O presidente do Chile, Sebastián Piñera, disse em pronunciamento nesta quarta-feira (4) não compactuar com as falas do presidente Jair Bolsonaro sobre o pai de Michelle Bachelet, alta comissária da ONU para direitos humanos e ex-presidente do Chile.
Piñera, um dos principais aliados regionais de Bolsonaro, afirmou que "toda pessoa tem o direito de ter seu juízo histórico sobre os governos dos anos de 1970 e 1980, mas que estas visões devem ser expressadas com respeito às pessoas".
— Não compartilho em absoluto à menção feita pelo presidente Bolsonaro por respeito a uma ex-presidente do Chile e, especialmente, em um tema tão doloroso como a morte de seu pai.
Piñera também reforçou que seu compromisso sempre foi com a democracia, a liberdade e os direitos humanos "em todo o tempo, lugar e circunstância".
O presidente Jair Bolsonaro atacou nesta quarta o pai de Michelle Bachelet, Alberto Bachelet, que foi torturado e morto pela ditadura militar de Augusto Pinochet.
A crítica veio após Bachelet dizer em uma entrevista que o Brasil sofre uma "redução do espaço democrático", especialmente com ataques contra defensores da natureza e dos direitos humanos.
"Michelle Bachelet, seguindo a linha do (presidente francês Emmanuel) Macron em se intrometer nos assuntos internos e na soberania brasileira, investe contra o Brasil na agenda de direitos humanos [de bandidos], atacando nossos valorosos policiais civis e militares", escreveu o presidente em uma rede social.
"Diz ainda que o Brasil perde espaço democrático, mas se esquece de que seu país só não é uma Cuba graças aos que tiveram a coragem de dar um basta à esquerda em 1973, entre esses comunistas o seu pai brigadeiro à epoca", prosseguiu Bolsonaro, que publicou também uma foto de Bachelet, quando presidente, ao lado das ex-mandatárias Dilma Rousseff (Brasil) e Cristina Kirchner (Argentina).
Alberto Bachelet, pai de Michelle, era general de brigada da Força Aérea e se opôs ao golpe militar dado por Augusto Pinochet em setembro de 1973. Ele foi preso e torturado pelo regime e morreu sob custódia, em fevereiro de 1974.
A ex-presidente chilena também foi presa e torturada por agentes de Pinochet em 1975.
Na manhã desta quarta-feira, ao sair do Palácio da Alvorada para cumprir uma agenda em Anápolis (GO), Bolsonaro voltou a criticar Bachelet e a atacar seu pai. O presidente disse que a alta comissária da ONU "defende direitos humanos de vagabundos".
— (Michelle Bachelet) está acusando que eu não estou punindo policiais, que estão matando muita gente no Brasil. Essa é acusação dela. Ela está defendendo direitos humanos de vagabundos — afirmou.
— Senhora Michelle Bachelet, se não fosse o pessoal do Pinochet derrotar a esquerda em 1973, entre eles o teu pai, hoje o Chile seria uma Cuba. Eu acho que não preciso falar mais nada para ela. Quando tem gente que não tem o que fazer, vai lá para a cadeira de Direitos Humanos da ONU — acrescentou o presidente.
Bachelet fez a declaração sobre a redução da democracia no Brasil em uma entrevista coletiva em Genebra.
— Nos últimos meses, observamos (no Brasil) uma redução do espaço cívico e democrático, caracterizado por ataques contra defensores dos direitos humanos, restrições impostas ao trabalho da sociedade civil — disse.
Ela também apontou um aumento do número de pessoas mortas por policiais no Brasil, que afeta mais a negros e a moradores de favelas.
A ex-presidente chilena ainda lamentou o "discurso público que legitima as execuções sumárias" e a persistência da impunidade, além de questionar a política do governo de facilitar o acesso a armas.
A comissária recordou que ao menos oito defensores dos direitos humanos foram mortos no Brasil entre janeiro e junho, e que a maioria dessas mortes tiveram relação com disputas de propriedade, relacionada à "exploração ilegal de recursos naturais, principalmente agrícolas, florestais e minerais".
Para ela, essa violência ocorre em todo o país e afeta especialmente as comunidades indígenas. "33% dos incêndios florestais ocorrem em áreas indígenas ou de proteção", apontou.
— Dissemos ao governo que ele deve proteger os defensores dos direitos humanos e do meio ambiente, mas também examinar as medidas que podem desencadear violências contra esses defensores — afirmou Bachelet.