Embora a Grécia e autoridades europeias tenham adotado uma atitude inflexível até o momento, a tendência é de que os dois lados cheguem a um acordo. Essa é a visão de Aris Trantidis, professor visitante de economia no King's College, Grã-Bretanha. A seguir, uma síntese da entrevista a Zero Hora.
Grécia cobra renegociação de pacote de indenização da II Guerra Mundial
Para alguns analistas, o modelo de austeridade produziu resultados positivos na Grécia, especialmente no último ano, apesar dos efeitos sociais perversos. O que o senhor pensa sobre isso?
Há consenso entre os economistas de que austeridade severa não funciona. Você certamente encontrará aqueles que ainda acreditam em economia focada na oferta. Eles lhe dirão que os efeitos da política de austeridade são duros, mas, afinal, a Grécia está em lenta recuperação econômica. Isso pode ser objeto de debate. De qualquer maneira, os custos sociais que o povo grego tem enfrentado tornam óbvio que esse caminho não é politicamente sustentável. Se você quer governar um país de forma democrática, tem de levar em conta até que ponto a sociedade deseja se submeter a uma terapia de choque em curto e médio prazo. A questão, portanto, tem duas dimensões. A primeira é: até que ponto a atual receita econômica realmente funciona no caso da Grécia? A segunda é: seguir adiante com um remédio tão severo a fim de obter um nível de crescimento anêmico é politicamente sustentável para a moderna democracia europeia? Elas estão relacionadas entre si porque uma economia é, também, uma sociedade política.
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Como o senhor define a orientação econômica do governo de Syriza?
Suas propostas são vagas. Não refletem a orientação econômica típica dos governos europeus - ao contrário, representam direto desafio à austeridade. Isso faz Syriza se alinhar com a escola que prega ênfase no mercado interno e na infraestrutura pública. Mas, até o momento, os eleitores vinham apoiando as reformas estruturais, o lado da oferta. Isso é relevante porque, embora as questões sociais importem, depois de cinco anos de austeridade, um país tem de ser competitivo no mercado mundial. Syriza não se inclina por esse caminho em razão de seus compromissos ideológicos.
Em que direção apontam as primeiras medidas práticas?
Até o momento, o governo suspendeu certos processos de privatização de infraestrutura como portos e aeroportos. Para o ministro das Finanças, Yanis Varoufakis, o governo não se opõe ao conceito de privatização em si, mas descarta privatização como liquidação de patrimônio. Isso é interessante porque pode sinalizar uma mudança pragmática em direção à aceitação da ideia de uma economia privada, na qual o Estado deveria ter um papel limitado de supervisão e garantia de bem-estar. Vários partidos na América Latina começaram com retórica antiprivatização e antiglobalização e adotaram atitude moderada quando chegaram ao poder. Minha previsão é de que veremos um governo que começa com uma posição radical e se torna mais pragmático quando tem de se conduzir numa economia aberta e num mundo globalizado.
É possível renegociar a dívida grega, como propõe o novo governo?
Os dois lados sabem muito bem que precisam chegar a um acordo. Até o momento, as técnicas de negociação de ambos têm sido de não recuar em suas respectivas posições, especialmente no caso da Alemanha e da Grécia, porque há diferenças entre a abordagem de Angela Merkel (chanceler alemã) e outros países. Deve haver acordos, em diferentes momentos, e os governos terão de justificar qualquer concessão a seus eleitorados domésticos. O eleitorado alemão não aceita que a política econômica europeia tenha sido responsável pelo que aconteceu antes da crise e condenou a Grécia ao desastre. Mas acredito que terá de haver acordo, porque isso faz parte da lógica da União Europeia. O bloco foi desenhado para o diálogo e o compromisso, especialmente quando está em questão um movimento difícil que pode empurrar um país a sair da zona do euro.