As eleições deste domingo (14) na Turquia representam a maior ameaça das últimas décadas ao atual líder turco Recep Tayyip Erdogan, que chegou ao poder em 2003. Com 93% das urnas apuradas, Erdogan tem 49,7% dos votos válidos, ante 44,6% do seu principal adversário, o economista Kemal Kilicdaroglu, o que indica segundo turno entre os dois candidatos.
O ambiente altamente polarizado deixa a margem entre os dois candidatos ser muito apertada — fazendo com que o segundo turno, que será realizado no próximo dia 28, seja um dos mais incertos da história recente turca.
Personagens opostos
Erdogan é um personagem controverso. No começo do século, herdou o segundo país mais populoso da Europa castigado por uma inflação crônica e taxas de juros estratosféricas. Ele tinha 49 anos e misturava um populismo nacionalista com um tempero religioso.
Em 20 anos, deu tempo de domar a inflação, vislumbrar um lapso de prosperidade e sonhar com a Europa. Mas foram tantos anos no poder que Erdogan foi perdendo capital político: recentemente, o custo de vida voltou a disparar, a insatisfação popular aumentou e a Turquia acordou do sonho europeu com o barulho de bombas no quintal: um conflito civil ao sul, na Síria, e uma guerra de verdade do outro lado do Mar Negro, na Ucrânia.
O sultanato de Erdogan viveu momentos de tensão. Em 2013, um movimento popular se espalhou pela Turquia - parte de uma onda global de insatisfação que varreu o mundo islâmico e chegou até o Brasil. O governo se manteve firme, resistindo aos protestos na Praça Taksim, em Istambul, reprimidos com violência pela polícia.
Atualmente, a ameaça vem de um burocrata com pouco carisma, mas que conseguiu montar um arco de alianças que pode destronar o presidente mais longevo da Turquia desde a queda do Império Otomano. Aos 74 anos, o economista Kilicdaroglu é um funcionário público aposentado que escalou as pesquisas com a promessa de romper com a era Erdogan.
De fala mansa e figura esguia, ganhou dos analistas o apelido de "Gandhi da Turquia". Com habilidade, Kilicdaroglu deu uma repaginada no moribundo Partido Republicano do Povo (CHP), transformado em uma moderna máquina de negociação social-democrata.
No próximo dia 28, os turcos decidirão se Kilicdaroglu foi ou não convincente. Superar a era de Erdogan não é fácil. A Turquia está dividida. Muitos duvidam que o sultão aceite a derrota. Outros temem que Erdogan não seja capaz de perceber que a hora de descer do bonde chegou.