Ao norte de Esmeralda, que teve seu acesso pavimentado em 2016, está Pinhal da Serra. Lá, ao menos por vias gaúchas, o asfalto ainda não chegou. As duas cidades estão separadas por 25 quilômetros de uma rodovia de terra delimitada por vastas lavouras que dançam ao sabor do vento produzido pelos veículos. O município de 1.941 habitantes está no limite do Rio Grande do Sul, separado de Santa Catarina pelo Rio Pelotas e pela Usina Hidrelétrica de Barra Grande. Da sua zona urbana até a primeira cidade catarinense são mais 14 quilômetros. Asfaltados.
— É até vergonhoso estarmos conectados por asfalto para o resto do Brasil, menos para o nosso Estado — observa o prefeito Anderson de Jesus Costa.
Entre as duas cidades gaúchas está fixada a maior empregadora da cidade, excluindo a prefeitura. Da Granja Pinhal saem anualmente 12 milhões de ovos já separados, classificados e higienizados por 23 funcionários. A delicada tarefa de transportar a produção por 156 quilômetros até Ibiaçá sem trincar nenhum deles recai sobre os ombros do caminhoneiro Rodrigo Lazzarotto, 38 anos. A missão exige serenidade e perícia, sobretudo nos quilômetros iniciais, para desviar de qualquer ondulação que possa comprometer a carga.
— Ando a 10, 15, 20 km/h na estrada de chão. Se vou em dia de chuva, até menos. Tem que ter cuidado com buraco, valeta. Não pode balançar, porque vai quebrar. No asfalto posso andar a 80 km/h tranquilamente — explica.

O tempo que leva para vencer 20 quilômetros de chão, ziguezagueando na via, é o mesmo para fazer os demais 136 quilômetros de asfalto: uma hora e meia. A empresa se instalou em Pinhal da Serra no ano de 2012, prospectando o asfalto que avançava pela RS-456, mas que não passou de Esmeralda.
— O caminhão não anda, ele se arrasta. Com esse tempo que se perde aqui, poderia buscar a produção de outra granja, ganhar tempo. Muitas empresas não vêm investir aqui por causa desse acesso — observa Ronei Casagrande, sócio da granja.
É fundamental que a malha rodoviária seja de alta qualidade. Naturalmente, as indústrias buscam se instalar onde há condições fiscais competitivas e uma oferta de infraestrutura.
RICARDO PORTELLA NUNES
Coordenador do Conselho de Infraestrutura da Federação das Indústrias do Estado do Rio Grande do Sul
Das 54 cidades sem ligação asfáltica, Pinhal da Serra é a que tem o maior Produto Interno Bruto (PIB) per capita (R$ 157.209,06). O desempenho econômico é impulsionado pela Usina Hidrelétrica de Barra Grande, construída em 2001. Embora importante, a receita gerada não é suficiente para desenvolver o município na velocidade que o prefeito gostaria. Resta, então, buscar outros investidores.
— O problema é que em reuniões regionais de negócios, a gente fica até excluído por não ter acesso asfáltico. A conversa termina quando fala que para chegar na cidade tem 25 quilômetros de estrada de chão — reclama.
O chão batido também pesa no bolso da prefeitura. O trecho entre Esmeralda e Pinhal da Serra é conservado pelos dois municípios. O lado pinhalense, de 15 quilômetros, exige investimento de aproximadamente R$ 50 mil a cada 90 dias. Embora seja de responsabilidade do Estado, a prefeitura faz melhorias para manter a estrada trafegável. Já para manter os 14 quilômetros asfaltados que seguem para o norte, em direção à catarinense Anita Garibaldi, a prefeitura desembolsa cerca de R$ 2 mil no mesmo período.

— Se a estrada é asfaltada, manter depois é bem mais barato — explica Anderson.
Assim como a poeira, os reflexos do chão batido estão para onde quer que se olhe. Roberto Júnior Silveira Borges, 47 anos, mora às margens da RS-456. Ele nem cogita a possibilidade de tomar chimarrão no gramado que mantém aparado em frente à casa. Seria engolido de tempo em tempo pela nuvem de poeira que se levanta da estrada. Nem a vegetação plantada entre o terreno e a rodovia são suficientes para barrar a terra que se espalha pelo ar. Aliás, na briga de cores, o marrom tem levado vantagem sobre o verde.

Artimanhas para o pintor trabalhar
Para pintar a casa, Borges engatou no trator um reservatório de água. Duas vezes por dia, molhava um quilômetro de estrada, permitindo o trabalho do pintor. Foi a maneira de conseguir domar o pó que o importuna desde a infância, causando até alergia que desencadeiam coceira na pele e crise de espirros. A médica otorrinolaringologista Jéssica Lima explica que essa exposição à poeira pode ocasionar consequências maléficas à saúde, como inflamações, pneumonias por hipersensibilidade, rinite alérgica e doença pulmonar crônica. Borges vive da produção de leite. Paga de frete o equivalente a 10% da produção. Se a estrada fosse asfaltada, diz que o custo cairia pela metade:
— Somos penalizados pelo nosso acesso. Fica mais caro o frete. Tudo o que a gente compra de alimentação, insumo agrícola, transporte do leite é mais caro. Alegam que de Esmeralda até a minha propriedade tem de fazer 18 quilômetros de chão, que se cortar um pneu já dá R$ 500 para arrumar. E daí tu te obriga: ou paga o que querem ou fica sem.
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