popular (NFP) — uma coalizão de esquerda que vai desde a ala social-democrata até anticapitalistas e que obteve 28% dos votos no primeiro turno — e a aliança de Macron (20%), formaram uma "frente republicana".
Esse princípio implica a retirada do candidato "republicano" com menos chances de vencer nas circunscrições onde ambas as alianças se classificaram para o segundo turno, junto com um adversário de extrema direita em posição forte.
A estratégia parece dar resultados. As últimas projeções da Ipsos e do Ifop dão ao RN e seus aliados entre 170 e 210 assentos dos 577 da Assembleia Nacional (Câmara Baixa), apesar de, antes das retiradas, a maioria absoluta parecer possível.
Mas essas projeções também apresentam um cenário em que os três blocos surgidos das eleições de 2022 — esquerda, centro-direita e extrema direita — continuam, com uma nova distribuição de forças e sem maiorias claras.
Várias hipóteses emergem: uma coalizão entre parte da esquerda, o governo e deputados de direita que não se aliaram ao RN, ou até mesmo um governo tecnocrata com apoio parlamentar.
Mas a ideia de uma "grande coalizão" se mostra difícil. A NFP prometeu revogar a impopular reforma da previdência de Macron e aprovar um imposto sobre grandes fortunas, duas linhas vermelhas para seus eventuais aliados.
A menos de três semanas do início dos Jogos Olímpicos de Paris, o primeiro-ministro de centro-direita, Gabriel Attal, anunciou que seu governo está disposto a permanecer "o tempo que for necessário" para garantir a continuidade do Estado.
A taxa de abstenção será crucial. A participação no primeiro turno foi quase 20 pontos superior à de 2022, mas a política de abandonos poderia desanimar eleitores obrigados a votar em um candidato oposto às suas ideias.
Diante de possíveis "distúrbios", as autoridades mobilizarão 30 mil policiais e gendarmes na noite de domingo, após uma campanha marcada pela tensão e agressões a cerca de cinquenta candidatos e militantes.