As negociações para a escolha de autoridades de transição avançavam nesta quarta-feira (20) no Haiti, de onde os Estados Unidos retiraram mais cidadãos devido à insegurança causada pelas gangues.
Os distúrbios se concentraram nas últimas horas em Pétion-Ville, uma área abastada nos arredores da capital, onde o som de tiros é frequente, segundo um correspondente da AFP.
O país caribenho vive semanas de terror desde que bandos armados iniciaram uma guerra aberta contra o polêmico primeiro-ministro, Ariel Henry, com ataques a delegacias, prisões e outros edifícios públicos.
Na semana passada, o premier concordou em renunciar e abrir caminho para um conselho presidencial de transição, cuja formação tem sido atrasada por dissensões internas.
Nesta quarta-feira, o EDE/RED, um dos partidos que já havia escolhido seu candidato para integrar o órgão governamental, decidiu mudar de representante.
"As conversas continuam. Estou confiante de que levará um pouco de tempo, mas tudo indica que estão avançando", disse nesta quarta-feira Carolyn Rodrigues-Birkett, embaixadora da Guiana na ONU.
Uma fonte do governo haitiano afirmou à AFP que "nenhuma lista [de membros do conselho] foi comunicada" a Henry.
O líder questionado governava desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse em 2021, mas, nas últimas semanas, sua posição tornou-se insustentável em um país que não realiza eleições desde 2016.
- Evacuações por helicóptero -
As novas autoridades - formadas por representantes de partidos políticos e da sociedade civil - deverão escolher um primeiro-ministro interino e formar um governo inclusivo.
Um de seus primeiros desafios será conter a insegurança crônica, uma tarefa para a qual talvez recebam ajuda de uma missão internacional com policiais do Quênia.
Após a renúncia de Henry, o país africano suspendeu sua participação nessa força supervisionada pela ONU, mas depois afirmou que manteria seu compromisso assim que o conselho de transição fosse instalado.
"Houve hoje muitos bloqueios de ruas em Porto Príncipe. Como resultado, o Programa Mundial de Alimentos só conseguiu levar alimento quente a 10 dos 14 lugares aos quais previa chegar", lamentou nas redes sociais Jean-Martin Bauer, representante no Haiti desse órgão da ONU. "Faremos o que pudermos para ajudar, mas precisamos de segurança e acesso."
O toque de recolher noturno, que deveria terminar hoje, foi prorrogado até sábado no departamento do oeste, que inclui a capital, anunciou o governo.
Diante da violência em Porto Príncipe, os Estados Unidos anunciaram nesta quarta-feira que haviam fretado um helicóptero para transportar 15 de seus cidadãos da capital para a vizinha República Dominicana. "Esperamos que o helicóptero faça várias viagens para tentar tirar o maior número possível de americanos", disse um porta-voz do Departamento de Estado.
Separadamente, um voo de resgate organizado pelo governador da Flórida, Ron DeSantis, transportou na noite de hoje 14 americanos do Haiti para aquele estado americano. DeSantis disse que esse deve ser "o primeiro de muitos voos" para cidadãos americanos, segundo a imprensa local.
- 'Arruinado' -
Porto Príncipe continuava sofrendo com a lei das gangues. Um policial designado para a segurança do gabinete do primeiro-ministro foi morto a tiros hoje, segundo o sindicato de polícia Synapoha.
E os gangues estão tentando tomar o controle de áreas de Pétion-Ville, de acordo com três moradores locais contatados pela AFP.
Em algumas estradas dessa comuna, os residentes ergueram barricadas em uma tentativa desesperada de se proteger do ataque dos grupos armados, disseram as mesmas fontes.
"Estou arruinado. Não tenho mais nada para vender", lamentou na terça-feira Gérard Vil, um comerciante da região. "Sempre vivi em Pétion-Ville, mas vendia coisas no centro de Porto Príncipe. Desde que a insegurança aumentou, não dá mais para vender lá".
Diante do caos e do temor de um êxodo em massa, o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Refugiados (Acnur) lembrou que é "imperativo garantir que os haitianos recebam a proteção internacional do estatuto de refugiado que possam precisar".
"Também reiteramos nosso apelo a todos os Estados para que não forcem o retorno de pessoas ao Haiti, incluindo aquelas cujos pedidos de asilo foram rejeitados", insistiu a agência da ONU.
* AFP