Minha geração aprendeu a gostar de futebol de forma diferente da atual. Nós, como nossos pais, não tínhamos jogos transmitidos em profusão na TV como hoje em dia. Ao contrário: nos valíamos de revistas semanais, com conteúdo velho, e do que a grade da TV aberta nos oferecia. Dupla Gre-Nal, por exemplo, só víamos em casa em ano bissexto.
Era o rádio que alimentava nossa paixão pelo esporte, com relatos exagerados dos locutores e a verve poética, porém subjetiva, dos talentosos comentaristas e cronistas. Esses caras nos entregaram o futebol não como esporte, e sim magia. A eles pouco interessava a organização tática de um time, e a nós também! Era mais importante saber que a bola havia deslizado pelo "peito de ébano" de Pelé do que propriamente se o 4-3-3 havia sido o esquema utilizado.
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Tirando as batidas revoluções do futebol em formação de time, como a Hungria de 1954 e a Holanda de 1974, o que recebíamos e queríamos do futebol era seu aspecto lúdico. Possivelmente a paixão pelos 22 caras atrás de uma bola só exista por esse período em que nos convencemos que não era só futebol... Era muito mais.
Mas os tempos mudaram!
Passamos a ser invadidos, por conta de tecnologia e globalização, por dezenas e dezenas de canais, jornalistas esportivos, analistas e, especialmente, muitos e muitos jogos ao vivo. O auge dessa nova condição coincidiu com a terceira e mais marcante revolução tática: o Barcelona de 2008, do maldito Guardiola. Esse cara terminou com tudo que havia de bonito e simples.
Aquele time que circulava a bola no campo ofensivo sem errar passes com intensa troca de posições destruiu com a subjetividade do jogo. Esse infeliz teve a audácia de transformar o belo de antigamente em qualidade objetiva.
Resumo: esse ser melhorou o futebol. E ninguém havia pedido isso! Ninguém queria isso.
Em meio à revolução, os novos apaixonados por futebol passaram a se interessar por aquele mecanismo, aquela forma de jogar, e em seus games, como managers de seus próprios times, viraram especialistas táticos.
Hoje ninguém tem interesse no peito do CR7 e na sua longilínea envergadura. Essa gurizada robotizada por aquele nefasto time catalão reconhece um 4-1-4-1 e sabe de cor o movimento dos extremas da última linha.
Por causa do Guardiola não teremos mais copas como a de 1994, na qual quem tivesse mais craques vencia.
Agora temos que aguentar esse futebol solidário em que o time joga compactado e todos têm a mesma importância. Temos que suportar uma Copa em que até a Costa Rica é bem armada. Que nojo!
Como eu, analista de futebol, faço agora? Não dá nem para piscar comentando um jogo, sob pena de um insolente adolescente desses me corrigir quando eu fizer a análise tática da partida.
Que saudade de quando não existia o Guardiola. Eu quero voltar a ter o direito de não entender nada de formações táticas, extremas, transições, periodização e outras coisas complexas que esse cara reinventou.
Mas não dá.
E o Messi nem peito de ébano tem.
Eu te odeio, Guardiola!