O empresário Eloi DAvila de Oliveira foi vítima de todas as fatalidades e circunstâncias que fazem uma pessoa fracassar na vida ou ter a marginalidade como destino. Natural de Esteio, nascido em uma casa pobre, foi o 14º filho de um casal que teve 15. A mãe morreu no parto do caçula, quando Eloi tinha três anos. Desorientado, o pai começou a distribuir as crianças entre conhecidos e familiares. Eloi ficou com a irmã mais velha em um lar onde convivia com o alcoolismo e a violência do cunhado. Fugiu de casa e foi menino de rua em Porto Alegre.
Com oito anos, foi sozinho para São Paulo. Depois, aos 12, foi tentar a sorte no Rio, onde conheceu a dona da Stella Barros Turismo, local em que trabalhou. Dormia em um pequeno sofá de dois lugares. Persistiu, empreendeu e criou a Flytour, empresa líder em emissão de bilhetes aéreos na América Latina, com faturamento anual superior a R$ 4 bilhões e 260 agências espalhadas pelo Brasil.
Cada unidade da empresa tem de ter um sofazinho para lembrar o passado humilde do fundador. Nesta entrevista, o empresário de 65 anos fala sobre sua trajetória e a situação do Brasil e do Estado.
De onde uma criança de oito anos tira coragem para fugir sozinha para São Paulo?
Tudo depende da pressão que esta pessoa possa estar sofrendo. Eu já saía de casa todo dia para vender pastel na rua. Isso me dava mais uma facilidade para conhecer mais o mundo externo do que ter medo. Vendia perto da cabeceira da pista do aeroporto Salgado Filho, do lado da Vila São Pedro (em Porto Alegre). Via que o ambiente da rua era muito melhor para mim do que o de casa. Sou vendedor até hoje, e o vendedor tem mais atitude. Mais atitude de correr risco, de ter salário menor, de viver de comissão. O Estado brasileiro é extremamente ruim nesse sentido. Ele abraça, as pessoas querem ser abraçadas, e depois reclamam do Estado. Naquela época, eu queria buscar independência, sair daquela pressão.
Mas que tipo de pressão o senhor tinha em casa? E por que São Paulo?
No Juizado (de menores), conheci um rapaz que dizia que em São Paulo era melhor para trabalhar. Não fui para São Paulo na primeira vez que fugi. Foi na segunda. Na primeira, fui para o centro de Porto Alegre. E a pressão que eu tinha era que o meu cunhado infelizmente bebia e batia. Minha irmã foi muito generosa, e ele também, quando trouxeram parte dos meus irmãos para dento da casa deles. Minha mãe morreu, meu pai deu todos os filhos. Vivi atrás do meu pai até os três anos e meio, dormindo na tia, na avó, no parente. Até que meu pai me deixou lá em Esteio, na casa da minha irmã. E aí começou a complicar a vida dela porque o ambiente na casa com o marido bebendo diariamente criou um problema. Um dia, concluí que poderia acabar com aquilo e fui para o centro de Porto Alegre. Fiz de tudo um pouco. Engraxei, cuidei de carro, vendi jornal. Nessa época, tinha medo de ser preso pelo Juizado de menores. Acabei pego na frente do Mercado Público, à noite, dormindo. Me mandaram para o educandário, em frente ao campo do Internacional. Fiquei um tempo por lá. Certo dia, estava jogando bolinha de gude no pátio quando o meu pai chegou. Ele me chamou e eu me entreguei. Acabei sendo levado de novo para a casa da minha irmã. Mas lá, no educandário, limpava a enfermaria e conheci um cara um pouco maior que tinha passado por São Paulo. Ele disse que eu tinha que ir para lá se quisesse vencer na vida.
E como fugiu pela segunda vez?
Não queria ir para o centro de Porto Alegre porque seria apanhado de novo. Comecei a pegar carona de caminhão. Fui para Feliz, peguei outro caminhão para Caxias do Sul. Depois, para São Marcos, Vacaria e Lages até parar em Rio Negro e Mafra, na divisa entre Paraná e Santa Catarina. Peguei mais uma carona e fui para Curitiba. Engraxei, lavei carro, trabalhei na peixaria de um chinês, vendi jornal. Peguei carona para Registro (SP) e cheguei a São Paulo. Fiquei um tempo até ser recolhido de novo pelo Juizado. Fui mandado para Porto Alegre de ônibus. Fiquei uns dias e entrei em uma loja, acho que na Avenida Farrapos, e disse que era de São Paulo, tinha vindo procurar uma tia e encontrei. Fizeram uma vaquinha para me colocar em ônibus de volta a São Paulo. Na época, não precisava de documento. Fui para a Praça da Sé. Lavei carro, vendi jornal, porta-vaso, carnê...
Com a palavra
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Caio Cigana
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