Marcelo Medeiros é o presidente do Inter. E meu vizinho. Somos amigos de elevador. Quando o dia começa ou termina. Não são muitos andares nem muitas palavras, mas o suficiente.
Antes de conhecê-lo, não confiava em presidentes de clube, país ou sociedade. Achava-os exageradamente políticos, desmedidamente ambiciosos. Hoje não desconfio. Vi a pessoa dentro dele e isso, modéstia à parte, administro bem. Sinto em nossos olhares esperançosos do dia que começa. Ou cansados do dia que termina.
Somos amigos de elevador desde que ele era apenas um colorado renhido, e eu, um gremista ferrenho. Nunca faltou corneta. Sempre sobrou respeito. Depois, ele se tornou diretor. Depois, presidente. E eu ali, subindo, descendo, gremista. O prédio é pequeno, mas não faltou tempo para eu cumprimentá-lo efusivamente pela presidência. E foi quase imperceptível no meu cumprimento a sombra do descenso. Não faltou tempo para ele me cumprimentar sinceramente pela Copa do Brasil. E foi quase imperceptível no seu comprimento a sombra de duas décadas sem títulos.
Dia desses, como sempre, nos topamos no elevador. Falamos ao léu sobre alguma coisa que o prédio precisava. Eu preciso de um centroavante, declarou o presidente. Era o fim do dia com o seu cansaço. Ou o começo com a sua esperança. Não lembro. Lembro que senti uma empatia por ele. Se tivesse um centroavante, eu lhe alcançava.
O futebol se presta a isso. É esporte, invenção da civilização diante da barbárie. Símbolo para amenizar os sentimentos sem bússola. Graças a ele, podemos desviar de algumas tensões que, sem ele, seriam maiores ainda. Mata-se menos por causa do futebol e de outros esportes. Sonha-se mais, brinca-se mais, adia-se a morte.
A todas essas, não há rivalidade duradoura que suplante um instante verdadeiro de amizade. Quando vi, ela estava ali e, tivesse o centroavante, oferecia ao meu amigo. Borja, Prato, André Catimba, Alcindo, Romário, Ronaldo.
Felizmente, os rompantes loucos de amizade também são breves. Chegamos ao seu andar e pensei: que comece bem o dia, que termine bem o dia, Marcelo, mas nada de centroavantes.