As medidas já anunciadas durante os primeiros 12 dias de Donald Trump à frente da Casa Branca sinalizam uma ruptura dos atuais cenários político e econômico mundiais. Segundo a avaliação do ex-embaixador do Brasil nos Estados Unidos, Rubens Barbosa, a ordem iniciada após a Segunda Guerra, com a criação de organismos internacionais e novos conflitos como a Guerra do Iraque, "está ruindo". O diplomata acredita que, cada vez mais, os americanos adotarão postura de maior isolamento.
– Trump vai acelerar as grandes transformações que estão existindo, hoje, no sistema internacional. A posição dos Estados Unidos não vai ser mais como é hoje: vai ser um país importante, talvez o mais importante do mundo, mas sem poder impor as decisões – afirmou Barbosa em entrevista ao programa Gaúcha Atualidade.
Leia mais
Nomeação de Tillerson como secretário de Estado ainda espera aprovação
Empresas globais tentam criar muro contra decreto anti-imigração de Trump
Primeira-ministra ignora pressão e mantém visita de Trump ao Reino Unido
Um indicativo da relativa abstenção dos Estados Unidos, conforme o diplomata, é a negociação liderada por Rússia, Turquia e Irã para o cessar-fogo na Síria – as reuniões ocorreram no Cazaquistão, há uma semana, sem a participação dos norte-americanos e da União Europeia. De acordo com Rubens Barbosa, as consequências deste processo poderão ser o fortalecimento mundial da China e a ascensão de grupos terroristas.
– Os Estados Unidos não têm mais aquela atração que faça com que qualquer coisa que a política interna americana determina seja absorvida no mundo.
Mesmo sem estar "no radar de Trump", o Brasil poderá ser afetado indiretamente pelas decisões do republicano em relação ao comércio e à política de imigração. Segundo Barbosa, a revisão do Tratado Norte-Americano de Livre Comércio (Nafta) e a saída dos Estados Unidos da Parceria Transpacífico (TPP) indicam maior protecionismo. Ao mesmo tempo, brasileiros que moram em território norte-americano em situação irregular poderão enfrentar dificuldades.
– O Brasil não tem um número muito grande de imigrantes lá (nos Estados Unidos) comparado ao México e países da América Central, mas tem um número razoável, (cerca de) um milhão, 1,5 milhão de migrantes. Uma parte disso não é documentada, está em situação ilegal e pode ver a ser afetada – prevê.
Apesar do decreto que impõe restrições sobre migrantes de sete países, a concessão do visto para brasileiros pode sofrer algumas alterações, conforme o diplomata.
– Nesse sentido, afeta porque tem pessoas aqui no Brasil que gostariam de ir para os Estados Unidos que, caindo nessas categorias que eles criaram lá, vão ter o visto dificultado. Mas, para o brasileiro, em geral, acho que vai continuar como está: o visto é considerado depois de muitas entrevistas como é feito hoje.
Junto à política de isolamento, as restrições para entrar nos Estados Unidos são relacionadas à preocupação com o terrorismo. Barbosa avalia que o atual contexto é acompanhado pela convicção de Trump de que os Estados Unidos estão "ameaçados". Mesmo assim, o diplomata avalia que o comanda da segurança do país vem sendo "muito bem sucedido", já que sofreu apenas "alguns episódios isolados" de atentados terroristas após a queda das Torres Gêmeas, em 2001.
– A ideia da defesa do território americano está embutida nessa (intenção) de restringir o trânsito de pessoas de alguns países.