O primeiro-ministro do Haiti, Ariel Henry, renunciou ao cargo e cedeu o poder a um governo de transição no país caribenho, segundo um anúncio na madrugada de terça-feira (12) em um vídeo publicado nas redes sociais do governo. O Haiti enfrenta uma onda violência.
— Há mais de uma semana, nosso país vive um aumento dos atos de violência contra a população — lamentou Henry na mensagem gravada em língua "créole" haitiana. — O governo que dirijo não pode permanecer indiferente diante da situação. Como eu sempre disse, nenhum sacrifício é grande demais para nosso país — acrescentou.
O governo "aceita a instauração de um conselho presidencial de transição", cujos membros serão escolhidos entre diversos setores da vida nacional, explicou.
A notícia havia sido antecipada por Irfaan Ali, presidente da Guiana e atual líder da Comunidade do Caribe (Caricom).
O grupo regional organizou na segunda-feira (11) na Jamaica uma reunião em caráter de urgência para abordar a crise no Haiti, com a participação de representantes de várias potências estrangeiras, incluindo os Estados Unidos.
O destino de Henry, que estava no poder desde o assassinato do presidente Jovenel Moïse em 2021, era incerto há algum tempo, em um país que não celebra eleições desde 2016.
O neurocirurgião que virou político deveria ter deixado o governo em fevereiro, mas permaneceu no cargo após um acordo com a oposição.
No início do mês, as gangues que controlam grande parte do Haiti realizaram uma série de ataques contra locais estratégicos em Porto Príncipe, como a sede da presidência, o aeroporto e penitenciárias, enquanto exigiam a renúncia de Henry.
Uma boa recepção
Em Kingston, Irfaan Ali celebrou a decisão do governante haitiano em uma entrevista coletiva.
— Temos a satisfação de anunciar o nosso compromisso com um acordo de governo transitório que prepare o caminho para uma transferência pacífica de poder — declarou o presidente da Guiana. — Com este objetivo, tomamos nota da renúncia do primeiro-ministro Ariel Henry — acrescentou.
O atual Executivo será substituído por um conselho presidencial de transição composto por sete membros, que representarão os maiores partidos políticos do país, o setor privado e o Acordo de Montana, uma coalizão que apresentou a proposta de um governo interino após o assassinato de Moïse, explicou Ali.
O conselho também terá dois observadores sem direito a voto, um para a sociedade civil e outro para a comunidade religiosa.
Nenhum integrante pode ter sido acusado ou condenado em qualquer jurisdição, nem ser objeto de sanções da ONU ou pretender concorrer nas próximas eleições no país.
O chefe da diplomacia dos Estados Unidos, Antony Blinken, confirmou a renúncia de Henry em uma ligação telefônica iniciada pela primeira-ministra de Barbados, Mia Mottley, depois de participar na reunião de Kingston.
Um funcionário do governo americano que viajava com o secretário de Estado afirmou que Henry concordou em renunciar na sexta-feira (8), mas aguardou a conferência de Kingston para finalizar os detalhes da transição.
Ao comentar possíveis represálias contra Henry e seus aliados, a fonte do governo de Washington destacou que o primeiro-ministro demissionário seria bem-vindo em solo americano caso se sentisse inseguro no Haiti.
Apoio dos Estados Unidos
Na Jamaica, Blinken anunciou mais US$ 100 milhões (R$ 498 milhões) para apoiar uma força internacional de estabilização no Haiti, uma soma que eleva para 300 milhões o montante prometido por Washington desde que a crise no país caribenho se intensificou, há alguns anos.
Blinken ofereceu mais US$ 33 milhões (R$ 164 milhões) em ajuda humanitária imediata.
No fim de 2023, o Conselho de Segurança da ONU concordou em enviar uma missão internacional liderada pelo Quênia para apoiar a polícia haitiana, o que ainda não aconteceu.
O presidente americano, Joe Biden, descartou a possibilidade de enviar tropas ao Haiti, país que os Estados Unidos ocuparam durante quase duas décadas no século passado e que foi cenário de algumas intervenções desde então.
Henry viajou ao Quênia para falar sobre a missão internacional quando a onda de violência explodiu no Haiti. Após a viagem, ele não conseguiu retornar a Porto Príncipe devido à insegurança no aeroporto e seguiu para Porto Rico depois que a vizinha República Dominicana negou autorização para a entrada de seu avião.
Em sua ausência, as autoridades tentaram conter a violência com medidas pouco efetivas até o momento: situação de emergência de um mês e toque de recolher noturno, prorrogado até quinta-feira (14).
"Hoje não devemos contar com as autoridades que fracassaram e que não vivem no Haiti", afirmou o sindicato policial SPNH-17 em comunicado publicado na segunda-feira. "Devemos nos mobilizar para defender nosso país e impedir que destruam o pouco que nos resta", acrescentou.