As salas de aula e o auditório do Campus Alvorada do Instituto Federal do Rio Grande do Sul (IFRS) ganharam cores e acessórios diferentes neste sábado (20). Em alusão ao Dia de Combate à Homofobia, celebrado na última quarta-feira (17), alunos de diferentes idades participaram do evento “A fantástica fábrica de drags”. Nele, estudantes foram montados como drag queens e kings e debateram as construções de gênero e sexualidade na sociedade.
No total, 101 alunos e 20 organizadores participaram das ações teórico-práticas, que eram consideradas um dia de aula. As pessoas presentes foram divididas em grupos e levadas para salas de aula, onde eram definidos quantas e quantos drags seriam montados, as características de cada personagem e qual seria o tema do visual. Depois, as equipes escolhiam roupas em um cabide preparado com contribuições dos próprios estudantes e a maquiagem era iniciada.
Ao final, drags desfilariam e seriam escolhidas duas finalistas, que fariam uma batalha de lip sync (sincronia labial). Por fim, uma seria definida como vencedora e ganharia um "kit gay", composto por uma ecobag, um livro, ingressos de cinema e pins.
Uma das participantes foi Rosemar Silva, 45 anos, aluna do tecnólogo em Produção Multimídia. Ela seria montada como drag king pela primeira vez na vida.
— Eu gosto dessa coisa meio andrógena, sabe? Brincar um pouco, sair um pouco do feminino mais tradicional. Acho a arte drag fundamental, porque é um processo de libertação, e também porque agrega outras pessoas que não são dessa cultura, como vemos nas paradas — observa Rosemar.
Mas nem para todos os estudantes a arte drag era novidade. Uma das exceções era Lolla Hills, 22 anos, que desde 2019 se monta como drag queen, e aproveitou o evento para lançar seu novo clipe – na verdade, um “vídeo vertical”, gravado no próprio IFRS, em uma disciplina de Produção Multimídia, no mês passado.
— No ano passado, a gente fez a música na cadeira de Som, aí, neste ano, a gente fez o clipe na cadeira de Produção Audiovisual, com o professor Christian (Vaisz). Foi uma experiência muito louca, porque eu não esperava conseguir conciliar a arte drag com a faculdade. Isso foi um sonho pra mim. Foi lindo — comenta Lolla.
Sua relação com esse mundo começou depois que, no Ensino Médio, interpretou na aula de teatro uma personagem drag queen. Desde então, se identificou com a arte e iniciou uma carreira, compondo músicas e clipes. Atualmente, está produzindo um curta-metragem com a cena de um assalto que sofreu.
Alicia Motta, 23 anos, também é aluna de Produção Multimídia, dirigiu o clipe e é produtora de Lolla Hills. Para a jovem, que achava machistas os ambientes onde já havia trabalhado, o IFRS se mostrou um lugar libertador.
— Eu digo que é quase um lugar utópico, porque é outro mundo. É um ambiente mais livre, até para produções. A gente produziu esse clipe da Lolla Hills e, agora, está produzindo um novo clipe, e é fantástica a abertura que os professores nos dão para essas produções — comenta Alicia.
Kethlyn Martinez, 26 anos, é estudante do IFRS e foi convidada a atuar como monitora em uma das salas de aula onde ocorriam as oficinas. Da sala dela, sairiam duas drag queens – Alana e Ayasha. A jovem considerou importante participar como monitora, até para ajudar nas discussões mais teóricas.
— Como uma mulher LGBT, resolvi ajudar a construir essa discussão sobre identidade e sexualidade a partir da arte drag, que é uma arte que dá muito a cara a tapa. As pessoas trans e travestis estão na comunidade, se colocando à frente de uma forma que a gente não está, e trazem um lado mais colorido também. Quando se pensa em LGBT, se pensa em LGBTfobia. Isso mostra não só o lado que sofre, mas o que sorri — resume Kethlyn.
Professora do IFRS e uma das coordenadoras do evento, Fernanda Nascimento conta que as oficinas de drag têm sido utilizadas por muitos pesquisadores e ativistas como uma forma de discutir gênero e sexualidade.
— As drags performam o exagero do feminino e do masculino e, com isso, elas fazem a gente pensar sobre as construções de gênero. Drag não é só tu vestir uma roupa do gênero com o qual tu não te identifica: é também pensar sobre como essa pessoa se porta, como essas condutas se dão e, a partir desse exagero, a gente vai se questionando sobre essas fabricações — destaca a docente.
No entendimento de Fernanda, as oficinas têm relação com o combate à homofobia porque, apesar de nem todos os drags serem homossexuais, a cultura LGBTQIA+ é muito ligada à cultura drag.
— Várias drags são muito ativistas dos direitos humanos e essa expressão artística sempre esteve muito ligada à luta política, também. Várias drags estiveram na linha de frente dessas discussões, então, é uma maneira de fazer politicamente, mas a partir da arte, uma discussão sobre o combate à homofobia — analisa a professora.
A atividade foi construída de forma coletiva com os estudantes, técnicos e professores. Para além de debater cultura e gênero, a ideia foi que os alunos exercessem seus conhecimentos técnicos dos cursos de Áudio e Vídeo, Processos Fotográficos e Produção Multimídia, ministrados no campus. As turmas fizeram a montagem do palco, cuidaram da sonorização e fizeram a cobertura, com reportagem em vídeo, produção de fotografias documentais e fotografias de estilo.