A União Europeia (UE) se mostrou decidida, nesta quarta-feira (30), a não reabrir o acordo do Brexit alcançado, apesar da pressão da primeira-ministra britânica, Theresa May, por uma renegociação usando o "mandato" de seu Parlamento.
A premier conservadora deve falar durante a tarde com o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, embora a pressão pareça sem sentido, principalmente quando na UE são ouvidas vozes contrárias à reabertura de um processo que durou quase um ano e meio.
"O acordo de separação não será renegociado", disse ante a Eurocâmara o titular da Comissão Europeia, Jean-Claude Juncker, na linha do que foi dito por Irlanda, Alemanha e França. A UE considera o acordo como o "melhor e único possível".
Um porta-voz da premier minimizou as palavras de seus sócios europeus e defendeu a reabertura do acordo "para conseguir o apoio parlamentar", já que "a UE diz que quer que o Reino Unido saia com um acordo" e o atual foi rejeitado em Westminster.
O ponto do acordo de separação que provoca mais rejeição entre os deputados britânicos é o "backstop", um mecanismo de último recurso destinado a evitar uma fronteira entre a Irlanda e a britânica Irlanda do Norte, e preservar o acordo de paz de Sexta-Feira Santa de 1998, que acabou com três décadas de confrontos.
A Câmara dos Comuns o rejeitou em 15 de janeiro e, em outro teste de sua incapacidade para acordar uma solução alternativa, os deputados apoiaram na terça-feira a proposta da primeira-ministra de pedir à UE que revise este mecanismo.
- 'Solução realista' -
O negociador europeu Michel Barnier defendeu diante da Eurocâmara o "backstop" acordado, que teve o aval tanto do governo de May como de seus 27 sócios em novembro. "O 'backstop' não é um dogma, é uma solução realista", afirmou.
De manhã, o chanceler irlandês, Simon Coveney, havia criticado a mudança de posição de May, outrora firme defensora do "backstop". "É como dizer em uma negociação: 'Bom, ou me dá o que eu quero, ou eu pulo pela janela", assinalou à rádio pública RTE.
O acordo fechado entre Londres e Bruxelas, rejeitado pelo Parlamento britânico, previa que o "backstop" apenas seria aplicado se não alcançassem uma solução melhor para o problema norte-irlandês no âmbito da negociação sobre a futura relação entre ambos.
Barnier deixou, assim, entrever a sua disposição de renegociar a declaração política, que acompanha o acordo de separação e fixa as bases da futura relação, para resolver o entrave do "backstop" se a posição britânica evoluir "de um simples acordo de livre-comércio", como o plano atual.
Além de falar com Tusk, May também conversou com o líder da oposição, o trabalhista Jeremy Corbyn, e deve fazer o mesmo com o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar.
- Tática política? -
Diante do incessante rechaço dos líderes europeus de reabrir a negociação a menos de dois meses para a data prevista do Brexit - 29 de março -, analistas britânicos interpretam que o novo movimento da primeira-ministra, conhecida por sua perseverança, pode ser uma mera tática política.
"A primeira-ministra usa isso para finalmente mostrar a todos, especialmente aos seus mais obstinados críticos, que o 'backstop' não pode ser renegociado e, por isso, terão que enfrentar a verdade do Brexit: ou votam a favor do acordo, ou votam a favor de um segundo referendo, ou votam a favor de um Brexit sem acordo", disse à AFP Anand Menon, professor de Política Europeia no Kings College.
Morten Ravn, professor de Economia na University College London, concorda: May "provavelmente prevê que não poderá cumprir o que promete e faz isso com a esperança de que o Parlamento acabe apoiando o seu acordo no último minuto para evitar um Brexit sem acordo".
Este cenário, que segundo o Banco da Inglaterra dispararia o desemprego e a inflação, provocaria a queda da libra e do preço das habitações, além de uma redução do PIB em quase 10%, o mais temido por todos, especialmente pelos dirigentes empresariais.
Enquanto isso, o presidente da Comissão Europeia pediu que se preparem "para todos os cenários, incluindo o pior", ou seja, a primeira saída de um país na história da UE e sem ter alcançado um acordo.
* AFP