Lagos, Nigéria - No ritmo em que a Nigéria vem crescendo, dentro de um quarto de século, 300 milhões de pessoas - uma população tão grande quanto a atual dos Estados Unidos - viverão num país do tamanho do Arizona e do Novo México. Nesse centro comercial que quase dobrou sua população nos últimos 15 anos, atingindo 21 milhões de habitantes, o padrão de vida de muitos está em declínio.
Moradores de longa data, como Peju Taofika e suas três netas, habitam um quarto num típico prédio de apartamentos conhecido como "frente a frente" - porque famílias inteiras se espremem em quartos de 2 por 3 metros ao longo de um estreito corredor. Até 50 pessoas compartilham uma cozinha, banheiro e pia - embora muitos encanamentos do bairro já nem tragam água.
Na Escola Primária Alapere, na maioria das salas há mais de 100 alunos, dois por carteira.
Com jovens formados jorrando do ensino médio e das universidades, a taxa de desemprego da Nigéria é de quase 50 por cento entre as pessoas de 15 a 24 anos nas áreas urbanas, gerando criminalidade e descontentamento.
A crescente classe média-alta também sente o aperto, já que a ida para o trabalho, mesmo dos subúrbios mais próximos, pode levar de 2 a 3 horas.
Em outubro passado, a Organização das Nações Unidas anunciou que a população mundial havia ultrapassado 7 bilhões e que cresceria rapidamente durante décadas, esgotando os recursos naturais caso os países não consigam gerenciar melhor o crescimento.
Mas quase todo o crescimento está na África subsaariana, onde o aumento da população supera de longe a expansão econômica. Dos cerca de 20 países onde as mulheres geram uma média de cinco filhos, quase todos ficam na região.
No restante do mundo em desenvolvimento, na Ásia e América Latina, as taxas de fertilidade caíram acentuadamente nas gerações recentes e hoje lembram a dos EUA - pouco mais de dois filhos por mulher. Em cada país, essa transformação foi impulsionada por uma mistura de oportunidades educacionais e de trabalho para mulheres, acesso a meios de contracepção, urbanização e uma evolução da classe média. No entanto, ainda não está claro se forças similares poderão desarmar a bomba populacional na África subsaariana.
- O ritmo do crescimento na África é diferente de qualquer outra coisa na história, além de um problema crítico - disse Joel E. Cohen, professor de estudos populacionais da Universidade Rockefeller, em Nova York. - A solução no contexto desses países pode não ser o que funcionou na América Latina, em Kerala ou em Bangladesh.
Ao longo da África subsaariana, governos alarmados começaram a agir, muitas vezes revertendo antigas políticas que estimulavam ou aceitavam famílias grandes. A Nigéria tornou os contraceptivos gratuitos no ano passado, e autoridades estão promovendo famílias menores como a chave da salvação econômica, usando como inspiração os ganhos financeiros em países como a Tailândia.
A Nigéria, já a sexta nação mais populosa do mundo, com 167 milhões de pessoas, é um caso de teste crucial, já que seu sucesso ou fracasso em reduzir as taxas de natalidade terá uma enorme influência sobre a população global. Se esta grande nação, rica em petróleo, não conseguir controlar seu crescimento, que esperança haverá para países muito menores e mais pobres?
- A população é essencial - afirmou Peter Ogunjuyigbe, demógrafo da Universidade Obafemi Awolowo, na pequena cidade central de Ile-Ife. - Se você não cuida da população, as escolas não dão conta, os hospitais não dão conta, não há moradia suficiente - não há nada que se possa fazer para ter um desenvolvimento econômico.
O governo nigeriano está construindo infraestrutura rapidamente mas não consegue acompanhar o crescimento, e alguns especialistas temem que a Nigéria, junto a outros países africanos, não tenha força suficiente para conter o aumento populacional. Por duas décadas, o governo nigeriano recomendou que as famílias se limitassem a quatro filhos, com poucos resultados.
Mesmo reconhecendo que mais países estavam tentando controlar a população, Parfait M. Eloundou-Enyegue, professor de sociologia de desenvolvimento da Universidade Cornell, afirmou que "muitos países só se mexem quando enfrentam revoltas por comida, quando ficam sabendo que possuem a maior taxa de fertilidade do planeta ou quando começam a se preocupar com agitações políticas".
Na Nigéria, segundo especialistas, as crescentes fileiras de jovens desempregados e desiludidos alimentaram o crescimento do grupo islâmico radical Boko Haram, que explodiu ou incendiou mais de dez igrejas e escolas neste ano.
Internacionalmente, a explosão populacional africana significa um aumento na imigração ilegal - já em alta, segundo a agência da fronteira europeia Frontex. Hoje há mais de 400 mil africanos sem documentos nos Estados Unidos.
A Nigéria, como muitos países da África subsaariana, experimentou um leve declínio na taxa de fertilidade média - de 6,8 em 1975 para 5,5 no ano passado. Mas esse nível de fertilidade, combinado a uma população extremamente jovem, ainda deixa esses países com uma curva de crescimento acentuada e catastrófica. Metade das mulheres nigerianas tem menos de 19 anos, tendo acabado de entrar no pico da idade fértil.
Mulheres abandonadas
As estatísticas são impressionantes. A África subsaariana, que hoje responde por 12 por cento da população mundial, representará mais de um terço até 2100, segundo diversas projeções.
Como a África foi, durante séculos, baseada na agricultura e esparsamente povoada, fazia sentido que seus líderes promovessem altas taxas de fertilidade. O planejamento familiar foi introduzido na década de 1970, por grupos como o USAID. Mais tarde, o dinheiro e a atenção foram desviados do planejamento familiar à crise da AIDS na África.
- As mulheres da África subsaariana foram abandonadas - disse Jean-Pierre Guengant, diretor de pesquisa do Instituto de Pesquisa pelo Desenvolvimento, em Paris. A drástica redução da taxa de natalidade vista em países pobres na Ásia, América Latina e Norte da África ainda não ocorreu ali. Essa transição costuma trazer grandes benefícios econômicos, explicou Eduard Bos, especialista em populações do Banco Mundial.
Com o último grande grupo populacional atingindo a idade ativa, o número de adultos na força de trabalho fica, durante um tempo, elevado em relação a grupos mais dependentes - os jovens e os idosos. Bem administrado, isso cria capital que pode ser usado para aprimorar a saúde e a educação, além de desenvolver novas indústrias.
E isso aconteceu em outros lugares. O produto interno bruto per capita na América Latina, Ásia e Norte da África aumentou de três a seis vezes quando a população foi colocada sob controle, garantiu Guengant. Durante o mesmo período, o PIB cresceu apenas marginalmente em muitos países africanos - apesar de um forte crescimento econômico geral.
Na Nigéria, legisladores estão estudando como promover a transição e seus consequentes benefícios financeiros. Nas cidades em ruínas da região de Oriade, perto de Ile-Ife, onde as ruas ficam repletas de barracas vendendo cartões de celulares pré-pagos e comidas como inhame batido, a equipe de Ogunjuyigbe vai de porta em porta estudando opiniões quanto ao tamanho da família e como elas afetam a saúde e a riqueza. Muitos adultos jovens, especialmente as mulheres instruídas, agora querem de dois a quatro filhos.
Mas as preferências masculinas, particularmente as dos mais velhos, não mudam com essa rapidez - algo claro numa cultura patriarcal onde a poligamia é amplamente aceita.
Em sua casa de concreto na cidade de Ipetumodu, Abel Olanyi, operário de 35 anos, disse que tem quatro filhos e quer mais dois.
- O número que você tem depende de sua força e capacidade - afirmou ele, sua esposa sentada silenciosamente ao seu lado.
Em culturas africanas, famílias grandes sugerem prosperidade e importância; algumas culturas só permitem a participação das mulheres em reuniões da aldeia depois que elas têm 11 filhos. E um histórico de alta mortalidade infantil, hoje suavizada devido a práticas como a vacinação, faz as famílias relutarem em ter menos crianças.
Fatores culturais
Em países asiáticos, o uso de contraceptivos femininos disparou, em algumas décadas, de menos de 20 por cento a algo entre 60 e 80 por cento. Na América Latina, a exigência de que as meninas terminassem o ensino médio apresentou correlação com uma acentuada queda na taxa de natalidade.
Mas o uso de contraceptivos só vem aumentando uma fração de ponto percentual anualmente - em muitas nações subsaarianas, ele fica abaixo dos 20 por cento - e em pesquisas, muitas vezes até mesmo mulheres bem instruídas da região continuam querendo de quatro a seis filhos.
- Nesse ritmo, levaremos mais de 100 anos para chegar um controle da fertilidade - lamentou Guengant.
Há também as diferenças regionais. A média de filhos por mulher na região sul da Nigéria, a mais rica, diminuiu levemente nos últimos cinco anos, mas aumentou para 7,3 no norte predominantemente muçulmano, onde as mulheres geralmente só podem visitar clínicas de planejamento familiar quando acompanhadas por um homem.
A ONU estima que a população global se estabilizará em 10 bilhões em 2100, indicando que a queda das taxas de natalidade acabará gerando uma média global de 2,1 filhos por mulher. Com uma taxa de 2,6, calculou Guengant, o número saltaria para 16 bilhões.
Há sinais de que as mudanças na economia e no estilo de vida dos africanos de classe média podem ajudar a mudar a maré, acrescentou Ogunjuyigbe. À medida que a Nigéria se urbaniza, a ajuda das crianças não é necessária nos campos; as famílias ampliadas se fragmentam.
- Os filhos eram vistos como um tipo de seguro para o futuro; hoje eles são uma responsabilidade para a vida toda - completou.
Na sala de espera de uma clínica de saúde feminina, Ayoola Adeeyo, de 42 anos, explicou que queria seus quatro filhos, com idades entre 6 e 17 anos, na universidade. E não queria mais crianças.
- Antes as pessoas queriam seis, sete ou até doze filhos, mas hoje ninguém pode fazer isso. É a economia - disse Adeeyo, elegante num vestido verde leve e lenço de cabeça combinando. - Criar um filho não é barato.