A União Europeia pediu nesta sexta-feira ao Reino Unido progressos suficientes nas negociações do Brexit antes de abordar seu relacionamento futuro, rejeitando o desejo de Londres de avançar rápido e discutir paralelamente um acordo comercial.
Estas primeiras dificuldades, inclusive antes do início das negociações, evidenciam a complexidade do divórcio após 40 anos de uma relação tumultuada entre Bruxelas e Londres.
"A UE descarta negociações paralelas sobre comércio com o Reino Unido e pede a Londres que honre todos os seus compromissos financeiros no acordo sobre o Brexit", disse nesta sexta-feira o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk.
Os 27 querem estabelecer "disposições transitórias" durante estas discussões preliminares para limitar a incerteza pós-Brexit, de acordo com um rascunho com as linhas gerais da negociação obtido pela AFP.
Este projeto fixa as diretrizes da negociação, as prioridades políticas da UE, assim como sua visão do ritmo de negociação, que se tornou um dos primeiros temas de tensão, dois dias após a ativação do processo de separação do Reino Unido.
A primeira-ministra britânica, Theresa May, quer avançar rápido e negociar paralelamente um acordo que estabeleça a forma de sair da UE e outro que defina sua futura relação, especialmente em nível comercial.
Mas a UE defende uma estratégia "escalonada", insistindo na necessidade de se concentrar exclusivamente primeiro na negociação do acordo de divórcio, segundo o projeto, que Tusk apresentará em Malta aos dirigentes dos 27 países leais à UE e que eles devem adotar em uma cúpula marcada para 29 de abril em Bruxelas.
"Apenas quando tivermos conquistado progressos suficientes na retirada poderemos discutir o âmbito de nossa futura relação", também comercial, disse Tusk.
A União Europeia também se preparará para um possível fracasso das negociações, segundo o documento.
"Nas negociações, a UE atuará unida. Será construtiva durante todo o processo e se esforçará para chegar a um acordo", afirma o texto. "Mas também se preparará para lidar com a situação se as negociações falharem", acrescenta.
- 'Não é uma ameaça' -
Nas primeiras horas após a notificação oficial do Brexit, outro ponto de discórdia surgiu, relacionado à futura cooperação de Londres em matéria de segurança.
O governo britânico teve que baixar o tom depois que May pareceu apresentar esta cooperação como moeda de troca.
Nesta sexta-feira, o ministro britânico das Relações Exteriores, Boris Johnson, afirmou que seu país tem um compromisso "incondicional" com a segurança da Europa e não usará esta questão como "moeda de troca".
Paralelamente, Tusk disse estar certo de que "ninguém está interessado em usar a cooperação em matéria de segurança" neste sentido.
As três principais prioridades da UE para as futuras negociações já são conhecidas.
Bruxelas busca esclarecer o futuro dos mais de três milhões de cidadãos europeus no Reino Unido e dos mais de um milhão de britânicos que residem em outros Estados membros.
Também quer eliminar as incertezas em torno da fronteira entre a República da Irlanda e Irlanda do Norte, uma província britânica.
"Temos de garantir a qualquer custo que os cidadãos não sejam usados como moeda de troca", declarou nesta sexta-feira o primeiro-ministro de Malta, Joseph Muscat.
- 'Pagamento das contas' -
Os 27 também exigem o "pagamento das contas" dos compromissos orçamentários do Reino Unido. A Comissão avaliou a conta entre 55 bilhões e 60 bilhões de euros, de acordo com um responsável de alto escalão europeu.
Mas Londres "não reconhece os valores, às vezes muito elevados", disse na quinta-feira o ministro britânico das Finanças, Philip Hammond.
Não haverá "redução britânica", advertiu a partir de Berlim o chefe da diplomacia alemã, Sigmar Gabriel, referindo-se à contribuição reduzida ao orçamento europeu obtida por Margaret Thatcher em 1984.
Berlim, assim como Paris, advertiu que a futura relação da UE com Londres não pode ser abordada até que as condições de sua saída estejam bem avançadas.
A notificação oficial do processo de separação foi feita na quarta-feira, mas as suas consequências já começaram a ser vistas.
No setor financeiro, o histórico mercado de seguros britânico Lloyd's of London anunciou que abrirá uma filial em Bruxelas para operar no mercado europeu.
Luxemburgo, por sua vez, não esperou nem 24 horas para lançar sua candidatura oficial para sediar a Autoridade Bancária Europeia (EBA), que deve deixar a sua sede em Londres depois do Brexit.
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