Os combatentes islâmicos espreitavam por miras de rifles e metralhadoras os restos de um comboio militar sírio avariado na estrada, a centenas de metros de distância. Eles estavam atacando os soldados do presidente Bashar Assad, tentando impedir sua fuga.
- Aqui estão os heróis e mujahedin do Escudo de Maomé, louvado seja - disse baixinho um combatente enquanto outros abriam fogo.
O exército sírio respondeu aos tiros dos rebeldes. Tanques atiraram na vila de uma direção, a artilharia de outra. O chão tremeu. Fumaça e poeira se ergueram no céu. Indefesos contra os disparos de artilharia, os rebeldes continuaram atirando, e não recuaram.
Com a chegada da primavera na Síria, a guerra civil completa seu segundo ano num mosaico de batalhas severas e amplamente dispersas, como esta, onde a estrada de Damasco a Aleppo atravessa uma planície agrícola no sul da província de Idlib.
Desde o fim da última primavera, combatentes anti-governo tiraram grande parte do norte da Síria do controle de Assad, atacando postos militares e diversas bases, e fazendo o exército recuar.
Mas a maré rebelde, liderada no norte da Síria por grupos islâmicos, se move lentamente, assolada pela escassez de armas e por um persistente arquipélago de posições do governo onde o exército e milícias leais se instalaram com armas poderosas, equipados para uma longa luta.
Cada uma dessas posições militares, e as estradas entre elas, tornaram-se pequenos fronts, um conjunto quase incontável de violentos campos de batalha onde os rebeldes tentam silenciar postos do governo - montados especialmente ao redor das principais cidades da Síria.
Trata-se de uma guerra amargamente pessoal, onde combatentes islâmicos e seculares dividem um objetivo imediato: proteger suas próprias famílias, uma ambição que eles acusam o Ocidente de não apoiar adequadamente.
De suas posições restantes, o exército de Assad mantém um alcance letal sobre terras onde já não podem caminhar, disparando foguetes, morteiros e artilharia sobre bairros residenciais. A enfraquecida força aérea síria se junta frequentemente ao combate, lançando bombas. Mísseis balísticos ocasionalmente caem de muito longe.
Esses ataques, conduzidos pelo governo alauita contra uma população predominantemente sunita muçulmana, e sustentados durante vários meses, estão matando civis, afetando a economia e afastando o povo de suas casas. E também alimentam o ódio sectário.
Os rebeldes tiveram grandes sucessos. Em janeiro eles capturaram a base aérea de Taftanaz e a maior prisão de Idlib. Há meses, porém, suas conquistas têm sido basicamente incrementais.
A batalha de Heesh - por uma das poucas estradas na região de Idlib que as forças de Assad ainda se arriscam a usar - é, segundo um combatente, uma disputa por uma "estrada da morte" onde um lado possui um arsenal convencional completo e o outro está armado com fé e armas. Isso capta parte da guerra num microcosmo.
De uma colina ao lado de campos agrícolas, Heesh tem vista para a rodovia de quatro pistas entre Hama e Aleppo, duas cidades onde o exército está fortemente instalado.
Diversos postos militares sírios estão montados ao longo do asfalto, numa tentativa de manter abertas as linhas de suprimento - um imperativo militar para Assad, em parte porque a frota de helicópteros de seu governo foi reduzida, dificultando o abastecimento aéreo.
A luta já devastou parte da aldeia no último outono, quando o governo a atingiu com vários ataques aéreos. Mas no fim de janeiro, centenas de rebeldes de uma brigada islâmica conhecida como Soqour al-Sham, ou os Falcões da Síria, se reuniram em Heesh e formaram uma posição de bloqueio no lado oeste da estrada.
Outro grupo armado, os Netos do Profeta, assumiram posições no lado oposto, criando um arriscado corredor para o exército.
A batalha vem explodindo de forma intermitente desde então.
Avançando à noite e se reunindo de dia, os rebeldes agora espreitam de pequenos bunkers, construções e trincheiras que se estendem da cidade até a beira da estrada. O exército, nada disposto a abrir mão de uma parte vital da rodovia, usa artilharia e ataques aéreos para tentar fazê-los recuar; a cidade foi recentemente atacada com bombas de fragmentação.
Explosão a explosão, o que resta de Heesh está sendo transformado em ruínas. A população se afastou.
Os combatentes permanecem, esperando que, ao cortar o abastecimento dos postos militares ao norte de Heesh, os soldados fiquem sem munição e acabem abandonando seus postos.
Cada posto militar silenciado, eles sabem, é um local a menos de onde podem atacar cidades de Idlib.
Membros do Escudo de Maomé, uma unidade de combate em Soqour al-Sham, deixaram claro que pretendiam expulsar o exército desta estrada, ou morrer tentando.
- Não estou falando apenas de mim, mas de todos os meus colegas aqui. Nós acreditamos nas mesmas coisas - disse Mohammad Rahmoun, um combatente.