Donald Trump pressionou seu vice-presidente a concordar com um complô ilegal para anular a eleição de 2020 e incitou uma multidão que colocou em risco a vida de seu vice quando ele recusou seguir o plano, disseram investigadores do Congresso e ex-assessores do governo nesta quinta-feira (16).
O comitê da Câmara que investigou o ataque do ano passado ao Capitólio dos EUA detalhou como o ex-presidente repreendeu Mike Pence por discordar do esquema, mesmo depois de saber que a violência havia eclodido enquanto o Congresso se reunia para certificar a vitória de Joe Biden.
Em sua terceira audiência pública sobre a insurreição de 6 de janeiro de 2021, o painel detalhou a campanha de pressão "implacável" de Trump sobre Pence como o pilar de uma conspiração criminosa para manter o presidente derrotado no poder.
"Donald Trump queria que Mike Pence fizesse algo que nenhum outro vice-presidente jamais havia feito: o ex-presidente queria que Pence rejeitasse os votos e declarasse Trump o vencedor ou enviasse os votos aos estados para serem contados novamente", afirmou o presidente do comitê, o democrata Bennie Thompson.
"Mike Pence disse que não, ele resistiu à pressão. Ele sabia que era ilegal. Ele sabia que era errado", completou.
O advogado de Trump, John Eastman, foi o arquiteto da "teoria sem sentido", afirmou a vice-presidente do comitê, a republicana Liz Cheney, acrescentando que o advogado promoveu o complô apesar de saber que era ilegal.
O comitê mostrou o depoimento do advogado de Pence, Greg Jacob, dizendo que Eastman havia admitido a Trump dois dias antes dos tumultos que seu plano violaria a lei federal.
- "Em perigo" -
Um desesperado Trump recorreu a Pence depois que dezenas de contestações legais contra o processo eleitoral foram rejeitadas nos tribunais de todo o país.
O presidente derrotado usou discursos e tuítes para pressionar Pence a abusar de sua posição como presidente do Senado e não reconhecer os resultados das eleições.
Membros da família Trump estavam no Salão Oval em 6 de janeiro quando Trump teve um telefonema "acalorado" com Pence, de acordo com um comunicado da filha do ex-presidente, Ivanka Trump, transmitido na audiência.
Nicholas Luna, ex-assessor de Trump, declarou ao seu lado: "Lembro-me de ouvir a palavra 'covarde'".
Trump fez referência a Pence várias vezes durante o comício "Parem o roubo" mais tarde naquele dia, no qual ele disse aos apoiadores que marchassem no Capitólio e "lutassem como o inferno".
O discurso original de Trump não mencionava Pence, mas o ex-presidente improvisou e repreendeu seu vice de uma forma que ajudou a alimentar insurgência e ameaças contra Pence, segundo o deputado democrata Pete Aguilar, membro do comitê.
Mas Pence resistiu à pressão, enviando uma carta ao Congresso dizendo que o vice-presidente não tinha "autoridade unilateral" para anular as recontagens eleitorais.
Aguilar explicou que um informante disse ao FBI que o grupo neofascista Proud Boys teria matado Pence se tivesse a chance.
Ele acrescentou que a multidão que invadiu o Capitólio estava a cerca de 12 metros de Pence. "Não duvide, a vida do vice-presidente estava em perigo", assegurou.
- "Bastante alarmante" -
O chefe de gabinete da Casa Branca, Mark Meadows, informou Trump sobre a violência no Capitólio, mas isso não impediu que o presidente tuitasse que Pence não teve "coragem" para derrubar a eleição, disseram assessores do presidente em declarações gravadas em vídeo.
Imediatamente após o tuíte, a multidão no Capitólio avançou, observou o comitê. Incitados por Trump, os manifestantes ameaçaram enforcar Pence por não cooperar enquanto invadiam o Capitólio, chegando ao ponto de erguer uma forca em frente ao prédio.
"O que o ex-presidente estava disposto a sacrificar - potencialmente o vice-presidente - para permanecer no poder é bastante alarmante", afirmou Aguilar.
O painel mostrou um videoclipe de um dos manifestantes dizendo que "arrastaria as pessoas para as ruas" se Pence "cedesse" à pressão para não anular a eleição.
O comitê também ouviu o juiz federal aposentado J. Michael Luttig, que testemunhou que os Estados Unidos teriam mergulhado em "uma revolução dentro de uma crise constitucional" se Pence tivesse cedido à pressão de Trump.
Luttig, um renomado jurista conservador, disse a Pence que seu papel na supervisão da ratificação da eleição era puramente cerimonial.
"Não havia absolutamente nenhuma base na Constituição ou nas leis dos Estados Unidos para a teoria defendida por Eastman. De jeito nenhum. Nenhuma", garantiu.
Trump reagiu à audiência exigindo receber "tempo igual" na mídia para expor sua falsa teoria de que a eleição foi roubada, mas opositores disseram que ele não aceitou o convite do comitê para testemunhar.
* AFP