SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) - Um ultimato atribuído ao governo Donald Trump recolocou a Turquia em rota de colisão com Washington devido à compra de um avançado sistema de defesa antiaérea russo.
Segundo a rede americana CNBC, os EUA deram duas semanas para os turcos cancelarem a aquisição de batalhões de artilharia S-400 de Moscou, um negócio que se arrasta desde 2016 e é estimado em US$ 2 bilhões (cerca de R$ 6 bilhões).
Caso contrário, segundo o relato, os americanos não irão mais fornecer cem caças de quinta geração F-35 para Ancara, que é membro da Otan (aliança militar liderada por Washington) e aplicarão sanções econômicas ao governo de Racip Tayyip Erdogan. Ninguém desmentiu a informação.
O porta-voz do Kremlin, Dmitri Peskov, disse nesta quarta (22) que o ultimato é "inaceitável" e que haverá "graves consequências" uma vez que o negócio foi confirmado pelo próprio Erdogan há poucas semanas. Uma equipe militar turca já está na Rússia sendo treinada para operar os lançadores de mísseis.
O negócio dos S-400 é um dos maiores nós políticos para o Ocidente em seu embate com a Rússia de Vladimir Putin, e acabou sobreposto à disputa entre Ancara e Washington. Em 2016, Erdogan suprimiu um golpe de Estado que diz ter sido organizado de solo americano por um clérigo muçulmano exilado, Fethullah Gülen.
Desde então, pede para que Trump extradite Gülen, sem sucesso. O azedume também se dá em âmbito europeu, com o afastamento da Turquia da União Europeia devido às resistências de maior integração do país muçulmano ao clube.
A consequência foi a aproximação crescente com a Rússia de Putin, com quem colabora ativamente na tentativa de encerrar de vez a guerra civil na vizinha Síria. Desde 2015 Moscou intervém no país árabe e teve uma escaramuça séria com os turcos, que derrubaram um avião seu, mas a parceria acabou florescendo com a perda de influência dos EUA no conflito.
O problema é que o solo turco é uma das principais bases para operações aéreas da Otan, de extrema importância no jogo geopolítico do Oriente Médio.
O secretário de Estado americano, Mike Pompeo, já havia feito a ameaça sobre os S-400 no começo do ano, mas agora que Erdogan sinalizou publicamente a consumação do negócio, aparentemente o caso chegará a um impasse.
Há implicações industriais, porque a Turquia foi um dos nove países parceiros do desenvolvimento do F-35 desde 2002, e produz partes da fuselagem e da turbina do caça. Modelo com características furtivas e alta complexidade de fusão de dados, da chamada quinta geração, o F-35 teria sua primeira oficina de motores na Europa baseada em solo turco.
Erdogan, ao confirmar a compra dos S-400, disse que "iria receber os F-35 mais cedo, ou mais tarde". O fornecimento foi colocado em suspenso pelo Pentágono neste ano. Cada avião pode sair por cerca de US$ 100 milhões (aproximadamente R$ 400 milhões), e Ancara pretende substituir sua frota de 260 caças F-16 e 20 antigos F-4.
O caso é político, embora técnicos da Otan apontem que seria quase impossível integrar um sistema avançado russo ao arcabouço de interoperabilidade das forças da aliança -um imperativo que fez países do Leste Europeu a abandonarem suas frotas de aviões soviéticos após aderirem ao Ocidente.
Segundo o relato da CNBC, os S-400 poderiam ser substituídos pelos sistemas americanos Patriot como alternativa em um acordo. Tecnicamente, não há comparação entre eles: o modelo de lançador de mísseis russos é de uma classe superior à do americano, com maior alcance de detecção (600 km contra 200 km) e destruição (250 km contra 150 km) de alvos, entre outras características.
Cada bateria de S-400 custa cerca US$ 500 milhões (cerca de R$ 2 bilhões) , incluindo lançadores, veículos de controle, radares e material de apoio.