O futebol feminino vem atraindo, ao longo dos anos, cada vez mais atenção por parte dos torcedores. Nas redes sociais, é comum os apaixonados pelo esporte buscarem notícias a respeito do seu time e acompanharem as partidas. No entanto, o crescimento da modalidade ainda está longe do ideal.
Desde 2019, o investimento no naipe é obrigatório para os participantes da Série A. Porém, antes mesmo de qualquer obrigatoriedade, algumas equipes já investiam no futebol feminino por acreditar na modalidade. O São José-SP, por exemplo, fundou a equipe em 2000. Ao longo da história, o investimento na modalidade gerou frutos. A trajetória da Ferroviária, que investe nas meninas há cerca de 20 anos é similar. Assim como a de Kindermann e Napoli, ambos de Caçador, no interior de Santa Catarina.
Essas equipes investiram no futebol feminino quando não havia qualquer obrigatoriedade. Os gestores, dirigentes, técnicos, e demais envolvidos, acreditaram na modalidade. E colheram os frutos. A reportagem de GZH conversou com profissionais desses quatro times para explicar o que deu certo.
Avaí Kindermann-SC
O time da cidade de Caçador, no interior de Santa Catarina, é um dos mais tradicionais do país na modalidade feminina. A equipe já conquistou a Copa do Brasil, em 2015, o vice-campeonato do Brasileirão, em 2014 e 2020. Além de acumular 11 títulos do Catarinense. Fundado em 1975, o Kindermann voltou suas atenções ao futebol feminino apenas em 2008.
— O Kindermann veio de uma necessidade de manter o futebol ativo na cidade. A modalidade feminina começou com o futsal. Na época, trazendo o professor Edvalder, que foi treinador da Seleção de base. Então, ele trouxe para cá algumas atletas do Espírito Santo, e começou, realmente, a surgir a equipe — explica o diretor da equipe, Jonas Estevão.
Desde 2019, o Kindermann passou a carregar também o nome de Avaí. A parceria surgiu após uma exigência da CBF, de que todos os participantes da Série A, a partir daquela edição, deveriam manter um time de futebol feminino adulto e de base.
— A CBF deu prerrogativas para que o Avaí pudesse fazer uma parceria com uma equipe já existente que não tivesse time profissional masculino. Então, surgiu a ideia do Avaí nos procurar e a partir daí estamos colhendo bons frutos — relembra.
Atualmente, o Kindermann conta com um elenco 100% profissional, com todas as atletas registradas na CBF e com direitos trabalhistas garantidos. No entanto, mesmo com o crescimento da modalidade, o diretor da equipe ressalta que ainda é muito trabalhoso buscar patrocinadores e interessados em investir em naipes femininos. Todos os investimentos da equipe são oriundos da iniciativa privada.
Ferroviária-SP
Com 20 anos de departamento feminino, a Ferroviária tem história na modalidade. Bi-campeã do Brasileiro (2014 e 2019) e da Libertadores (2015 e 2020), campeã da Copa do Brasil (2014). Além de ser tetra no Paulistão (2002, 2004, 2005 e 2013). Ao longo desse período, o clube mantém uma parceria com a prefeitura de Araraquara, que só fortalece a modalidade.
— Ela funciona em vários processos, tanto em estrutura, porque usamos espaços da prefeitura como local de treinamento para categoria de base e adulta, por exemplo. Contamos também com alguns profissionais contratados pela prefeitura, outros pela Ferroviária. Entretanto, o processo de tomada de decisões fica no clube, junto com os gestores e diretores — explica a coordenadora de futebol feminino da Ferroviária, Nuéli Silveira.
O clube também investe nas categorias de base femininas. Além de ter sido um dos primeiros a promover a assinatura de contratos com carteira assinada às jogadoras. Isso, quando a prática não era muito comum no Brasil, em 2017.
— Um dos nossos objetivos era ter a profissionalização das atletas. Isso era interessante para elas e para nós. Para elas, era uma segurança de trabalhar em um lugar que garante os direitos delas. Para nós, auxiliava no planejamento, saber com quem poderíamos contar no ano seguinte — detalha a coordenadora de futebol feminino, que complementa abordando o investimento nas categorias de base:
— Quando você começa cedo, as meninas vão acreditar. Elas sabem que existem um lugar para fazer futebol feminino. Então, as atletas passam a vir e o futebol feminino vai ganhando cada vez mais força. Formamos grandes jogadoras também, como a Rafa Mineira, a Luana, a Andréia Rosa, e a Bia Zaneratto, por exemplo.
Atualmente, o clube proporciona ao departamento feminino todas as condições para que a modalidade funcione com perfeição. Além de comissão técnica e departamento médico, as meninas contam com psicóloga, analista de desempenho, assistente social, além de equipe de marketing e assessoria de imprensa. Conforme Nuéli, a Ferroviária entende que, com isso, é possível entregar um ambiente favorável para que o elenco consiga se desenvolver tanto na base, quanto no profissional.
Napoli-SC
Em 2017 foi fundado o departamento de futebol feminino no Napoli. E não foi necessário muito tempo para que a equipe colhesse os frutos deste investimento. Três anos depois, em 2020, a equipe da cidade de Caçador conquistou o Brasileirão Feminino A-2 de forma invicta. Com isso, obteve a vaga na elite assegurada para 2021.
— O Napoli nasceu de uma demanda do Kindermann. Para que o Campeonato Estadual tivesse validade, a CBF e a Federação decidiram que era necessário quatro equipes femininas participando, para que houvesse uma vaga a mais no Campeonato Brasileiro da Série A-2. Então, a gente dividiu o Kindermann, que tinha 35 atletas, colocamos meio a meio. Logo no seu primeiro ano, o Napoli conquistou o vice-campeonato Estadual e a vaga na A-2 — conta o presidente da equipe, Jonas Estevão.
Kindermann e Napoli tem uma ligação forte. O departamento feminino de ambos foi fundado por Salézio Kindermann, um dos grandes apoiadores do futebol feminino no Brasil, que acabou falecendo em decorrência da covid-19, em maio deste ano.
Napoli e Kindermann ainda dividem os mesmos espaços de academia e treinos — com revezamento de horário — além do estádio Carlos Alberto Costa Neves.
Jonas explica que, diferente do Kindermann, o Napoli ainda é uma equipe amadora. Portanto, não pode registrar atletas profissionalmente. Sendo assim, não há possibilidade de assinar carteira e fazer contratos profissionais junto à CBF, por exemplo. Atualmente, a equipe também sobrevive apenas com investimento privado.
— Todo investimento Napoli e Kindermann, até o momento, é de iniciativa privada. A gente não tem nenhum repasse de prefeitura municipal ou poder público. A única parceria que temos são projetos da Lei de Incentivo ao Esporte — reitera o presidente.
São José-SP
O time do interior paulista conta com a modalidade feminina desde 2000. O São José começou a investir no futebol feminino quando ainda não havia quaisquer obrigatoriedade por parte das Federações ou Confederações nacionais ou internacionais. Desde 2003, há uma parceria com a prefeitura de São José dos Campos para gerir o futebol feminino e valorizá-lo.
— Por ser um time 100% prefeitura, não tem lucro. A prefeitura nunca visou ganhar dinheiro, porque é uma cidade que investe demais no esporte. Não só no futebol, vai do atletismo até o xadrez, tanto base quanto adulto — explica a coordenadora do time feminino principal, Renata Ferreira.
Em decorrência da parceria com a prefeitura, todos os gastos são pagos pela autarquia. O que inclui os salários das atletas e da comissão técnica.
— Aqui nós temos a verba da LIF (Lei de Incentivo Fiscal), em que as empresas passam parte do imposto para a modalidade e a gente consegue arrumar a contrapartida para se tornar patrocínio. Temos também a verba da prefeitura, via FADENP (Fundo de Apoio ao Desporto não profissional). Então, as atletas têm um termo de compromisso onde são contratadas por meses. Vamos supor que seja um contrato de dez meses, elas recebem essas 10 parcelas, tudo pago pela prefeitura, tudo na conta delas, sem atrasos — detalha.
Nos 21 de fundação, o clube já conquistou o tricampeonato da Libertadores (2011, 2013 e 2014), o Mundial de Clubes (2014), o bicampeonato da Copa do Brasil (2012 e 2013) e o tricampeonato paulista (2012, 2014 e 2015). Além de ser a única equipe que disputou todas as edições do Brasileirão Feminino de 2013 e a que acumula mais títulos internacionais.