O Congresso do Peru debatia nesta quinta-feira (21) a moção de destituição do presidente Pedro Pablo Kuczynski, depois que este apresentou sua defesa e pediu para ser mantido no cargo para não prejudicar o país.
"O dano não farão a mim, farão ao Peru", disse o presidente de centro direita ao encerrar sua defesa ante o plenário do Congresso, após a explanação de seu advogado, Alberto Borea.
"Está em suas mãos salvar a democracia ou afundá-la por muito tempo", afirmou Kuczynski, acrescentando: "sou um homem honesto, jamais recebi propina, uma moeda, ou um benefício. Nem a minha empresa, nem eu fomos contratados pelo Estado peruano. Jamais caí em conflito de interesses".
Após duas horas e 20 minutos de explanação do presidente e de seu advogado, os dois se retiraram do Congresso, dando início a um debate de mais de cinco horas entre os 109 legisladores presentes sobre o impeachment.
O primeiro a falar foi o esquerdista Wilbert Rozas, que afirmou que tanto o presidente como seu advogado "não esclareceram nada".
Depois interveio o fujimorista Miguel Torres, que pediu para votarem pela destituição de Kuczynski, para a qual são necessários 87 votos no Congresso unicameral.
Dominado pela oposição fujimorista, o Congresso quer destituir Kuczynski por "permanente incapacidade moral", dias depois de a Odebrecht revelar que pagou quase cinco milhões de dólares a empresas ligadas a ele.
"Venho demonstrar minha inocência porque, aparentemente, sou obrigado a isso. Não gozo da presunção de inocência, muitos aqui se posicionaram sem me ouvir", disse o presidente de 79 anos ao iniciar sua defesa no plenário.
"Não sou corrupto e não menti. Jamais favoreci uma empresa. Sempre agir de acordo com a lei e com a ética profissional", indicou o presidente, acrescentando que enquanto era ministro a empresa do qual é dono que prestou assessoria a Odebrecht era gerida por seu ex-sócio, o chileno Gerardo Sepúlveda.
Seu advogado expressou que "na prática estamos diante de um golpe de Estado", se o Congresso destituir o presidente.
A menos que haja um milagre, os analistas antecipam que Kuczynski se tornará o primeiro presidente a perder seu cargo por vínculos com a Odebrecht, empresa envolvida no pagamento de propina em vários países da América Latina para conseguir contratos milionários de obras públicas.
No entanto, de maneira reservada, o governo realizou nos últimos dias esforços para tentar convencer legisladores opositores a votarem contra a "vacância" presidencial.
"Parece que nas últimas horas conseguiram convencer alguns congressistas esquerdistas (...). Há três dias, diria que o destino do presidente estava definido. Agora não estou tão certo", declarou à AFP um funcionário de confiança do presidente que pediu para não ser identificado.
O presidente negava desde antes de assumir o mandato, em 28 de julho de 2016, que tivesse vínculos com a Odebrecht, até que foi desmentido pela própria empresa. Diante do Congresso, o presidente afirmou que enquanto era ministro não tinha comunicação com seu sócio para evitar conflitos de interesse.
Há oito dias este escândalo de corrupção cobrou outra proeminente vítima no vizinho Equador: o vice-presidente Jorge Glas foi condenado a seis anos de prisão por receber propina.
- 'Que todos os corruptos vão embora' -
A Organização de Estados Americanos (OEA) anunciou que enviará uma missão a Lima para observar o processo de destituição de Kuczynski.
Se Kuczynski for retirado de seu cargo, o primeiro vice-presidente, Martín Vizcarra, deve assumir o cargo pelo resto do período, que acaba em 28 de julho de 2021.
Engenheiro de 54 anos, Vizcarra trabalhava como embaixador no Canadá e voltou apressadamente ao Peru por conta da piora da crise política. Kuczynski disse que nenhum de seus vice-presidentes aceitaria assumir o cargo. Nesse caso, teria que assumir o presidente do Congresso, Luis Galarreta, que deveria convocar eleições antecipadas.
O partido fujimorista, Força Popular, tem pressionado Kuczynski desde o início de seu mandato. Mas o fantasma da Odebrecht também persegue Keiko Fujimori, filha do ex-presidente preso Alberto Fujimori, que é investigada por supostos pagamentos recebidos da empresa.
Em uma amostra de desconfiança com os políticos em geral, milhares de peruanos marcharam na quarta-feira para exigir "que todos os corruptos vão embora".
"Marchamos contra os corruptos da Odebrecht", disse Rosa Chávez, estudante da Universidade de San Marcos.
A Odebrecht admitiu ter pago 29 milhões de dólares em propina no Peru entre 2004 e 2015, período que abarcou os governos de Alejandro Toledo (2001-2006), no qual Kuczynski foi ministro, Alan García (2006-2011) e Ollanta Humala (2011-2016).
Humala permanece em prisão preventiva, acusado de receber três milhões de dólares para sua campanha eleitoral em 2011, enquanto contra Toledo pesa uma ordem de extradição dos Estados Unidos por supostamente receber 20 milhões de dólares em propinas para conceder a Odebrecht a construção de uma estrada.
* AFP