Confrontos violentos registrados neste sábado (12) entre militantes antirracistas e grupos de extrema-direita americanos reunidos em Charlottesville, na Virgínia, nos Estados Unidos, acabaram com pelo menos três mortos, 35 feridos e quatro presos.
Uma mulher de 32 anos morreu atropelada por um carro que acelerou contra os manifestantes antirracismo, segundo a polícia de Virgínia informou em coletiva de imprensa. Até agora, 35 pessoas se feriram nas manifestações, nenhuma delas em confronto com os policiais. Destas, 19 foram atingidas pelo carro. Segundo o Centro Médico da Universidade de Virgínia, cinco delas estão em condição crítica, quatro em estado grave, seis estão estáveis e quatro passam bem.
À tarde, um helicóptero que acompanhava as manifestações caiu perto da cidade e os dois policiais que estavam a bordo morreram: H. Jay Cullen, de 48 anos, e Berke M.M. Bates, que faria 41 anos neste domingo (13). Não houve feridos no local de queda. Pelo Twitter, a corporação lamentou as mortes.
A violência motivou o governador Terry McAuliffe, que é democrata, a decretar estado de emergência (o que permite mobilizar mais policiais) e a proibir a manifestação. No Twitter, o prefeito da cidade, Mike Signer, pediu que as pessoas deixassem o protesto e proibiu temporariamente qualquer tipo de manifestação. O presidente Donald Trump condenou a violência na cidade.
Até agora, quatro pessoas foram presas. Por volta das 23h deste sábado (12), a polícia anunciou que encontrou o suposto envolvido no atropelamento dos manifestantes. James Alex Fields Jr., de 20 anos e morador de Ohio, responderá por homicídio doloso, lesão corporal grave e omissão de socorro.
Em entrevista a uma afiliada da CNN, a mãe de Fields, Samantha Bloom, admitiu que o filho havia dito que viajaria para um protesto, mas que ela não sabia o motivo da manifestação. Ohio fica a cerca de 722 quilômetros de distância de Charlottesville.
Uma hora antes do anúncio da prisão de Fields Jr., a polícia de Virgínia divulgou que outras três pessoas foram presas. Troy Dunigan, de 21 anos, foi acusado de conduta desordeira, Jacob L. Smith, de 21, foi acusado de agressão e lesão corporal leve, e James M. O’Brien, de 44, foi acusado de porte ilegal de arma.
Supremacistas brancos encontraram contramanifestantes
Alguns manifestantes que defendem a supremacia da raça branca chegaram agitando bandeiras confederadas, consideradas um símbolo racista por boa parte dos americanos.
Em meio a nuvens de gás lacrimogêneo, os confrontos entre manifestantes da direita radical e contramanifestantes se multiplicavam antes do início da mobilização, com brigas, lançamento de projéteis e pauladas.
Neste clima de alta tensão, o temor de acontecimentos mais graves aumentava, porque os manifestantes portavam armas, o que é permitido por lei no Estado da Virgínia. Membros das milícias de extrema-direita assumiram uma postura paramilitar, carregando no ombro fuzis semiautomáticos, não muito distante das forças de segurança chamadas ao local.
Mais tarde, testemunhas relataram que um carro investiu contra a multidão, ferindo várias pessoas. Em um vídeo divulgado nas redes sociais, um automóvel escuro atinge violentamente a traseira de outro veículo e, em seguida, retrocede velozmente entre os manifestantes. Outras imagens mostram feridos no chão.
Diante dos incidentes, o batalhão de choque decidiu proibir a manifestação prevista e esvaziou o parque público onde ela aconteceria. Os efetivos realizaram um número não divulgado de prisões durante a operação.
Os grupos da direita radical – entre os quais a Ku Klux Klan e neonazistas – queriam se opor ao projeto de Charlottesville de retirar de um espaço municipal a estátua do general confederado Robert E. Lee, que lutou a favor da escravidão durante a Guerra Civil americana.
Políticos reagem
O presidente americano, Donald Trump, pronunciou-se no Twitter sobre o episódio, pedindo união.
– Todos devemos estar unidos e condenar tudo o que o ódio representa. Não há lugar para este tipo de violência nos Estados Unidos. Vamos nos unir como um só – pediu.
Ele também lamentou a morte da mulher atropelada:
– Sentimentos à família da jovem mulher morte hoje. E lembranças a todos os feridos em Charlottesville, Virgínia. Tão triste! – escreveu.
A primeira-dama, Melania Trump, condenou o sectarismo.
– Nada bom sai da violência – tuitou.
Mais tarde, em Nova Jersey, onde passa férias, Trump voltou a criticar a violência em Charlottesville.
– Condenamos, nos termos mais fortes possíveis, esta exibição flagrante de ódio, fanatismo e violência em muitos lados. O ódio e a divisão devem parar agora. Temos de nos unir como americanos, com amor por nossa nação – proclamou.
Em coletiva de imprensa, o governador do Estado de Virgínia, McAuliffe, repudiu os manifestantes supremacistas.
– Eu tenho uma mensagem aos supremacistas brancas e nazistas que foram aos protestos: vão embora. Vocês não são bem-vindos nesta comunidade. Tenham vergonha. Vocês dizem ser patriotas, mas vocês são qualquer coisa menos patriotas. Vocês não terão sucesso. Não há lugar para vocês aqui, nem nos Estados Unidos. Somos uma nação de imigrantes. Vão embora e não voltem nunca mais. E levem junto seu preconceito – afirmou.
McAuliffe havia pedido na sexta-feira (11) aos moradores da cidade que não participassem da manifestação, motivo pelo qual um destacamento da Guarda Nacional foi colocado em estado de alerta.
– As numerosas pessoas esperadas em Charlottesville querem expressar ideias consideradas por muitos, inclusive por mim, desprezíveis. Enquanto o fizerem de forma pacífica, estão no seu direito – assinalou o governador, que havia ordenado às forças de ordem "agir rapidamente e de forma decisiva" em caso de atos de violência.
Pelo Twitter, o ex-presidente Barack Obama afirmou que "ninguém nasce odiando outra pessoa por causa da cor da pele". Ele citou Nelson Mandela ao dizer que "pessoas precisam aprender a odiar, e se elas podem aprender a odiar, também podem ser ensinadas a amar".
"Vitrine do ódio"
– Este evento poderia ser uma vitrine histórica do ódio, reunindo, em um só local, um número de extremistas inédito em uma década – advertiu Oren Segal, diretor do Centro sobre Extremismo da Liga Antidifamação, associação que luta contra o antissemitismo.
A direita nacionalista esperava atrair vários seguidores graças à presença de membros do movimento Alt-Right, que apoiou Trump durante sua campanha.
Os participantes, de várias partes do país, tiveram dificuldade para encontrar hospedagem. A plataforma de aluguel da apartamentos Airbnb cancelou um número desconhecido de contas ligadas à extrema-direita, destacando seus princípios de hospedagem independentes de origens étnicas.
Jason Kessler, organizador da manifestação, estimou, no Twitter, que a medida equivalia a um "ataque à liberdade de expressão e aos direitos civis".
Já Paul Ryan, líder republicano no Congresso, denunciou a reunião da extrema-direita como "um espetáculo repugnante, baseado em uma intolerância vil".