Foi a oportunidade de conseguir vaga no mercado de trabalho que estimulou Ketlin Silva Pereira, 20 anos, a levantar cedo, pegar ônibus e deixar Viamão, na Região Metropolitana, nesta quinta-feira, para vir à Capital. O destino era o prédio do Sistema Nacional de Emprego (Sine), na esquina da Avenida Mauá com a Rua Sepúlveda, onde ela e a irmã se juntaram a cerca de 5 mil pessoas com o mesmo objetivo.
A procissão no Centro ocupava uma quadra inteira. À espera da multidão, estavam 10 empresas oferecendo entrevistas para 2 mil vagas. Ketlin queria ser contratada como vendedora ou operadora de caixa no comércio - setor com maior oferta: cerca de 500. Para ela, era a chance de espantar a angústia que a acompanha há um ano, quando saiu do emprego em um mercado:
- De lá pra cá, participei de várias entrevistas. Diziam que iriam ligar depois, mas isso não aconteceu.
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Nesta quinta-feira, Ketlin preencheu cadastro, deixou o telefone e voltou a Viamão:
- Fiquei decepcionada. Pensei que já ia sair de lá empregada.
A jovem, que concluiu o Ensino Fundamental e mora com o marido, se enquadra no perfil mais afetado pelo desemprego na Região Metropolitana, segundo a Pesquisa de Emprego e Desemprego (PED): mulher, negra, entre 16 e 24 anos, que não sustenta a família e com Ensino Fundamental completo.
A fila para a ação, organizada pela Secretaria de Trabalho e Emprego da Capital, se estendia pela Avenida Mauá e pelas ruas Sepúlveda, Siqueira Campos e Cassiano Nascimento. Segundo a titular da pasta, Luiza Neves, todos foram atendidos. Quem desistiu, recebeu senha que dá preferência nesta sexta-feira, quando o Sine volta a funcionar das 8h às 17h, não mais em forma de mutirão.
A estimativa (os dados não foram fechados nesta quinta) era de que nem metade das vagas fosse ocupada. Sobre Ketlin, Luiza diz que, com base no cadastro, se a jovem tiver os requisitos, será chamada. Mas nem todos terão essa chance:
- Muitos não tinham o perfil exigido ou vieram despreparados.
Ao menos 15 pessoas asseguraram vaga na quinta-feira em uma rede de supermercado. Segundo Luiza, dos 250 postos oferecidos por esse empregador, 50% serão ocupados. Novo mutirão deve ocorrer em março ou abril.
Conforme dados da PED, a taxa de desemprego subiu de 5,9% em 2014 para 8,7% em 2015, interrompendo o declínio iniciado em 2004. Foi a mais intensa alta de um ano para o outro desde o início da série histórica, em 1993.
- A fila retrata um movimento sazonal, comum no pós-Carnaval. Também mostra o desaquecimento nacional e, principalmente, regional - resumiu Lucia Garcia, economista do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese).
- Não é algo pontual. Essa procura é consequência da recessão, sem perspectiva de crescimento, portanto, nem de vagas - acrescentou Iracema Castelo Branco, economista da Fundação de Economia Estatística (FEE).
*Colaboraram Cadu Caldas e Leonardo Vieceli