A comunidade LGBT na Índia comemora nesta quinta-feira (6) a descriminalização da homossexualidade por parte do Supremo Tribunal na segunda nação mais populosa do mundo, marco histórico para a igualdade de direitos.
Em todo este país do sul da Ásia de 1,25 bilhão de habitantes, grupos vestidos com as cores do arco-íris explodiram em lágrimas e abraços no momento da leitura do julgamento da mais alta instância judicial.
Em decisão unânime, os cinco juízes do Supremo Tribunal indiano consideraram que um antigo artigo da lei não podia proibir as relações sexuais consensuais entre adultos do mesmo sexo, porque viola seus direitos garantidos nos termos da Constituição.
Esta disposição "se tornou uma arma de assédio contra a comunidade LGBT", declarou o presidente da Suprema Corte, Dipak Misra. "Qualquer discriminação baseada na sexualidade equivale a uma violação dos direitos fundamentais", acrescentou.
De acordo com o Código Penal Indiano, que data da era colonial britânica e é fruto da moralidade vitoriana, a homossexualidade era punível com prisão perpétua. No entanto, processos legais movidos por relações sexuais entre pessoas do mesmo sexo eram extremamente raros.
Em um século e meio de existência, menos de 200 pessoas foram processadas sob o Artigo 377, observa o julgamento da corte.
"Estou sem palavras! Demorou muito para acontecer, mas posso finalmente dizer que sou livre e tenho direitos iguais aos outros", declarou entusiasmado Rama Vij, um estudante de Calcutá reunido com amigos para assistir à leitura do julgamento.
No centro de uma batalha judicial que começou há quase 20 anos, o Artigo 377 do Código Penal proíbe qualquer "relação carnal contra a ordem da natureza".
O governo nacionalista hindu de Narendra Modi, conservador em questões sociais, optou por não tomar uma posição sobre o assunto e permitir a descriminalização da homossexualidade para a apreciação da Justiça.
O Executivo indiano ainda não reagiu à decisão sobre a homossexualidade. O partido do Congresso, de oposição, elogiou uma "vitória sobre o preconceito".
Se existe uma cena homossexual discreta, mas vibrante, nas grandes cidades da Índia, como Nova Délhi, ou Bombaim, o sexo entre homens, ou entre mulheres, ainda é muito malvisto na sociedade indiana. Muitos indianos, especialmente nas regiões rurais, onde 70% da população reside, ainda consideram a homossexualidade como uma doença mental.
"A História deve um pedido de desculpas a essa comunidade (LGBT) e às suas famílias, pela demora em corrigir a ignomínia e o ostracismo que sofreram ao longo dos séculos", estimou nesta quinta-feira em seu julgamento um dos juízes do Supremo Tribunal.
- 'Primeiro passo' ? -
"A ONU na Índia espera sinceramente que a decisão do Tribunal seja o primeiro passo para garantir os direitos fundamentais dos homossexuais", declarou em um comunicado o escritório indiano nas Nações Unidas.
A descriminalização da homossexualidade foi pronunciada pela primeira vez na Índia em 2009 pela Alta Corte de Délhi, uma decisão elogiada em todo mundo. No entanto, em 2013, há um recuo: o Supremo Tribunal reverteu esta decisão por razões legalistas.
Dois juízes da instituição estimaram, na ocasião, que era da responsabilidade do Legislativo, e não da Justiça, mudar a lei sobre este assunto.
Este retrocesso causou comoção entre os defensores da descriminalização, que então iniciaram novos recursos legais.
A descriminalização ordenada nesta quinta-feira era amplamente esperada pelos observadores. Sua jurisprudência nos últimos anos tendeu a favorecê-la, em particular com o reconhecimento de um terceiro gênero para pessoas transexuais e a proteção do direito à vida privada.
"Este foi o primeiro passo na história de muitos outros países que primeiro descriminalizaram as relações homossexuais, depois autorizaram a união civil e o casamento", apontou em uma entrevista recente à AFP Keshav Suri, chefe do Lalit Hotel de Nova Délhi e um dos principais defensores do caso perante a Suprema Corte.
"É uma longa batalha para alcançar direitos iguais, mas tenho certeza de que chegaremos lá", disse ele.
"Eu não quero parecer pessimista, mas não acho que verei o casamento gay (na Índia) durante minha vida", disse o coreógrafo Mandeep Raikhy, cujos espetáculos tratam da homossexualidade.
Cerca de 70 estados em todo mundo ainda criminalizam atos homossexuais, segundo dados da Associação Internacional de Lésbicas, Gays, Bissexuais, Trans e Intersexos.
* AFP