Em um mundo sob tensão, os Estados Unidos, a principal potência planetária, consolida quadro eleitoral que remete à ideia de confrontação. De um lado, aquela que se credencia a ser a primeira mulher a presidir o país: a democrata Hillary Clinton, com discurso que reporta ao bem-estar social. De outro, o candidato com discurso xenófobo e por vezes misógino: o republicano Donald Trump. As eleições ocorrerão em 8 de novembro, uma terça-feira, e a posse, para o lugar de Barack Obama, em 20 de janeiro do ano que vem.
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Fatores locais e internacionais se cruzam para complicar a disputa. De fora, vêm atentados terroristas como o recente de Nice, na França, que ameaçam se espalhar pelo mundo. De dentro, a tensão social, com fortes ingredientes raciais. Em 10 dias, houve dois ataques contra a polícia, acusada de perseguir negros. Primeiro, em Dallas, no Texas. Depois, no último domingo, na Louisiana. No total, oito agentes foram mortos.
Trump fala em falta de pulso, Hillary, em incitação à violência
Os apoiadores de Trump reforçam seu discurso de que falta, ao atual governo democrata pulso, mais firme. Os defensores de Hillary argumentam que é o contrário: a mensagem confrontativa do adversário se refletiria nas ruas.
Professora de Relações Internacionais em programas de pós-graduação da UFRGS, Analúcia Danilevicz vê "limite nos projetos de desenvolvimento", tanto nos EUA quanto nos países ricos da Europa. Por isso, "cresce a tensão e a hostilidade aos estrangeiros ou diferentes". Em especial nos EUA, há, segundo Analúcia, "uma questão racial mal resolvida".
E aí entram as eleições. A professora acredita que esse impasse americano, de não ter projeto social definido, provocou o surgimento de candidaturas como a de Trump, e o discurso do republicano durante a campanha teria "avalizado" condutas que levaram à atual situação.
– Enquanto os EUA não estabelecerem um caminho, a tensão só vai piorar – diz Analúcia, doutora em História.
Trump aproveitou os incidentes internos para acusar Obama de "falta de liderança". A convenção do Partido Republicano começou na segunda-feira, em Cleveland, Ohio. Nesta terça-feira, Trump foi confirmado como candidato do partido.
O encontro vai até amanhã. Na semana que vem, também de segunda a quinta-feira, será a vez dos democratas se reunirem na Filadélfia, Pensilvânia.
Eventos milionários para referendar candidaturas
Cada convenção custa cerca de US$ 140 milhões. Serve para convencer eleitores de que o vencedor da prévia é a pessoa certa para comandar o país e para unificar o partido em torno desse nome. Acaba sendo um show com alta produção, comparável a um grande comício. O efeito do evento, porém, é meramente homologatório.
Enquanto o clima é festivo nas programações partidárias, os dois candidatos se preocupam. Hillary, diante de pesquisa da CBS/NYT na semana passada que mostrava empate em 40%, fez apelo aos latinos, um de seus eleitorados mais leais, com as mulheres e os negros. Pediu que não deixem de votar.
– Vejo, escuto e estou com vocês. Juntos, devemos enviar sonora mensagem a Donald Trump em novembro, e ganhar decisivo mandato contra a demagogia e o medo – disse Hillary em Washington, na League of United Latin American Citizens, a organização mais antiga dos direitos civis de hispânicos nos EUA.
A última polêmica envolvendo Trump foi o discurso de sua mulher, a modelo eslovena Melania, durante o primeiro dia de convenção, pelo qual foi acusada de plagiar pronunciamento de Michelle Obama, na campanha de 2008.
Diferenças nas propostas para praticamente tudo
As diferenças entre os candidatos se dão em diversos aspectos. Na política externa, Trump costuma deixar claro que os EUA estarão em primeiro lugar. Quer os adversários temendo seu país. Pretende modernizar o arsenal nuclear e promete coibir o islamismo radical. Hillary, ex-secretária de Estado no governo Obama, também fala em restaurar a liderança e o poderio militar dos EUA, mas enfatiza que quer fortalecer alianças.
Na questão migratória, Trump mantém intenções de erguer um muro na fronteira com o México, obrigando os mexicanos a pagarem pela obra, e expulsar 11 milhões de imigrantes ilegais. Lista restrições à concessão de vistos e ao ingresso de estrangeiros, especialmente muçulmanos – chegou a dizer que os vetará. Hillary fala em reforma migratória "abrangente", com regularização de ilegais e ações de integração e naturalização.
Na economia, Trump fala em aumentar o nível de empregos e cogita elevar impostos de quem não reserva vagas a americanos. Hillary tem plano de elevar ganhos das famílias com benefícios fiscais para endividados, incentivar distribuição de lucros e investir em infraestrutura, energia limpa e pesquisas médicas.
Na saúde, Trump assumiu como prioridade revogar o Obamacare, lei pela qual todo americano deve ter plano de saúde. Hillary defende o modelo e pretende estender programas públicos para a população mais pobre. Na educação, também aparece a tendência radicalmente liberal de Trump contrastando com planos de Hillary, de assistência às famílias carentes.
Também na questão dos armamentos, eles destoam. Trump repudia restrições ao porte. Hillary, defende. No duelo final das urnas, em novembro, só um restará de pé.