Se você perguntar para um americano ou para um chinês quem lidera o quadro de medalhas dos Jogos Olímpicos de Paris-2024, terá duas respostas diferentes — e nenhuma delas está errada, de fato. A China soma 18 medalhas de ouro após uma semana de competição, enquanto os Estados Unidos já subiram 14 vezes ao lugar mais alto do pódio, mas lideram no total de medalhas (62 x 40).
Afinal, há uma maneira correta de se medir as posições e as medalhas dos países nos Jogos Olímpicos? Uma resposta direta é não. O Comitê Olímpico Internacional (COI), historicamente, opta por não adotar um critério de medição ou de competição entre os países.
A Carta Olímpica, conjunto de regras e guias para a organização dos Jogos Olímpicos, e para o comando do Movimento Olímpico, aborda esse tema, no capítulo 1, seção 6: "Os Jogos Olímpicos são competições entre atletas individuais ou entre equipes, e não entre países." Este documento foi atualizado pela última vez em outubro de 2023 e está em vigor em Paris-2024.
Por outro lado, no site oficial do COI, há um quadro de medalhas, com o número de ouros como critério principal. Configuraria uma contradição do movimento olímpico? Sim, mas também não.
Até os Jogos Olímpicos de 2008, em Pequim, o COI seguia essa regra à risca. Na Carta, no capítulo 5, seção 57, explicita-se: "o COI e o Comitê Organizador dos Jogos não elaboram qualquer classificação global por país. Um quadro de honra com os nomes dos ganhadores de medalhas e dos diplomados em cada evento será estabelecido pelo Comitê Organizador e os nomes dos ganhadores de medalhas serão exibidos de forma destacada e permanente no estádio principal".
No entanto, este trecho foi retirado da versão atual. No lugar, a Carta traz o seguinte: "as representações apresentando os resultados da competição poderão ser elaboradas pelo COI e, com a autorização do COI, pelo Comitê Organizador dos Jogos, para fins informativos".
Dessa forma, o COI não está quebrando suas próprias leis ao instituir um quadro de medalhas "oficial".
Critérios de desempate
Historicamente, a maioria dos países do mundo adota a classificação a partir do número de medalhas de ouros conquistadas - seguido da prata, bronze e total de pódios como critérios de desempates.
Em Paris-2024, jornais americanos, como The New York Times, Washington Post, entre outros, adotam, por sua vez, a medição a partir do total de medalhas - por isso os Estados Unidos aparecem à frente. Há também outros critérios, como aqueles em que cada medalha possui um determinado peso, mas nenhum é tão popular quanto os dois anteriores.
Produzir um quadro de medalhas se dá por dois motivos: o primeiro é para haver uma competição entre países - algo que a Carta Olímpica "proíbe". Este fator ganhou força durante a Guerra Fria, quando Estados Unidos e União Soviética dominavam os esportes olímpicos no período. Já o segundo motivo se dá para que os comitês olímpicos nacionais possam estabelecer metas e medir a evolução do esporte no país.
O Brasil, por exemplo, trabalha com a evolução da delegação no número total de medalhas. Desde Londres-2012, o País melhora seu desempenho a cada Olimpíada. Nos Jogos de Tóquio, realizados em 2021, bateu seu recorde, com 21 medalhas no total (sendo sete de ouro). Até aqui, em Paris-2024, são dez pódios, sendo um destes de ouro —conquistado pela judoca Beatriz Souza.
Polêmica em 2008
Em 2008, no último ano em que foi adotado a tal política sem quadro de medalhas pelo COI, Estados Unidos e China divergiram nos critérios de medição. Para os americanos, eles terminaram na liderança, 112 medalhas; para o país-sede, no entanto, o cenário foi diferente: a China ficou à frente, com 48 ouros.
À época, o COI minimizou a situação - que foi um problema "diplomático" entre os países. "A China ganhou o maior número de medalhas de ouro e os Estados Unidos da América ganharam o maior número total", disse o presidente do COI à época, Jacques Rogge.
"Acredito que cada país destacará o que melhor lhe convém. Um país dirá: 'Medalhas de ouro'. O outro país dirá: 'A contagem total conta'. Não tomamos nenhuma posição sobre isso".
JACQUES ROGGE
Presidente do Comitê Olímpico Internacional em 2008.
Seja por essa dúvida ou pelo COI entender a necessidade de se produzir um quadro de medalhas oficial, desde então, a cada ano, o site do Comitê traz sua própria versão, ordenado primeiramente a partir dos ouros, mas em que o usuário pode selecionar o critério que preferir - total de medalhas ou até mesmo ordem alfabética.
Retroativamente, para fins "informativos" — como a Carta Olímpica descreve —, o COI disponibiliza os quadros de medalhas de todas as outras Olimpíadas, desde Atenas-1896.