Região conflagrada pelo tráfico de drogas e disputa entre facções, a Vila Cruzeiro, em Porto Alegre, viveu novamente uma manhã tensa após o assassinato de duas pessoas, entre elas um jovem de 14 anos que, de acordo com diversos moradores e com a Brigada Militar, não tinha qualquer envolvimento com o crime. Alisson Couto, primo de Adriano Couto, o Pelezinho, morto no mesmo local há três anos, foi executado dentro de casa por volta das 6h30min. Horas depois, um ônibus da linha T3 foi assaltado dentro da vila.
Segundo a polícia, um grupo armado e com fardas da Brigada Militar invadiu o Beco do Lula, que fica na Rua Ursa Maior, Vila da Pedreira, e entrou na casa de Alisson após arrombar a porta. Eles anunciaram que eram policiais e atiraram no jovem. Em seguida, mataram Jones Felipe Cabral, sem idade confirmada, na rua. As causas dos homicídios ainda são apuradas.
- Lamentamos a morte deste menor. Sabemos que muitas vezes o tráfico de drogas tende para esse tipo de crime. Por isso, a Brigada é tão combativa nesse tipo de bandidos, para que inocentes não venham pagar com a vida - afirma o tenente-coronel Kleber Goulart, comandante do 1º BPM.
Cerca de duas horas depois das execuções, uma dupla de bandidos invadiu um ônibus da Linha T3, da Carris, na Vila Cruzeiro, e ameaçou colocar fogo no veículo. O motorista e os passageiros conseguiram sair e ninguém ficou ferido. Os dois suspeitos foram presos na tentativa de fuga. Eles levavam o dinheiro do cobrador - cerca de R$ 80. Ainda não está confirmado se foi uma reação aos homicídios ou oportunismo dos criminosos.
Com medo de novos ataques, a Carris e a STS desviaram duas linhas (T3 e T4) e colocaram diversos coletivos nas garagens. Por volta das 11h, seis das 10 linhas afetadas tinham voltado a circular. No final de setembro, depois de um tiroteio com um morto e sete feridos próximo ao postão da Vila Cruzeiro, um ônibus foi incendiado como protesto.
Revolta e apelo por segurança
A execução de Alisson Couto revoltou dezenas de moradores da Vila da Pedreira. O garoto jogava futebol na Sociedade Esportiva Pedreira, um clube de várzea do bairro, e levava uma vida tranquila. Desesperada, a mãe dele, Liliane Couto, disse que mataram a pessoa errada:
- Eu disse 'deita aqui' por causa das balas. Só que eu imaginava que podia pegar uma bala perdida, jamais pensei que entrariam aqui dentro de casa e falariam que eram 'polícia'. Eles chegaram, o guri saltou da cama e eles deram um tiro. Eles pegaram a pessoa errada, ele era inocente, inocente.
Para o líder comunitário Lindomar Oliveira, o assassinato é um duro golpe no trabalho social feito com jovens para afastá-los da criminalidade. Ele pede a presença constante da polícia para eliminar as facções que dominam hoje a Vila Cruzeiro e levam terror às pessoas que não concordam em participar com o "movimento", como é denominado o tráfico de drogas na região:
- A gente batalha dizendo para eles que a vida tem outro rumo, aí acontece isso. Hoje de manhã os meninos me disseram 'pô, você pede para a gente ser bonzinho e olha o que fazem'. O que eu vou dizer para aquele menino que vê o amigo deitado no chão, se preparando para ir ao colégio, crivado de tiros?
* Colaborou Jaqueline Sordi