O amigo do sultão de Brunei pisará no sintético do Passo D’Areia. Rodrigo Gral rodou o mundo e voltou a Porto Alegre para jogar a Série D pelo São José. Aos 39 anos, o atacante desembarcou na Zona Norte com 592 gols na carreira, pela suas contas, e uma coleção de histórias.
Gral saiu do Grêmio em 2001 para conquistar a Ásia. Chegou ao Jubilo Iwata-JAP pelas mãos de Dunga. Meses antes, havia vivido um inferno em Porto Alegre, quando estourou a notícia da adulteração de sua idade em dois anos.
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No Japão, Gral desatou a fazer gols. E comemorava com sacadas de deixar Túlio Maravilha com inveja. Por exemplo: intrigou-se ao ver carpas de papel penduradas nas varandas. Ouviu do intérprete que eram alusivas ao Dia das Crianças, indicava que naquela casa morava uma. No fim de semana, comemorou seu gol exibindo uma carpa de papel. Os japoneses adoraram. Ele não parou mais de inventar comemorações.
Os gols e a irreverência o tornaram ídolo. A Puma, sua patrocinadora na época, lançou seu boneco em miniatura. Em jogo da J-League, Gral percebeu agitação no estádio. Foi informado de que acabava de chegar às tribunas um campeão de sumô. Você bem sabe, esse é um esporte milenar no Japão. Os lutadores são reverenciados. Gral fez gol e, claro, homenageou o lutador. Que ao final pediu sua miniatura autografada.
Em retribuição, o lutador mandou ingressos para a sua luta em Nagoya.
O atacante foi e conheceu pessoalmente o ídolo japonês e seu staff, do qual fazia parte um brasileiro. Os lutadores de sumô são mastodônticos e, por isso, precisam de uma equipe para ajudá-los em ações triviais do dia a dia. Esse brasileiro, por exemplo, o auxiliava na higiene e recebia, para isso, US$ 5 mil mensais.
Gral jogou de 2002 a 2006 no Jubilo. Depois, passou por Yokohama Marinos e Omiya Ardiya antes de desembarcar no Oriente Médio. O começo no Catar foi um choque. Estava acostumado com a precisão japonesa. O atacante chegou a Doha para ouvir a proposta do xeque dono do Al Khor. Levou só uma mala de roupas. A conversa com xeque, genro do Emir, foi rápida. Ele pediu que Gral corresse em volta do campo. Depois, pediu algumas embaixadas. Gostou do que viu e avisou-o de que estava contratado.
– Mas tem que negociar com o meu clube – disse o atacante para o tradutor.
– Quanto você ganha? Pagamos mais.
Gral jogou o segundo e o terceiro turnos. Mesmo assim, fez 15 gols e só ficou atrás de Emerson Sheik, que fez 17. Na final, seu Al Khor enfrentou o Al Sadd, de Sheik. A decisão do campeonato é sempre no dia do aniversário do emir Hamad bin Khalifa al-Thani. Como ele sorteia um carro, por vezes uma Land Rover, e regalos como relógios Bvlgari e Rolex, os trabalhadores, em sua maioria indianos e bengaleses, esgotam os ingressos. O Al Sadd foi campeão. Mas a ida à final garantiu aos dois times um almoço no palácio real com o emir.
– Ele me cumprimentou pelo nome e perguntou como estava minha lesão. Com o Sheik, o único sem terno e gravata, brincou: “Se enganou, achou que vinha para uma boate?” – recorda Gral.
Foram dois anos no Al Khor e um no Al Sadd. Em 2010, o atacante disputou a Série B pelo Bahia e, no ano seguinte, ajudou o Santa Cruz a sair da Série D. Depois disso, voltou à Ásia. Um agente japonês trouxe oferta de Brunei. O sultanato recém havia saído de punição da Fifa, por interferência do governo na federação. Gral topou a oferta do DPMM, cujo dono é o príncipe Al-Muttadeh Billah, herdeiro do sultão Hassanal Bolkiah, um dos homens mais ricos do mundo segundo a Forbes.
O DPMM joga a S-League, de Cingapura, já que em sua liga não há adversários à sua altura. Brunei é um pedaço de prosperidade irrigado pelo petróleo no sudeste da Ásia. Não há pobreza.
O Estado banca tudo, escola, saúde e moradia – e sem cobrar imposto de renda. O sultão vive em um palácio com 1.788 quartos. Gral caiu nas graças dele ao fazer um gol e mostrar por baixo uma camisa com a bandeira de Brunei. De sua cadeira folheada a ouro, o sultão mandou convidá-lo para ir ao palácio. Lá, mostrou-lhe sua coleção de mais de 5 mil carros. Havia desde Bentleys e Ferraris encomendadas em modelos exclusivos a Rolls Royce e Aston Martins.
No meio da conversa, Gral contou da amizade com Ronaldinho. Recebeu como missão apresentar oferta para que o craque visitasse Brunei. Dinheiro para o cachê não faltaria. O gaúcho recusou o convite. Mas Gral entregou nas mãos reais camiseta autografada pelo craque.
No início da semana, o atacante contava histórias como essas no Passo D’Areia. A gurizada que buscará vaga na Série C as ouvia com atenção. Gral chegou a convite de China Balbino. Garante que, aos 39 anos, tem muita lenha para queimar. E histórias para contar.
*ZHESPORTES